julho 2025

Bacurau e Canibais (The Farm)
Cinema
Bacurau e Canibais (The Farm)
27 de julho de 2025 at 15:00 0
“Bacurau”, lançado em 2019 e dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, foi um enorme sucesso de público e de crítica. O filme conquistou inúmeros prêmios nacionais e internacionais, incluindo o Prêmio do Júri no Festival de Cannes (2019). A história se desenrola em um futuro próximo, na pequena e fictícia vila de Bacurau, no sertão de Pernambuco. Um grupo de estrangeiros – a maioria americanos e europeus – invade a cidade com o objetivo de realizar um "safári humano", caçando e matando os moradores por esporte. Para isso, eles chegam a fazer a vila desaparecer dos mapas online e do GPS. Em resposta, os moradores se unem para lutar contra os invasores. O filme é tenso, violento e mantém a atenção o tempo todo. A filmagem é intencionalmente "amadora", com luz natural e pouco "cinematográfica", enquadramentos que fogem do "perfeito" ou "simétrico", e movimentos de câmera muitas vezes bruscos. Essa abordagem "áspera" de filmagem me remete a filmes que aprecio, como “A Outra Terra” – que comentei recentemente aqui – e “O Império dos Sonhos” (Inland Empire), de David Lynch. Já o tema, que retrata um sertão nordestino violento e impiedoso, é claramente inspirado em obras como “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, o clássico brasileiro de 1964, dirigido pelo grande Glauber Rocha. Ao pensar nos dois filmes, a imagem de pistoleiros correndo pelo sertão me vem à mente: sim, também temos o nosso western de extrema qualidade! Se “Bacurau” foi um grande sucesso de público e de crítica, o mesmo não pode ser dito de “Canibais (The Farm)” (menciono o filme sempre assim para evitar confusão com outra obra de mesmo nome em português, de 2013). Este filme de terror independente, dirigido e escrito por Hans Stjernswärd, foi lançado em 2018. Na internet, é comum encontrar críticas à sua violência extrema, à falta de enredo e desenvolvimento de personagens, ao "choque pelo choque" e à péssima atuação dos atores principais. No entanto, confesso que gostei muito de “Canibais (The Farm)”, talvez por ter pouco contato com esse tipo de terror gore, ou talvez porque o filme seja realmente bom – só o tempo dirá. No filme, um casal, Nora (Nora Yessayan) e Alec (Alec Gaylord) – note que os nomes dos personagens são os mesmos dos atores –, está viajando e acaba parando em um local isolado. Eles rapidamente se veem em uma situação aterrorizante: uma fazenda onde seres humanos são tratados como gado, preparados para o consumo. O desespero e a agonia das vítimas são constantes e aterradores ao longo de todo o filme. Não há nenhum momento de trégua, e o fato de os perpetradores usarem máscaras de animais "inocentes" – porcos, vacas, ovelhas – torna tudo ainda mais assustador. Apesar da enorme diferença em termos de sucesso de público e de crítica, “Bacurau” e “Canibais (The Farm)” têm muitos pontos em comum, além de terem sido lançados com pouco tempo de diferença. A violência, seja a perpetrada pelos estrangeiros no primeiro ou pelos fazendeiros no segundo, é totalmente absurda, sem sentido e gratuita, fazendo com que ambos, em muitos momentos, pareçam um pesadelo sem sentido. Mais do que isso, ambos os filmes podem ser lidos sob uma ótica de crítica política e social. “Bacurau” é frequentemente visto como uma forte alegoria sobre o Brasil e suas complexidades, abordando a violência contra as populações mais vulneráveis, a exploração estrangeira e a importância da resistência e da união comunitária. Já “Canibais (The Farm)” é frequentemente interpretado como uma defesa dos animais e do veganismo, pois, ao inverter os papéis e mostrar seres humanos tratados como gado, expõe a crueldade do tratamento de animais de corte, buscando despertar empatia pelas vítimas. Pessoalmente, não me aprofundo muito nessas interpretações. Para mim, ambos os filmes são excelentes, entre outros motivos, por assustar justamente pela violência absurda que exibem na tela. *** Assisti a 'Bacurau' no Globoplay e a 'Canibais (The Farm)' no Prime Video. A foto que acompanha o texto foi obtida no site do Prime Video. Se você estiver interessado em receber meus textos semanalmente, clique aqui e cadastre seu e-mail.
