fevereiro 2020

Literatura
Revisitando Isaías Caminha
25 de fevereiro de 2020 at 15:27 0

Já comentei aqui e aqui, respectivamente, a primeira e a segunda leituras de “Recordações do escrivão Isaías Caminha”. Na primeira leitura, escrevi:

Confesso que tenho um problema com Lima Barreto. Já tinha sido um sofrimento ler “Triste fim de Policarpo Quaresma”, e com este “Recordações do Escrivão Isaías Caminha” a coisa não foi diferente. Ele tem algo no estilo – lamentoso demais – que acaba dificultando a leitura.

Já na segunda, parece que um véu me saiu dos olhos:

Realmente, “Recordações do escrivão Isaías Caminha” é um livro amargo, mas isto, que tinha me chamado atenção na primeira leitura, é apenas parte da história: o fato é que as descrições de pessoas e situações apresentadas por Lima Barreto são vívidas, tão bem executadas que conseguem descortinar para o leitor toda uma época, quase como se visitássemos o Rio de Janeiro dos primeiros anos da República. O livro cintila.

Depois disso, postei no Instagram uma foto – que acompanha este texto – na qual comento que “Recordações do escrivão Isaías Caminha” é o “melhor livro da literatura brasileira, e não admito opiniões contrárias”.

Depois da postagem fiquei me perguntando se eu não estava sendo injusto com o restante da literatura brasileira, e resolvi ler de novo este livro. O que aconteceu é que nesta terceira leitura voltou a me chamar a atenção aquilo que eu tinha citado no meu primeiro texto sobre o romance:

(...) o painel preciso que ele pinta das mazelas brasileiras – o racismo, a falta de palavra dos políticos, o sensacionalismo da imprensa, a falta de responsabilidade generalizada – é impressionante.

Várias leituras, uma diferente da outra. Grandes romances não são aqueles que permitem isso? 

Conclusão: “Recordações do escrivão Isaías Caminha” é o melhor livro da literatura brasileira, e não admito opiniões contrárias.

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Cinema
Quatro filmes noir europeus
2 de fevereiro de 2020 at 18:23 0
Versátil

Como se sabe, filmes noir são filmes policiais americanos lançados nas décadas de 40 e 50, com fotografia expressionista. A Versátil já lançou quatorze caixas, com seis filmes cada uma mais extras, deste gênero fascinante. Algumas produções lançadas nesta coleção são europeias - apesar de o estilo ser basicamente norte-americano -, e quatro filmes noir europeus, três britânicos e um francês, são objeto do presente texto.

Lançado em 1947, “Sempre chove aos domingos” (“It always rain on Sundays”), de Robert Hammer, mostra uma Londres pobre, com pessoas permanentemente irritadas por falta de dinheiro e perspectivas - em muito me lembrou o clássico, amado por Morrissey, “A taste of honey”, de 1961. “Sempre chove aos domingos” é muito bem narrado, mas o excesso de personagens (a madrasta má que, apesar de casada com um marido mais velho e benevolente, ainda ama o velho namorado que é fugitivo da cadeia; suas duas enteadas, uma bem ajustada e com um namorado responsável e carinhoso, e a outra que é amante de um homem casado; o outro enteado, um garoto que só quer saber de tocar gaita de boca; três assaltantes pés-de-chinelo, que pouco têm a ver com os demais personagens; um homem que dá golpes bem sucedidos) faz com que o filme tenha algo de uma novela da Globo.

“Rincão de tormentas” (“Brighton Rock”), lançado em 1947 e com direção de John Boulting, conta a história de quatro gângsteres londrinos de segunda categoria, chamados de Dallow, Spicer, Pinkie e Cubitt - sim, estes nomes são citados no clássico “Now my heart is full”, de Morrissey. O personagem principal é Pinkie, que ordena o assassinato de um rival e tenta fazer com que o crime passe por suicídio. O filme é espetacular, e o contraste entre o rosto suave e quase feminino de Pinkie (vivido magistralmente por Richard Attenborough) e suas atitudes violentas é realmente assustador. Não à toa, a imagem que acompanha este texto mostra Pinkie em “Rincão de tormentas”.

“Rififi” (“Du rififi chez les hommes”), de 1955, dirigido por Jules Dassin, é o único filme francês citado aqui. Segundo o Wikipédia, o filme ficou famoso “pela cena do roubo na joalheria, de quase meia hora de duração sem diálogos ou música e que mostra em detalhes a ação dos bandidos, imitada posteriormente por criminosos de verdade ao redor do mundo”. Mas o filme é muito mais que isso, mostrando com maestria a preparação e as consequências do roubo. Um clássico indiscutível, que faz com que o espectador tenha vontade de assistir a mais policiais franceses - por sorte a coleção da Versátil “Filme Noir Francês” já está no quarto volume.

Finalmente, “Trágico álibi” (“My name is Julia Ross”), de Joseph H. Lewis, lançado em 1945 e com apenas 64 minutos de duração, é uma pequena obra-prima: apesar do pouco destaque na coleção da Versátil (foi lançado como um extra no DVD Filme Noir Vol. 9), é uma assustadora história de uma família londrina que tenta fazer com que uma garota passe por outra mulher.

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