literatura erótica

Três livros de teor erótico
Literatura
Três livros de teor erótico
13 de julho de 2025 at 04:15 0
Eu comprei “Porcos com asas”, de Marco Lombardo Radice e Lidia Ravera (Editora Brasiliense, 185 página, tradução de Maria Celeste M. Leite Souza, publicado originalmente em 1976), provavelmente recomendado pela Veja. O livro começa assim:
Caralho. Caralho, caralho, caralho. Buceta. Buceta peluda, quente, cheirosa. Buceta de putinha. Nada... Antes, falando estas coisas, eu gozava ou, pelo menos, me vinha vontade... Quando eu estava com meus amigos, dizia estas palavras e depois caía na gargalhada. Quando eu estava sozinha, pensava nelas, falava a meia voz e, ligeira, enfiava a mão dentro da minha calcinha, de olho na porta e de ouvidos tão atentos que eu podia ouvir até o ranger das escadas. Era o pânico total. Depois, eu bem que cortaria minha mão, mas na hora era tão bom... Era como uma felicidade molhada, explosiva, um grito abafado, e pronto!... Agora, mesmo quando estou sozinha, é como se estivesse com outras pessoas dá vontade de rir. Na verdade, não é que eu tenha vontade de rir: eu rio porque nunca estou só, mesmo quando não tem ninguém, tem sempre um cretino para me julgar. Caralho inchado, caralho duro, com a pele peluda e a cabeça pelada saindo pra fora: já peguei em sete. Isso não me abalou muito, não. Mas eles não são todos iguais: uns têm um jeitão doente, outros, um ar saudável. Uns todos enrugados, outros lisinhos. Pô, até agora, nada! Vou tirar meu pijama e deitar de barriga pra cima, como se estivesse morta... Necrotério: mesa de mármore. Cheiro forte de desinfetante. Luz fixa. Silêncio pesado: Antônia P., 16 anos, sexo feminino, jaz morta (cubro meu rosto com o lençol). Ruído de passos: um grupo de pessoas, compungidas, se aproxima, guiadas por um homem de avental branco: um tipo bonito, mas com um ar ausente de cuidador de cadáveres (francamente, um tipo que vive no meio de cadáveres deve ser muito espiritual). Atrás dele vêm por ordem: mamãe, vestida com aquele conjunto preto que ela fez no ano passado (parece cruel, mas espero que ela tenha o bom gosto de não querer se parecer comigo, pelo menos enquanto eu estiver no necrotério), palidíssima, finalmente sem nenhuma maquilagem.  Papai, ligeiramente ofegante, com um lenço branco em volta daquele pescoço bovino, parece estar à beira de um enfarte. Tia Bice, seca e antipática, não perde um detalhe (que diabo ela veio xeretar aqui, se ela nunca me aturou?). Ele, de jeans e camiseta (não queriam que Ele entrasse, mas Ele contestou, resoluto: "Ou vocês me deixam vê-la ou me mato aqui mesmo!"). Eles abrem alas e, com respeito, o observam passar. O homem de avental branco levanta o lençol. Meus cabelos se espalham suavemente sobre o mármore branco; foram lavados para que fosse removido o sangue seco e agora brilham sobre o mármore como se fossem seda dourada. Meu rosto está pálido e sereno, sem espinhas (acho que os mortos não têm espinhas). O silêncio se enche de soluços.