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Quatro filmes de temática sexual
Cinema
Quatro filmes de temática sexual
26 de julho de 2025 at 21:29 0
Dirigido por Stanley Kubrick, o filme "De Olhos Bem Fechados" (Eyes Wide Shut), lançado em 1999, acompanha o médico Bill Harford (Tom Cruise), cuja vida aparentemente perfeita com sua esposa Alice (Nicole Kidman) é abalada após a confissão de uma fantasia sexual. Chocado, Bill embarca em uma jornada noturna e surreal pela elite secreta de Nova York, onde se depara com rituais misteriosos e uma orgia mascarada. A obra é baseada na novela de 1926, "Breve Romance de Sonho", do austríaco Arthur Schnitzler (1862-1931), um autor conhecido por explorar temas sexuais, fortemente influenciado por Sigmund Freud. No entanto, para o espectador atual, o simples fato de uma mulher casada sentir desejo por outro homem pode não justificar a crise profunda que se instala no casamento de Bill e Alice. Os acontecimentos na elite secreta, nos quais o marido se envolve quase por acaso, também parecem um tanto fantasiosos. Embora o filme seja muito bem dirigido e Tom Cruise e, principalmente, Nicole Kidman entreguem atuações excelentes, tenho a impressão de que "De Olhos Bem Fechados" já nasceu datado — e, possivelmente por isso, teve uma recepção morna em seu lançamento. *** Também com Nicole Kidman, "Babygirl" é um suspense erótico de 2024 dirigido por Halina Reijn e produzido pela A24, que explora a dinâmica de poder e o desejo em um ambiente profissional. A aclamada atriz interpreta Romy, uma CEO de sucesso que, apesar de ter uma vida familiar aparentemente perfeita, sente-se insatisfeita. Sua vida toma um rumo inesperado quando ela se envolve em um caso proibido com Samuel (Harris Dickinson), seu jovem e carismático estagiário. Se em "De Olhos Bem Fechados" o desejo de uma mulher casada por outro homem é tratado como um evento gravíssimo, em "Babygirl" a esposa – vivida, por coincidência, pela mesma atriz – sabe exatamente o que quer em termos sexuais e luta por isso. Uma abordagem que parece muito mais contemporânea. *** "Sexo, Mentiras e Videotape" (Sex, Lies, and Videotape) é um filme americano de drama de 1989, escrito e dirigido por Steven Soderbergh. Foi o filme de estreia de Soderbergh e se tornou um marco para o cinema independente, ganhando a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1989 e o Prêmio do Público no Festival de Sundance. No filme, o retorno de Graham Dalton, interpretado por James Spader (que ganhou o prêmio de Melhor Ator em Cannes por este papel), um homem misterioso e sexualmente impotente que filma mulheres falando sobre suas fantasias, abala a vida do casal Ann e John Mullany. Enquanto Ann, vivida por Andie MacDowell, é sexualmente reprimida e lida com sua própria infelicidade, John, interpretado por Peter Gallagher, está tendo um caso com a irmã de Ann, Cynthia, papel de Laura San Giacomo, uma mulher de espírito livre. As filmagens de Graham funcionam como um catalisador, forçando os personagens a confrontarem suas verdades ocultas, suas mentiras e a natureza complexa de suas relações, expondo a hipocrisia e a falta de comunicação que permeiam suas vidas. O motivo pelo qual o personagem faz essas filmagens de mulheres falando sobre suas fantasias sexuais não é explicitado no filme, mas a profundidade da questão é inegável. "Sexo, Mentiras e Videotape" é, sem dúvida, uma obra-prima. *** "Ninfomaníaca" (Nymphomaniac), dirigido por Lars von Trier, é um drama artístico de 2013 dividido em dois volumes que explora a vida sexual de Joe (Charlotte Gainsbourg), uma mulher autodiagnosticada como ninfomaníaca. A narrativa se desenrola quando Joe é encontrada espancada em um beco por Seligman (Stellan Skarsgård), que a leva para casa e ouve sua história. Através de flashbacks detalhados e explícitos, Joe narra sua vida desde a juventude, passando por suas inúmeras experiências sexuais e suas tentativas de entender e controlar sua compulsão. A conversa entre os dois personagens é fascinante, abordando aspectos tanto sexuais quanto culturais – Seligman, com suas referências a música, história e filosofia, é um assombro. O final, completamente imprevisto, ajuda a consagrar "Ninfomaníaca" como a obra-prima que é.
