Nietzsche

Mito e Verdade em Duas Biografias Essenciais – A desconstrução de Rasputin e Nietzsche pelas obras de Douglas Smith e Curt Paul Janz.
Filosofia, História
Mito e Verdade em Duas Biografias Essenciais – A desconstrução de Rasputin e Nietzsche pelas obras de Douglas Smith e Curt Paul Janz.
21 de setembro de 2025 at 11:59 0
Alguns vídeos na internet pintam o monge Grigori Rasputin (1869-1916) como a encarnação do mal. Com uma influência enorme na família imperial russa antes da queda do Império com as Revoluções de 1917, ele é até hoje visto como uma péssima influência para o czar Nicolau II e, principalmente, para sua esposa, a imperatriz Alexandra. No entanto, ele não é retratado de forma tão desfavorável na monumental biografia "Rasputin: Fé, poder e o declínio dos Romanov", de Douglas Smith (Companhia das Letras, tradução de Berilo Vargas, 1128 páginas, ano de publicação original: 2016). Sim, ele era promíscuo, mas muitas das orgias famosas em que participou foram exageradas por seus inimigos. Ao contrário do que se dizia, nada indica que ele tenha tido um caso com a imperatriz Alexandra. Ele foi assassinado, mas muito do que foi dito sobre a sua morte — como ter sobrevivido a vários envenenamentos — é simples exagero. E, finalmente, sua influência nos desmandos do czar foi basicamente nula: Douglas Smith o apresenta como uma voz da razão contra o teimoso, despreparado e arrogante Nicolau II, que quase sempre tomava a decisão errada para o Estado. Mas alguns acontecimentos estranhos, sempre lembrados quando se fala em Rasputin, eram basicamente verdadeiros: ele realmente dizia que, se fosse assassinado, o Império Russo cairia — o que de fato aconteceu. Seu olhar era realmente penetrante e assustador, como se pode ver em fotografias da época. E o mais estranho de tudo é a maneira como ele curava Alexei, o herdeiro do Império Russo, de crises de hemofilia — uma doença totalmente incurável. A documentação de suas curas é tão extensa e confiável que não restou outra opção ao biógrafo Douglas Smith a não ser sugerir que Rasputin, de fato, tinha algum poder sobrenatural.
Se a biografia acima é considerada a “definitiva” do “monge louco” russo, "Friedrich Nietzsche: Uma biografia", de Curt Paul Janz (Vozes, tradução de Markus A. Heidiger, 1648 páginas somando os três volumes, ano de publicação original 1978-1979), é a biografia definitiva do filósofo alemão, que nasceu em 15 de outubro de 1844 e faleceu em 25 de agosto de 1900. Até agora, só li o primeiro dos três volumes, com 660 páginas, mas achei interessante comentar, pois não se sabe quando terminarei a obra completa. Afinal, biografias definitivas, sempre cheias de detalhes, são difíceis de ler rapidamente (pelo menos para mim). O primeiro volume da biografia cobre a infância, a juventude e os anos em que Nietzsche viveu em Basileia como professor de filologia. Ele saiu de lá, aos 35 anos de idade, por problemas de saúde. Dos seus grandes livros, ele só tinha escrito "O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música" e "Humano, Demasiado Humano". Suas obras mais famosas, como "Assim Falou Zaratustra", "Além do Bem e do Mal" e "O Anticristo" serão abordadas no segundo volume, enquanto o terceiro e mais curto volume trata dos anos de sua loucura (1889-1900). Neste primeiro volume que li, a fascinante Lou Andreas-Salomé, sobre a qual eu comentei, nem aparece. Em compensação, a primeira parte fala da sua admiração inicial e do posterior rompimento com o grande compositor Richard Wagner, além de sua vida como professor e do início de suas ideias que revolucionaram a filosofia e até a psicologia. O que mais me marcou, neste primeiro volume, é como Nietzsche sofria com dores de cabeça e dificuldades de visão. É difícil não sofrer junto com ele, nem que seja um pouco! (Imagem que acompanha o texto obtida com o Gemini. Se você estiver interessado em receber este e outros textos meus semanalmente, clique aqui e cadastre seu e-mail.)
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Filosofia
“Ecce homo”, de Nietzsche
14 de julho de 2019 at 19:48 0
Nietzsche (fonte: Wikiquote)

“Por que eu sou tão sábio”. “Por que eu sou tão inteligente”. “Por que eu escrevo livros tão bons”. “Por que sou um destino”. Os títulos dos três primeiros e do último capítulos de “Ecce Homo”, de Friedrich Nietzsche (L&PM Pocket, 192 páginas, tradução e notas de Marcelo Backes) mostram que o filósofo alemão não estava numa fase exatamente marcada pela modéstia quando escreveu o livro. Como a obra foi escrita em 1887 e sua loucura – que duraria até sua morte, em 1900 – se iniciaria no ano seguinte, em 1888, frequentemente várias das afirmações de Nietzsche constantes em “Ecce Homo” – como os títulos dos capítulos, reproduzidos acima - são considerados fortes indícios do início de sua perda de sanidade mental. O livro é de cunho autobiográfico e filosófico ao mesmo tempo: enquanto nos capítulos cujos títulos são citados acima ele se concentra mais em sua própria genialidade, nos dez capítulos intermediários ele comenta suas obras anteriores, como “Assim falou Zaratustra” e “Além do bem e do mal”.

