“o que será que os antigos romanos, com seus deuses imponentes e grandiosos, achavam de um pessoal - muitos compatriotas entre eles, inclusive - que achava que Deus era um pobre judeu que teve a morte mais humilhante possível, na cruz? Deviam achar estranho, no mínimo. Eu acho que também acharia.”Para dar uma ideia da coisa, a figura que acompanha este texto, obtida aqui, é um desenho esquemático do Grafite de Alexamenos (também conhecido como grafite blasfemo) que, segundo a Wikipédia,
“é um grafite da Roma Antiga gravado em gesso sobre uma parede nas proximidades do Palatino, em Roma, hoje encontrado no Museu Antiquário do Palatino. É uma das primeiras representações gráficas da crucificação de Jesus, junto com algumas gemas encravadas. É difícil datar, mas estima-se que tenha sido feito por volta de 200. A imagem parece mostrar um jovem adorando uma figura crucificada e com cabeça de burro. A inscrição grega traduz-se aproximadamente como 'Alexamenos adora [o seu] deus', indicando que o grafite aparentemente foi feito para satirizar um cristão chamado Alexamenos.”As pesquisas sobre o chamado Jesus Histórico tentam desvendar essas e outras questões, utilizando métodos científicos para descobrir mais sobre o fundador do cristianismo (bem, até essa denominação é discutível, mas essa é outra questão). Existem dois canais no YouTube excelentes sobre esse assunto: o de Jonathan Matthies, mais voltado à divulgação científica, e a do professor da UFRJ Andre Leonardo Chevitarese, um pesquisador de mão cheia. O primeiro livro que li sobre Jesus Histórico é de um livro que eu tinha comprado, coincidentemente, antes de acompanhar o canal do pesquisador da UFRJ: “A descoberta do Jesus histórico”, coletânea organizada pelo próprio Chevitarese e por Gabriele Cornelli (Paulus, 167 páginas, lançado em 2009). São muitos artigos interessantíssimos, e os meus preferidos versam sobre assuntos que correlacionam cristianismo e judaísmo: “Parábolas de Jesus e parábolas talmúdicas", de Edgard Leite Ferreira Neto, “O Cristianismo e os essênios. João Batista e Jesus conheceram os essênios?”, de Isidoro Mazzarolo, e “A oração de Nabônides (4Q242) e o Jesus histórico”, de André Leonardo Chevitarese. Numa live dia desses o professor da UFRJ comentou que logo lançará um livro sobre a visão de outros povos (como os romanos) sobre o cristianismo nos primeiros séculos da nossa era. Não vejo a hora de ler! Finalmente, meu último interesse estranho a ser comentado neste texto é o povo etrusco, que habitava o norte da Itália e que acabou sendo conquistado – e/ou absorvido – pelos romanos alguns poucos séculos antes de Cristo. Muito do que se sabe sobre a cultura e os costumes desse povo é de difícil comprovação, já que sua linguagem ainda não foi totalmente decifrada e que os romanos não fizeram muita questão de preservar os documentos etruscos. Já li o primeiro dos quatro livros sobre o assunto que comprei recentemente na Estante Virtual, “Os Etruscos – uma civilização reencontrada”, de Attilio Gaudio (Edições MM, tradução de Charles Marie Antoine Bouéry, 207 páginas, publicado originalmente em 1969), mas não vou comentar nada sobre ele ainda – pretendo escrever mais sobre esse povo fascinante no futuro.
“Um sujeito na lanchonete de um certo museu me disse que nada lhe dava mais satisfação do que conviver com um original. Também insistiu que quanto mais cópias houver no mundo, maior será o poder do original — que às vezes se aproxima do poder de uma relíquia sagrada. Pois o que é singular é significativo, com a ameaça de destruição que paira sobre ele. A confirmação dessas palavras veio na forma de um grupo de turistas que celebrava com concentração devotada uma pintura de Leonardo da Vinci. Apenas ocasionalmente, quando algum deles já não aguentava mais, ouvia-se o clique de uma máquina fotográfica, que soava como um amém falado numa nova língua digital.”Já no meu “Memórias” eu tenho um capítulo assim:
“Escrevi um conto batido a máquina. Cabia numa folha A4, no modo paisagem. Era escrito em três colunas: lendo a primeira coluna, o conto tinha um sentido. Se se juntassem as linhas da primeira e da segunda colunas, o sentido se modificava. Juntando a primeira, a segunda e a terceira colunas, outro sentido ainda aparecia. Eu não devia ter mais que onze anos, e mostrei o conto para um colega do curso de francês. Ele, então, mostrou para o pai dele, que veio com a sentença: ‘esse menino vai ser um grande escritor’. Eu ri e ele respondeu, sério: ‘meu pai nunca se engana.’”Duas lembranças de episódios longínquos no tempo, duas opiniões originais (esquisitas?) de desconhecidos: um gosta de pessoas originais, outro achava que eu iria ser um grande escritor. Mas “Correntes” tem muito mais do que pequenas lembranças: o livro fala sobre suas obsessões por viagens e por “gabinetes de curiosidades onde se coleciona e expõe objetos raros, únicos, bizarros e disformes”, como órgãos disformes de seres humanos conservados em formol (duas obsessões que, é interessante comentar, eu não tenho). Além disso, algumas histórias – não sei se ficcionais ou não – são contadas de maneira completa, como a de uma mãe e um filho que aparentemente desaparecem numa ilha turística, e a de uma nobre no século XVIII que pede desesperadamente, por cartas, para que Francisco, o Imperador da Áustria, dê um enterro digno para o seu pai. “Correntes” é um livro fascinante, aliás muito melhor que o meu “Memórias”. (foto que acompanha o texto obtido no site da Revista Veja)
"era comunista, e isso a gente podia aceitar; ele tinha um caso com uma mulher, e isso dava para aceitar; mas nunca acreditou em Deus, e isso não dava para aceitar".(trecho de Energia, terceira parte do meu livro "Rua Paraíba", publicado recentemente - mais detalhes aqui; fonte da foto: Estadão)
Formado por três livros (“Rua Paraíba”, “Memórias” e “Energia”) escritos entre 2016 e 2019, “Rua Paraíba” conta histórias pessoais, histórias profissionais e comentários do autor a respeito de assuntos como religião, economia, política e música pop.
Cada uma das três obras tem um foco e um estilo diferentes: “Rua Paraíba” conta sobre o início da vida de casado do autor e seu trabalho como hidrólogo; “Memórias” é composto por recordações e comentários curtos; finalmente, “Energia” é um livro sobre o início da vida profissional do autor como especialista em estudos energéticos de usinas hidráulicas, função que ele exerce até hoje.
De todo modo, uma característica permeia todo o volume: a passagem de um assunto para outro de maneira mais ou menos aleatória – mas num todo que, espera-se, faça sentido.
Enfim: quanto ao estilo, na falta de um termo melhor, “Rua Paraíba” é uma espécie de ensaio autobiográfico.
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