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Prefácio de “A mulher de César”
Engenharia, Obra Literária
Prefácio de “A mulher de César”
20 de julho de 2025 at 14:13 0
Chamem de mania (ou TOC), mas por um longo tempo minha obra literária – fora o que escrevo no site fabriciomuller.com.br, composto de comentários sobre literatura, música, cinema e outros assuntos – tinha textos de aproximadamente cinquenta páginas no formato A4. Assim foram compostos minha obra de estreia, “Um amor como nenhum outro”, de 2017 (Schoba); as quatro histórias de “O verão de 54 (novelas)”, de 2019 (Artêra); e os três livros que compõem “Rua Paraíba” (Café do Escritor), de 2020. Uma mania (ou TOC) também presente era o objetivo de escrever histórias com estilos muito diferentes entre si: “Verão de 54 (novelas)” tem uma história em metalinguagem (“O Verão de 54”), um policial em formato de diálogo (“Morrissey”), uma história convencional (“Conversão”) e uma história para adolescentes (“Sorry”). Enquanto eu escrevia as histórias de “O verão de 54 (novelas)”, e no mesmo formato de cinquenta páginas em A4, também terminei as versões iniciais de um livro de poesias (“Sempre”), uma história de delírio metafísico-literário (“deus um delírio” – para fins de precisão, é importante dizer que foi o único em que não consegui chegar nem perto das cinquenta páginas) e uma novela erótica (“Marina”). Minha ideia inicial era publicar os três livros – cujas versões finais estão nesta coletânea – separadamente, já que, para mim, não combinavam com “O verão de 54 (novelas)”. A mania (ou TOC) acabou quando vi uma entrevista com João Ubaldo Ribeiro, que disse – cito de memória – que tinha escrito “Viva o Povo Brasileiro” para provar a todos que conseguia fazer um romance enorme, como os alemães. Resolvi imitá-lo, e assim surgiu “3040”, com cerca de 450 páginas, já publicado, livro que teve a mentoria da grande Juliana Frank. À medida que a longa escrita de “3040” transcorria, e como a mania (ou TOC) das cinquenta páginas A4 já tinha terminado, pensei em escrever um livro de contos. Eu já tinha um conto, “A mulher de César”, publicado numa coletânea (“Ser: Antologia Emcontos”, da EntreCapas, lançada em 2019), coordenada pelo grande Robertson Frizero, para quem eu tinha escrito alguns microcontos num grupo de literatura no WhatsApp – que são a maioria dos contos muito curtos desta coletânea. Tinha também o já citado “Marina” (ainda não pensava em incluir “Sempre” e “deus um delírio”, que não são contos). Enfim, conversei com a Juliana Frank, que me ajudou muito nos demais contos presentes aqui, principalmente me incentivando a incluir elementos fantásticos em histórias onde eles não ocorriam. Ela me ajudou também a diminuir de maneira significativa o número de páginas de “Marina”. A coletânea ficou pronta alguns anos atrás. Há poucos dias, resolvi finalmente incluir “Sempre” e “deus um delírio”, já que a coletânea já é estranha o bastante – duas outras histórias estranhas não fariam assim tanta diferença. Pela temática “herege”, pelo erotismo e pela esquisitice generalizada, muitas histórias aqui poderão assustar quem me conhece. Afinal de contas, sou um tranquilo engenheiro civil – profissão da qual retiro meu sustento – abstêmio, católico praticante, casado com a mesma mulher há quase 35 anos e pai de uma psicóloga de sucesso. A única “esquisitice visível” na minha vida é escrever textos mais ou menos convencionais sobre literatura, música, cinema, história e outros assuntos no meu site. Mas gosto de pensar que minha literatura não tem nenhuma amarra, seja moral, religiosa ou política. Se não for assim, não tem graça. Pelo menos, não para mim. *** A ilustração que acompanha este texto foi feita pelo Gemini para o conto "Boneca". Se você quiser receber meus textos semanalmente, clique aqui e cadastre seu e-mail.
