novembro 2020

Deus, essa gostosa, de Rafael Campos Rocha
Literatura
Deus, essa gostosa, de Rafael Campos Rocha
29 de novembro de 2020 at 15:23 2
Pode ser que você tenha visto nas redes sociais a historinha do John John, um cachorro obcecado por comida e com delírios de grandeza. A ideia do personagem, baseado no nosso schnauzer vira-lata de mesmo nome, é do André Curtarelli, namorado da minha filha Teresa. Acabei pedindo ajuda para minha mentora e amiga Juliana Frank (sem a qual eu teria abandonado a ideia de escrever novos livros) e começamos o projeto. O fato é que, nas reuniões de roteiro, praticamente só o André e a Juliana dão ideias, e eu e a Teresa acabamos só organizando as coisas – é “produtores” que fala? Desde o início, minha ideia era chamar o Rafael Campos Rocha para desenhar a história, e por sorte ele gostou da ideia! Mais do que isso, não só o projeto está ficando bom demais – posso elogiar, já que basicamente nenhuma ideia e nenhum desenho ali são meus – como o Rafa desenhou o John John exatamente do jeito que eu imaginava. Enfim, por que eu quis que o Rafael Campos Rocha fosse o desenhista da nossa história? Porque eu amo “Deus, essa gostosa”, uma HQ ilustrada e roteirizada por ele, publicada pela Quadrinhos na Cia. em 2012. Ele mesmo me avisou que havia sido publicada uma outra HQ da mesma personagem (“Deus aos domingos”), publicada pela Veneta em 2018 – e é claro que a comprei assim que pude! O personagem Deus de Rafael Campos Rocha - que também apareceu na Folha de São Paulo - é uma mulher linda, negra, sexualmente ativa e que passa boa parte do tempo sem roupa. Não é um velho sádico como o Deus de Allan Sieber, mas é Deus mesmo, sério, compenetrado, responsável, e frequentemente de saco cheio com os humanos – como Ele mesmo deve ser, afinal de contas. Além de as histórias serem ótimas e divertidas, a junção de um Deus de comportamento ao mesmo tempo inesperado (sexualmente ativo) e esperado (responsável e compenetrado) mostra a beleza da liberdade artística – liberdade esta que tento também utilizar nos meus escritos.
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Diego Armando Maradona (1960-2020)
Esporte
Diego Armando Maradona (1960-2020)
25 de novembro de 2020 at 21:37 0
Ninguém aqui em Curitiba sabia ainda quem era Maradona quando meu avô assistiu a um especial com uma série de jogadas do argentino, espetaculares. Ele ainda jogava no Argentinos Juniors, nem para o Boca Juniors tinha ido ainda. A partir daquele momento, para meu avô Pelé não existia mais. Maradona era muito melhor. Continuou repetindo isso para quem quisesse ouvir, enquanto viveu. *** Eu tinha a foto que acompanha este texto, obtida da revista Veja, colada na parede do meu quarto. Ela foi tirada praticamente no momento em que a Alemanha empatou o jogo no final da Copa de 1986, depois de estar perdendo de dois a zero: enquanto todos os argentinos estão desesperados, Maradona levanta a mão, em posição de desafio. A Argentina ganhou a Copa. *** Assisti ao jogo Brasil x Inglaterra do lado do meu amigo João Roberto Liparotti. Nenhum de nós dois viu que Maradona fez gol com a mão, mesmo depois de vários replays. *** Maradona torcia para o Boca Juniors, grande rival do meu time na Argentina, o River Plate. Isso não impediu que o Millonario postasse dois tweets lindos sobre o grande campeão, reproduzidos abaixo: Mais importante que isso ainda, acho, é o abraço que o técnico do River Plate, Marcelo Gallardo, dá no grande campeão numa partida em 2019, quando o Millonario jogou com o Gimnasia, time que Maradona treinava na ocasião - veja o video, numa reportagem ainda com mais algumas informações, aqui. *** Finalmente, quem foi melhor, Pelé ou Maradona? Eu acho que esse é um assunto inútil e divertido. Mas se fosse para eu responder, eu faria uma relação com o xadrez: normalmente os analistas deste esporte dizem que os jogadores de hoje em dia ganhariam dos melhores do passado, se estes pudessem ser teletransportados para o dia de hoje, simplesmente porque aprenderam com quem veio antes. Então, não tem como fazer uma comparação justa. Do mesmo modo, para mim, no futebol comparações entre jogadores de épocas diferentes são injustas por natureza. *** Descanse em paz, Maradona.  