O livro fez um sucesso imenso quando publicado por aqui, no início dos anos 1980, que foi quando o li pela primeira vez. O livro se apresenta como o diário íntimo de dois adolescentes, Rocco e Antônia, que vivem em Roma entre 1975 e 1976, e são ligados ao Partido Comunista Italiano. A história do relacionamento dos dois, com idas e voltas, às vezes parece uma Sessão da Tarde, mas as cenas de sexo são sempre descritas de maneira explícita. E, por mais que as questões sociais pareçam datadas para o leitor de hoje, o livro serve como uma introdução ao pensamento da esquerda italiana nos anos 1970, uma época que me interessa bastante. *** Também nos anos 1980 que li pela primeira vez “O mundo pecaminoso que vivi”, de Mylène Demarst. Publicado pela Luzeiro Editora e com 143 páginas, o livro se declara como uma história real, sobre as aventuras sexuais da autora, que na verdade seria uma importante atriz francesa de cinema – e na edição consta até o nome do tradutor, um tal de Rubens F. Lucchetti. Mais do que isso, o livro seria a continuação de outra edição de memórias sexuais da autora, chamado “Confissões de uma Estrela”. Mas tudo isso, ao que tudo indica, é falso. Mylène Demarst deve ser uma autora (ou autor) brasileira, já que não há nenhuma menção deste nome no Google fora daqui – e mesmo em pesquisas brasileiras, a autora só aparece em dissertações sobre livros censurados, como “ESCREVER É SUBVERSIVO: Censura a livros eróticos e pornográficos na Ditadura Civil-Militar Brasileira.”, de Julina Belinaso[1]. O livro é razoavelmente bem escrito, as aventuras da “atriz” são meio exageradas, mas nada que comprometa muito. E o final apresenta o texto de “A iniciação de Eugênia”, uma “peça em um ato, inspirada no Marquês de Sade”. Conforme apresentado em “O mundo pecaminoso que vivi”, a peça “foi encenada no Teatro Royal, de Budapest (sic)”. Duvido que ela tenha sido encenada! Segue o trecho final do capítulo 4 do livro de Mylène Demarst:
Inopinadamente, ele atirou-se sobre nós. Primeiro atacou-me, beijando-me o púbis e a vagina, depois Christine, fazendo o mesmo. Desabotoei os botões da frente de suas calças e comecei a acariciar e excitar com beijos lúbricos o seu membro. Aos poucos ele foi endurecendo e principiei a masturbá-lo enquanto me oferecia toda aberta, para o contato manual de Carl, que beijava os seios de Christine ou sugava-os, e com as mãos trabalhava avidamente nas nádegas da moça. Assim permanecemos naqueles deliciosos contatos de mãos e bocas. É uma das coisas mais maravilhosas que se pode imaginar: assim, gozamos profundamente, muito mais do que no coito. Atravessamos vários espasmos, mas ninguém, nenhum dos três, arredava pé. O odor de sexo excitava-nos muito mais. Completamente esgotados, caímos no tapete e acordamos algumas horas mais tarde. E tudo se renovou. No auge da orgia, Carl se desprendeu de nós e foi até o telefone. Falou alguma coisa. Depois, voltou para os nossos carinhos. Daí meia hora, chegavam três rapagões de físico atlético. Carl recebeu-os alegremente. Nós estávamos completamente nus; imediatamente, eles também se despiram. Bebemos uísque puro e nos entregamos à mais depravada das uniões sexuais que pode haver. Eu sentia que estava sendo penetrada por trás por um membro enorme, enquanto tinha o membro de Carl entre meus lábios e sugava-o deliciosamente. Uma mão acariciava-me a vagina.
*** "Tudo o que você não queria saber sobre sexo", de Adão Iturrusgarai e Mirian Goldenberg (Record, 2005), “se propõe a desvendar e discutir a sexualidade de uma forma leve, mas, ao mesmo tempo, bastante informativa e provocadora”. O livro tem cartuns do autor e questionamentos da autora, e tem momentos mais e menos interessantes. Alguns cartuns são bons, como este, abaixo: *** [1] BELINASO, Juana. Escrever é subversivo: censura a livros eróticos e pornográficos na Ditadura Civil-Militar Brasileira. 2020. 120 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Arquivologia) – Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2020. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/229628. Acesso em: 23 jun. 2025.