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Gracie Abrams na orthographia d’alvorada do século XX
Música
Gracie Abrams na orthographia d’alvorada do século XX
18 de julho de 2025 at 04:36 0

Gracie Abrams: Um Novo Astro na Constellação Musical

  A "culpa" é da Selena Gomez. Seu namorado, o sr. Benny Blanco, produziu e dirigiu um videoclipe encantador em que a illustre cantora e actrîz surge deitada na cama com uma artista que eu, confesso, nunca d'antes ouvira fallar: Gracie Abrams. A canção, "Call Me When You Break Up", rapidamente me fisgou e, por mezes, o clipe tornou-se um ritual quotidiano. Mas, afinal, quem é essa tal de Gracie Abrams? Segundo a Wikipédia, ella é uma cantora e compositora norte-americana nascida em mil novecentos e noventa e nove, filha do renomado cineasta J. J. Abrams e da productora de cinema e televisão Katie McGrath. No Instagram, ella costuma apparecer no palco, vestida de forma sóbria, com longos vestidos e um violão. Os logares de seus shows são enormes – estádios e gymnásios. "Ella deve ser um phenomeno", pensei, surpreso por nunca ter cruzado com seu trabalho. Uma situação que seria impensável nos annos de mil novecentos e oitenta, quando a falta de internet tornava quasi obrigatório conhecer os grandes nomes da música global. Por um tempo, resisti a ouvir qualquer outra música de Gracie Abrams além de "Call Me When You Break Up". Até que a curiosidade venceu e decidi dar uma chance a um de seus maiores successos, "I Love You, I'm Sorry". Foi amor à primeira audição. Hoje, ella lidera as audições no meu Last.fm nos últimos noventa dias. Sua voz é delicada, sussurrada e, às vezes, um tanto rouca. A dynamica de muitas de suas canções apresenta um crescendo sutil. A maioria das faixas começa de forma suave, frequentemente com apenas um violão ou piano acompanhando sua voz sussurrante. Gradualmente, a producção addiciona camadas: um synthetizador, uma batida leve, backing vocals ou um baixo discreto. Esse augmento progressivo de instrumentação reflecte a intensificação de um sentimento ou lembrança. Bons exemplos dessa dynamica podem ser ouvidos em "I Miss You, I'm Sorry", "21" e "Where Do We Go Now?". Mesmo com a suavidade, ella usa a voz de forma dynamica. Em "I Know It Won't Work", por exemplo, a voz de Gracie começa quasi como um lamento, mas no refrão, ganha uma força sutil, mantendo, ainda assim, um tom íntimo. Essa pequena mudança na intensidade vocal é incrivelmente poderosa. Seus videoclipes são, na maioria das vezes, intimistas: a cantora apparece em locaes sem glamour (sua cama bagunçada, a cozinha, uma praia commum, o banco de trás de um carro qualquer), e quasi sempre sem maquilhagem. De forma premeditada, ella se apresenta como uma garota normal, em situações com as quaes os fãs podem se identificar profundamente. É um conceito conhecido como "bedroom pop", um sub-gênero em que os artistas produzem músicas de seus próprios quartos. Mesmo no palco, como mencionei, suas roupas, apezar de bonitas, não exhibem grande glamour. E suas melodias são simplesmente lindas! Selena Gomez faz muito mais parcerias com cantores do que com cantoras. Não me parece um acaso ella ter escolhido Gracie Abrams para dividir uma canção. Gracie Abrams é um talento raro.   (A passagem para a grafia antiga deste texto foi feita no Gemini, da Google. A imagem que acompanha o texto foi obtida na Rolling Stone)