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“A maçã envenenada”, de Michel Laub
Literatura
“A maçã envenenada”, de Michel Laub
20 de novembro de 2020 at 14:46 0
Roberto Bolaño, em seu monumental “2666”, escreveu algo (cito de memória) no sentido de que um conto pode ser perfeito, mas um grande romance deve ter, por definição, imperfeições e exageros – já que a vida não é perfeita mesmo. É interessante pensar nisso: algumas raras vezes eu termino de ler uma história de ficção e penso comigo: “isso aqui foi perfeito”. Um ou outro conto de Cortázar e Alice Munro, quase todo Kafka e mesmo um romance – “As irmãs Makioka”, de Junichiro Tanizaki – me passaram essa sensação de perfeição. E, como Bolaño mesmo dá a entender, achar que uma obra é perfeita não quer dizer necessariamente que ela seja melhor que outras, “imperfeitas” e impactantes. Pensando nisso tudo, comecei a brincar comigo procurando defeitos nos meus livros preferidos, e foi mais ou menos simples: vá lá, “Ada ou Ardor”, de Nabokov, o já citado “2666”, de Roberto Bolaño, “Em busca do tempo perdido”, de Marcel Proust, a série “Minha luta”, de Karl Ove Knausgard ou mesmo a poesia de Georg Trakl têm lá seus trechos chatos, normalmente ausentes das obras “perfeitas”. Enfim, tudo isso para falar que “A maçã envenenada”, do gaúcho Michel Laub (Companhia das Letras, 120 páginas, publicado originalmente em 2013), que conta basicamente a história do relacionamento atormentado entre o narrador da história e sua primeira namorada, sobre o qual o show do Nirvana em São Paulo em 1993 teve papel importante, é basicamente uma rara história “perfeita” - e que li de uma sentada. Lindo demais. (foto de Michel Laub obtida no site da Companhia das Letras)
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Roberto Campos em “Energia”, terceira parte de “Rua Paraíba”
Literatura
Roberto Campos em “Energia”, terceira parte de “Rua Paraíba”
15 de novembro de 2020 at 19:07 0
A primeira vez que lembro de ter ouvido falar de Roberto Campos foi numa entrevista na Veja em que ele, então senador pelo Mato Grosso, vituperava contra a lei de reserva de mercado da informática. Era uma coisa estranha: uma espécie de Dom Quixote, do próprio partido do governo (de quem era a responsabilidade pela a malfadada lei), numa luta solitária e infrutífera contra tudo e contra todos: nesse ponto específico, o governo e a oposição de esquerda estavam do mesmo lado, contra Roberto Campos. Era uma lei que hoje parece uma coisa do século XV: as grandes empresas estrangeiras de informática eram proibidas de investir no Brasil – nos dias de hoje, é como se ninguém pudesse mais comprar um iPhone ou um laptop da Lenovo. É claro que estavam todos errados, e só Roberto Campos estava certo. (...) Il va sans dire que Roberto Campos tinha uma forte rejeição por parte da esquerda. O Luís Fernando Veríssimo, inclusive, criou uma piada que dizia que Delfim Netto era o Roberto Campos brasileiro – o senador mato-grossense, afinal, era chamado de Bobby Fields. Para a esquerda ele era um entreguista. Queria vender o país para os Estados Unidos a preço vil (a esquerda adora essa expressão). Era um lobista que defendia apenas os interesses estadunidenses (aqui no Brasil, quando alguém fala “estadunidense”, pode saber que é de esquerda). Durante um bom tempo, o que Roberto Campos escrevia era lei para mim. Eu ficava esperando - não lembro exatamente quantas vezes por semana - para ler suas colunas no jornal, ficava acordado