Em “Ecce Homo” Nietzsche reforça os pontos mais conhecidos de sua filosofia: a crítica da moral cristã (“moral de ressentidos”), a tese do eterno retorno (segundo o qual cada um terá de viver a vida como agora e vivê-la ainda uma vez e inúmeras vezes, sempre na mesma ordem e sequência), a exaltação dos fortes e o desprezo pelo pobres de espírito, a superação do homem pela criação – poética, em certo sentido – pelo “Super Homem”. Também descreve o processo de criação de algumas de suas obras, como o já citado “Assim falou Zaratustra”, escrito durante dezoito meses, em grande parte na Itália.

Como sempre em Nietzsche, o estilo literário é assombro: mestre nos aforismos, o filósofo disserta sobre diversos assuntos, como sua própria vida e a decadência da Alemanha.

Apresento alguns trechos a seguir para dar uma ideia da coisa.


"Àqueles que silenciam quase sempre lhes falta algo em fineza e polidez de coração; silenciar é uma objeção; engolir sapos faz, irremediavelmente, um mau caráter – e inclusive estraga o estômago... Todos aqueles que silenciam são dispépticos. –"

"Eu jamais compreendi a arte de me indispor comigo mesmo – e também isso eu devo a meu pai incomparável –, mesmo quando isso me pareceu ser de grande valor. Eu inclusive não me senti, por mais que uma afirmativa dessas possa parecer pagã, uma só vez que fosse, indisposto comigo mesmo; pode-se virar minha vida de frente e do avesso e apenas raramente, na verdade apenas uma única vez, se encontrará rastros de que alguém teve contra mim más intenções – mas talvez venha a se encontrar rastros um tanto demasiados de boas intenções... Minhas próprias experiências com esse tipo de gente, com o qual todo mundo tem más experiências, falam, sem exceção, em favor deles; eu amanso qualquer urso e sou capaz até de fazer de um palhaço uma pessoa decente. Durante os sete anos em que ensinei grego nas classes mais altas do Liceu de Basiléia,[10] jamais tive motivo para pôr alguém de castigo; os mais vagabundos eram diligentes comigo."

“Eu conheço meu fado. Um dia haverão de unir meu nome à lembrança de algo monstruoso – uma crise como jamais houve outra na Terra, na mais profunda colisão de consciência, em uma decisão contra tudo aquilo que até então tinha sido acreditado, reivindicado, santificado... Eu não sou homem, sou dinamite.”

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Lou-Andreas Salomé
Filosofia, Literatura
Lou-Andreas Salomé
26 de novembro de 2018 at 16:55 0
Romancista, ensaísta e psicanalista, Lou-Andreas Salomé (1861-1937) – nascida na Rússia, tendo passado grande parte da vida na Alemanha – escreveu uma vasta obra, quase toda esquecida nos dias de hoje. Mesmo assim ela é uma fonte de biografias ainda lidas com interesse, como esta ótima “Lou-Andreas Salomé”, de Dorian Astor (L&PM, 320 páginas). Por que sua vida ainda desperta uma atenção que sua obra não desperta mais? A resposta é simples: sua ligação profunda com o filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), com o poeta, também alemão, Rainer Maria Rilke (1875-1926) e com o “pai da psicanálise”, o austríaco Sigmund Freud (1856-1939). Com Nietzsche, Lou-Andreas Salomé tentou uma relação amorosa a três – o outro membro do triângulo era o escritor e médico alemão Paul Rée (1849-1901) –, apenas “espiritual”, sem sexo. Obviamente que os homens do grupo acabaram não gostando muito da brincadeira e o triângulo não durou muito: o primeiro a sair foi Nietzsche, que tinha se apaixonado por ela (possivelmente, foi o maior amor da vida do filósofo). (mais…)
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“Assim falava Zaratustra”, de Friederich Nietzsche
Filosofia
“Assim falava Zaratustra”, de Friederich Nietzsche
15 de outubro de 2017 at 16:10 0
A famosa frase de Friederich Nietzsche (1844-1900) segundo a qual “Deus morreu” é proferida logo no início de “Assim falava Zaratustra” (Nova Fronteira, 352 páginas). A “morte de Deus” é um dos temas basilares do clássico do filósofo alemão – os outros seriam a vinda do super-homem (que é a superação do homem tal qual conhecemos), a tese do eterno retorno (segundo a qual tudo o que acontece hoje já aconteceu no passado e continuará se repetindo no futuro), a crítica da moral racionalista e cristã e a “vontade de poder” (fundamento de tudo o que é vivo). (mais…)
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“Crepúsculo dos ídolos”, de Friederich Nietzsche
Filosofia
“Crepúsculo dos ídolos”, de Friederich Nietzsche
8 de outubro de 2017 at 15:47 0
“Crepúsculo dos ídolos ou como se filosofa com o martelo” é um livro curto e relativamente simples de ensaios do filósofo alemão Friederich Nietzsche (L&PM Editores, 144 páginas), e que pode ser considerado uma boa introdução à sua filosofia. (mais…)
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“Nietzsche”, de Scarlett Marton
Filosofia
“Nietzsche”, de Scarlett Marton
18 de junho de 2017 at 22:40 0
A coleção “Encanto Radical”, da Brasiliense, é uma série de curtas biografias sobre personagens históricos, artísticos e literários realmente encantadores. O nome da coleção é um primor. Carrego sempre comigo os exemplares das biografias de Marcel Proust, James Dean e Santa Teresa d’Ávila. (mais…)
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