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A Outra Terra – Uma pequena obra-prima de ficção científica
Cinema
A Outra Terra – Uma pequena obra-prima de ficção científica
13 de julho de 2025 at 18:46 0
Tudo começou quando a colunista da Folha, Lygia Maria, publicou em sua conta no X (@lygia_maria) que "A Outra Terra", filme de Mike Cahill de 2011, era sua resposta para a pergunta da conta @TheCinesthetic: "cite um filme que te surpreendeu, mas sobre o qual ninguém fala". Junto com a resposta, vinha a bela fotomontagem que acompanha este texto. Ao ver a imagem, que mostra uma "outra Terra" vista do nosso planeta, tive a intuição de que gostaria do filme – e comentei isso com a colunista –, mas não imaginava o quanto. "A Outra Terra" inicia com Rhoda Williams (Brit Marling), a protagonista, celebrando com amigos sua entrada no famoso MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts). Pouco depois, em uma cena no carro, ela ouve no rádio a notícia da descoberta de um novo planeta, semelhante à Terra, e visível no céu. Enquanto dirige, ela se inclina para fora da janela para observar este novo astro, chamado no filme de Terra 2, e acaba causando um acidente gravíssimo. Declarada culpada, Rhoda passa quatro anos na prisão. Ao sair, abandona os estudos, começa a trabalhar como servente de limpeza e tenta lidar com a culpa, buscando conversar com o motorista do carro que atingiu. Conforme o filme avança, a "Terra 2" vai se tornando cada vez maior no céu, e notícias sobre seu estranho comportamento são constantemente veiculadas em diversas cenas. "A Outra Terra" é filmado de maneira aparentemente amadora, frequentemente com cores dessaturadas e câmera na mão. Sua ausência de polimento faz com que não pareça um filme "cinematográfico" convencional. O clima, ao mesmo tempo lento e meio esquisito, me fez lembrar um dos meus filmes preferidos, "Império dos Sonhos" (Inland Empire), de David Lynch, de 2006 – embora este, é preciso dizer, seja bem mais estranho que "A Outra Terra". Além disso, a atuação de Brit Marling me remeteu bastante à grande atriz Liv Ullmann em filmes do cineasta sueco Ingmar Bergman (1918-2007), como "Gritos e Sussurros", "Persona" e "Cenas de um Casamento". Não só as duas são fisicamente parecidas, como possuem um estilo de atuação contido e minimalista, com uma notável capacidade de comunicar muito através dos olhos, transmitindo profundidade, sofrimento ou uma complexidade silenciosa. É importante ressaltar que, apesar de ser um filme de ficção científica, "A Outra Terra" mergulha em uma angústia existencial – a culpa – como se fosse uma obra do mestre sueco. No entanto, a solução para os conflitos suscitados ao longo do filme não me agradou tanto, provavelmente porque me lembrou que esta pequena obra-prima, por mais esquisita e existencial que seja, é, no fim das contas, uma história de ficção científica. *** Quem se interessar em receber meus textos semanalmente, clique aqui e cadastre seu e-mail.