esperando suas entrevistas na TV, defendia o cara contra tudo e contra todos. O ápice da minha ligação com ele foi a leitura do monumental “Lanterna na Popa”, autobiografia de mais de mil páginas. Eu reconhecia que certos comentários dele eram grosseiros, mas que vida a do Roberto Campos! Ministro da Fazenda de Castello Branco, embaixador na Inglaterra no governo Médici, senador por Mato Grosso no governo Figueiredo. Fica evidente, no livro, a frustração que ele teve ao perder o poder que teve no início do regime militar e que nunca mais iria recuperar. Ele deixava claro sua opinião segundo a qual o milagre econômico do governo Médici dependeu de maneira fundamental das reformas que ele implantara, ainda no governo Castello Branco. Para Roberto Campos, o governo Médici era excessivamente repressor contra a oposição. Para quem, como eu, cresceu num lar em que a mãe, esquerdista, tinha um peso fundamental na ideologia da casa, ser um admirador tão incondicional de um burocrata importante do governo militar não deixava de ser meio incômodo. O fato de ele efetivamente não ter participado da repressão e tê-la até criticado um pouco não deixava de ser um alívio. Pequeno, mas um alívio. De todo modo, ele estava numa fase áurea em termos de influência intelectual – até a esquerda o estava respeitando - Roberto Campos subitamente parou de escrever no jornal, por estar doente. Eu senti o baque, fiquei meio perdido, mas achava, claro, que logo ele se recuperaria e eu teria de novo meu economista de bolso para poder copiar as opiniões. Mas isso não ocorreu. Roberto Campos faleceu depois de uns dois anos doente. Nesse meio tempo era possível ler algumas notícias sobre a sua vida de recluso. Uma delas é que ele se obrigava a rezar a Ave-Maria – mesmo sem acreditar direito em Deus - em algumas línguas, para não perder a memória. Não adiantou, acabou perdendo a vida. Desculpem essa piada sem-graça: é uma homenagem às piadas sem graça de Roberto Campos. Na época em que os telefones celulares eram melhores e mais caros quanto mais pequenos, ele escreveu que eles eram uma espécie de homenagem à impotência, já que viviam dobrados e paravam de funcionar quando entravam em túneis. Chamava o whisky de néctar. Ex-seminarista, no início de seu livro de memórias ele conta a história de um colega de seminário que virou padre, mas que acabou sendo afastado. Segundo o que um colega em comum acabou contando para Roberto Campos, o padre afastado
"era comunista, e isso a gente podia aceitar; ele tinha um caso com uma mulher, e isso dava para aceitar; mas nunca acreditou em Deus, e isso não dava para aceitar".
(trecho de Energia, terceira parte do meu livro "Rua Paraíba", publicado recentemente - mais detalhes aqui; fonte da foto: Estadão)
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“Rua Paraíba”, meu novo livro
Obra Literária
“Rua Paraíba”, meu novo livro
6 de novembro de 2020 at 10:03 0
"Rua Paraíba", meu livro mais recente, é autobiográfico, fala sobre minha carreira como engenheiro (além de muitos outros assuntos), e é composto por três partes, "Rua Paraíba", "Memórias" e "Energia", escritas entre 2016 e 2019. Seguem alguns links sobre a obra:
  • Trechos e outras informações: aqui
  • Texto do Alvaro Augusto: aqui
  • e-book na Amazon: aqui
  • Entrevista com Sandro Bier, do Café do Escritor: aqui
  • Texto do Horacio Sendacz: aqui
  • Compra do livro físico: e-mail para fabriciomuller60@gmail.com
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