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3040 – versão impressa
Literatura, Obra Literária
3040 – versão impressa
13 de julho de 2025 at 04:17 0
Chegaram as cópias do autor do meu livro 3040, se alguém quiser posso pedir uma cópia. Como é impresso nos Estados Unidos e vem para cá, ficou meio caro, mas vou cobrar um pouco menos do preço de custo: 70 reais. Se alguém estiver interessado, pode me mandar um pix para fabriciomuller60@gmail.com que deve chegar para você em torno de um mês. O livro tem 442 páginas, e vou mandar com dedicatória.
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Três livros de teor erótico
Literatura
Três livros de teor erótico
13 de julho de 2025 at 04:15 0
Eu comprei “Porcos com asas”, de Marco Lombardo Radice e Lidia Ravera (Editora Brasiliense, 185 página, tradução de Maria Celeste M. Leite Souza, publicado originalmente em 1976), provavelmente recomendado pela Veja. O livro começa assim:
Caralho. Caralho, caralho, caralho. Buceta. Buceta peluda, quente, cheirosa. Buceta de putinha. Nada... Antes, falando estas coisas, eu gozava ou, pelo menos, me vinha vontade... Quando eu estava com meus amigos, dizia estas palavras e depois caía na gargalhada. Quando eu estava sozinha, pensava nelas, falava a meia voz e, ligeira, enfiava a mão dentro da minha calcinha, de olho na porta e de ouvidos tão atentos que eu podia ouvir até o ranger das escadas. Era o pânico total. Depois, eu bem que cortaria minha mão, mas na hora era tão bom... Era como uma felicidade molhada, explosiva, um grito abafado, e pronto!... Agora, mesmo quando estou sozinha, é como se estivesse com outras pessoas dá vontade de rir. Na verdade, não é que eu tenha vontade de rir: eu rio porque nunca estou só, mesmo quando não tem ninguém, tem sempre um cretino para me julgar. Caralho inchado, caralho duro, com a pele peluda e a cabeça pelada saindo pra fora: já peguei em sete. Isso não me abalou muito, não. Mas eles não são todos iguais: uns têm um jeitão doente, outros, um ar saudável. Uns todos enrugados, outros lisinhos. Pô, até agora, nada! Vou tirar meu pijama e deitar de barriga pra cima, como se estivesse morta... Necrotério: mesa de mármore. Cheiro forte de desinfetante. Luz fixa. Silêncio pesado: Antônia P., 16 anos, sexo feminino, jaz morta (cubro meu rosto com o lençol). Ruído de passos: um grupo de pessoas, compungidas, se aproxima, guiadas por um homem de avental branco: um tipo bonito, mas com um ar ausente de cuidador de cadáveres (francamente, um tipo que vive no meio de cadáveres deve ser muito espiritual). Atrás dele vêm por ordem: mamãe, vestida com aquele conjunto preto que ela fez no ano passado (parece cruel, mas espero que ela tenha o bom gosto de não querer se parecer comigo, pelo menos enquanto eu estiver no necrotério), palidíssima, finalmente sem nenhuma maquilagem.  Papai, ligeiramente ofegante, com um lenço branco em volta daquele pescoço bovino, parece estar à beira de um enfarte. Tia Bice, seca e antipática, não perde um detalhe (que diabo ela veio xeretar aqui, se ela nunca me aturou?). Ele, de jeans e camiseta (não queriam que Ele entrasse, mas Ele contestou, resoluto: "Ou vocês me deixam vê-la ou me mato aqui mesmo!"). Eles abrem alas e, com respeito, o observam passar. O homem de avental branco levanta o lençol. Meus cabelos se espalham suavemente sobre o mármore branco; foram lavados para que fosse removido o sangue seco e agora brilham sobre o mármore como se fossem seda dourada. Meu rosto está pálido e sereno, sem espinhas (acho que os mortos não têm espinhas). O silêncio se enche de soluços.
O livro fez um sucesso imenso quando publicado por aqui, no início dos anos 1980, que foi quando o li pela primeira vez. O livro se apresenta como o diário íntimo de dois adolescentes, Rocco e Antônia, que vivem em Roma entre 1975 e 1976, e são ligados ao Partido Comunista Italiano. A história do relacionamento dos dois, com idas e voltas, às vezes parece uma Sessão da Tarde, mas as cenas de sexo são sempre descritas de maneira explícita. E, por mais que as questões sociais pareçam datadas para o leitor de hoje, o livro serve como uma introdução ao pensamento da esquerda italiana nos anos 1970, uma época que me interessa bastante. *** Também nos anos 1980 que li pela primeira vez “O mundo pecaminoso que vivi”, de Mylène Demarst. Publicado pela Luzeiro Editora e com 143 páginas, o livro se declara como uma história real, sobre as aventuras sexuais da autora, que na verdade seria uma importante atriz francesa de cinema – e na edição consta até o nome do tradutor, um tal de Rubens F. Lucchetti. Mais do que isso, o livro seria a continuação de outra edição de memórias sexuais da autora, chamado “Confissões de uma Estrela”. Mas tudo isso, ao que tudo indica, é falso. Mylène Demarst deve ser uma autora (ou autor) brasileira, já que não há nenhuma menção deste nome no Google fora daqui – e mesmo em pesquisas brasileiras, a autora só aparece em dissertações sobre livros censurados, como “ESCREVER É SUBVERSIVO: Censura a livros eróticos e pornográficos na Ditadura Civil-Militar Brasileira.”, de Julina Belinaso[1]. O livro é razoavelmente bem escrito, as aventuras da “atriz” são meio exageradas, mas nada que comprometa muito. E o final apresenta o texto de “A iniciação de Eugênia”, uma “peça em um ato, inspirada no Marquês de Sade”. Conforme apresentado em “O mundo pecaminoso que vivi”, a peça “foi encenada no Teatro Royal, de Budapest (sic)”. Duvido que ela tenha sido encenada! Segue o trecho final do capítulo 4 do livro de Mylène Demarst:
Inopinadamente, ele atirou-se sobre nós. Primeiro atacou-me, beijando-me o púbis e a vagina, depois Christine, fazendo o mesmo. Desabotoei os botões da frente de suas calças e comecei a acariciar e excitar com beijos lúbricos o seu membro. Aos poucos ele foi endurecendo e principiei a masturbá-lo enquanto me oferecia toda aberta, para o contato manual de Carl, que beijava os seios de Christine ou sugava-os, e com as mãos trabalhava avidamente nas nádegas da moça. Assim permanecemos naqueles deliciosos contatos de mãos e bocas. É uma das coisas mais maravilhosas que se pode imaginar: assim, gozamos profundamente, muito mais do que no coito. Atravessamos vários espasmos, mas ninguém, nenhum dos três, arredava pé. O odor de sexo excitava-nos muito mais. Completamente esgotados, caímos no tapete e acordamos algumas horas mais tarde. E tudo se renovou. No auge da orgia, Carl se desprendeu de nós e foi até o telefone. Falou alguma coisa. Depois, voltou para os nossos carinhos. Daí meia hora, chegavam três rapagões de físico atlético. Carl recebeu-os alegremente. Nós estávamos completamente nus; imediatamente, eles também se despiram. Bebemos uísque puro e nos entregamos à mais depravada das uniões sexuais que pode haver. Eu sentia que estava sendo penetrada por trás por um membro enorme, enquanto tinha o membro de Carl entre meus lábios e sugava-o deliciosamente. Uma mão acariciava-me a vagina.
*** "Tudo o que você não queria saber sobre sexo", de Adão Iturrusgarai e Mirian Goldenberg (Record, 2005), “se propõe a desvendar e discutir a sexualidade de uma forma leve, mas, ao mesmo tempo, bastante informativa e provocadora”. O livro tem cartuns do autor e questionamentos da autora, e tem momentos mais e menos interessantes. Alguns cartuns são bons, como este, abaixo: *** [1] BELINASO, Juana. Escrever é subversivo: censura a livros eróticos e pornográficos na Ditadura Civil-Militar Brasileira. 2020. 120 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Arquivologia) – Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2020. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/229628. Acesso em: 23 jun. 2025.
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A Descoberta de Gracie Abrams: Uma Culpa de Selena Gomez?
Música
A Descoberta de Gracie Abrams: Uma Culpa de Selena Gomez?
6 de julho de 2025 at 22:03 0
A "culpa" é da Selena Gomez. Seu namorado, Benny Blanco, produziu e dirigiu um videoclipe encantador em que a cantora e atriz aparece deitada na cama com uma artista que eu, confesso, nunca tinha ouvido falar: Gracie Abrams. A música, "Call Me When You Break Up", rapidamente me fisgou e, por meses, o clipe virou um ritual diário. Mas, afinal, quem é essa tal de Gracie Abrams? Segundo a Wikipédia, ela é uma cantora e compositora norte-americana nascida em 1999, filha do renomado cineasta J. J. Abrams e da produtora de cinema e televisão Katie McGrath. No Instagram, ela costuma aparecer no palco, vestida de forma sóbria, com longos vestidos e um violão. Os locais de seus shows são enormes – estádios e ginásios. "Ela deve ser um fenômeno", pensei, surpreso por nunca ter cruzado com seu trabalho. Uma situação que seria impensável nos anos 1980, quando a falta de internet tornava quase obrigatório conhecer os grandes nomes da música global. Por um tempo, resisti a ouvir qualquer outra música de Gracie Abrams além de "Call Me When You Break Up". Até que a curiosidade venceu e decidi dar uma chance a um de seus maiores sucessos, "I Love You, I'm Sorry". Foi amor à primeira audição. Hoje, ela lidera as audições no meu Last.fm nos últimos 90 dias. Sua voz é delicada, sussurrada e, às vezes, um tanto rouca. A dinâmica de muitas de suas canções apresenta um crescendo sutil. A maioria das faixas começa de forma suave, frequentemente com apenas um violão ou piano acompanhando sua voz sussurrante. Gradualmente, a produção adiciona camadas: um sintetizador, uma batida leve, backing vocals ou um baixo discreto. Esse aumento progressivo de instrumentação reflete a intensificação de um sentimento ou lembrança. Bons exemplos dessa dinâmica podem ser ouvidos em "I Miss You, I'm Sorry", "21" e "Where Do We Go Now?". Mesmo com a suavidade, ela usa a voz de forma dinâmica. Em "I Know It Won't Work", por exemplo, a voz de Gracie começa quase como um lamento, mas no refrão, ganha uma força sutil, mantendo, ainda assim, um tom íntimo. Essa pequena mudança na intensidade vocal é incrivelmente poderosa. Seus videoclipes são, na maioria das vezes, intimistas: a cantora aparece em locais sem glamour (sua cama bagunçada, a cozinha, uma praia comum, o banco de trás de um carro qualquer), e quase sempre sem maquiagem. De forma premeditada, ela se apresenta como uma garota normal, em situações com as quais os fãs podem se identificar profundamente. É um conceito conhecido como "bedroom pop", um subgênero em que os artistas produzem músicas de seus próprios quartos. Mesmo no palco, como mencionei, suas roupas, apesar de bonitas, não exibem grande glamour. E suas melodias são simplesmente lindas! Selena Gomez faz muito mais parcerias com cantores do que com cantoras. Não me parece um acaso ela ter escolhido Gracie Abrams para dividir uma canção. Gracie Abrams é um talento raro. ***
Imagem que acompanha o texto obtida no Last.fm.
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