Leia mais +
“O belo sexo dos homens”, de Florence Ehnuel
Literatura
“O belo sexo dos homens”, de Florence Ehnuel
3 de maio de 2025 at 21:14 0
"Nesse sentido, e desde que ele não exiba o sexo de modo brutal ou vulgar, todo homem guarda em si magia e mistério, uma capacidade secreta e acrobática que provoca meu respeito e toda a minha admiração. Apenas esse espetáculo já é satisfatório. Apenas essa ideia já é enfeitiçante. Apenas esse mistério já seduz. Evidentemente, se o homem é grosseiro e faz uma demonstração exibida, é ridículo. Por que ser grosseiro quando já se é grande? Por que ser exibido quando se tem a capacidade, sem gesto suplementar, de apresentar-se e de oferecer-se amplamente? Isso faz a grandeza cair no grotesco, e a oferta, numa vā demonstração. É pura e simplesmente sacrilégio. Mas quando o espetáculo é verdadeiramente apresentado sem excesso de vaidade ou pudor, então eu acredito que não haja nada mais encantador. Acredito que não haja presente mais bonito. É até mesmo o presente por excelência. Que gesto mais bonito pode me ser dirigido, e ainda por cima com modéstia, que o de apontar-me como aquela que o motiva? Essa superação do corpo do homem por si mesmo, esse transbordamento de sua carne, essa concentração manifesta de sua energia, essa circulação de seu fluido capaz de bloquear seu refluxo, assim como a retração do prepúcio, o descobrimento da glande, a inchação das veias que sulcam, em frisas, os lados, a elevação do membro, tudo isso é tão fascinante, tão exaltante que, quando assisto a isso, só sei dizer: "Que maravilha! Esplêndido! Magnífico!" - do mesmo modo que posso exclamar diante de algumas grandiosas paisagens naturais sobre as quais nada posso dizer ao contemplá-las senão que estou satisfeita, e até embasbacada. Sublime! E se, além disso, posso pensar que tenho alguma influência nisso, nesse processo de multiplicação do pão, nesse afluxo do sangue, nesse vinho que tem a genialidade de correr abundantemente e de se estocar no lugar certo, então eu me sinto profundamente honrada. Encantada em conhecê-lo. Que honra pode ser superior a essa? Que honra maior?"
(in "O belo sexo dos homens", de Florence Ehnuel (Objetiva, 112 páginas, traduzido por Véra Lucia dos Reis, publicado originalmente em 2008). Como o próprio título já entrega, o livro é uma ode ao pênis.)
Leia mais +
“A garota que só pensava naquilo” e “Minha vida na horizontal”
Literatura
“A garota que só pensava naquilo” e “Minha vida na horizontal”
2 de maio de 2025 at 21:31 0
"A garota que só pensava naquilo - confissões de uma sedutora", de Abby Lee (Prestígio Editorial, 224 páginas, tradução de Vera Whately, publicado originalmente em 2006) e "Minha vida na horizontal - aventuras sexuais de uma noite só" (Bertrand Brasil, 267 páginas, tradução de Sibele Menegazzi, publicado originalmente em 2005) têm muito em comum: foram escritos na mesma época, são autobiográficos e descrevem sem nenhum pudor a vida sexual ativa de suas autoras. Mas, enquanto Chelsea Handler é uma humorista de stand-up de sucesso, Zoe Margolis (o nome real de Abby Lee) contou que perdeu suas oportunidades de emprego na indústria cinematográfica quando sua real personalidade foi revelada, e hoje escreve como uma mortal comum no X, aparentemente sem grande sucesso.
"A garota que só pensava naquilo" foi originada de um blog que foi descontinuado em 2018, com o mesmo nome do livro. Em uma de suas últimas postagens, ela conta que finalmente estava ficando em paz com seu corpo. O livro é muito bem escrito, e suas descrições de desejo sexual são bastante explícitas. Já "Minha vida na horizontal" tem como ponto forte o humor, e ri alto em diversas passagens do livro - mas desejo sexual também é descrito de maneira bastante forte e explícita. E no final de ambos os livros as autoras chegam à conclusão que, ao invés de uma vida promíscua, elas gostariam mesmo é de um relacionamento estável.
Leia mais +
Livros lidos recentemente
História, Literatura, Religião
Livros lidos recentemente
28 de dezembro de 2024 at 18:10 0
"Nação tomada pelo medo", de Thom Yorke & Stanley Donwood (Darkside, tradução de João Paulo Cuenca, 168 páginas, publicado originalmente em 2021): a poesia de Thom Yorke, vocalista da grande banda britânica Radiohead, é claustrofóbica, estranha e de forte crítica social. Os desenhos deste lindo livro em capa dura, a cargo de Stanley Donwood, são tão impressionantes quanto. Foi bom ter tatuado o símbolo da banda no braço, ele aparece em grande parte dos desenhos de "Nação tomada pelo medo". *** "O livro dos espíritos", de Alan Kardec (FEB, tradução de Guillon Ribeiro, 367 páginas, publicado originalmente em 1857): o cemitério de Père Lachaise, em Paris, é famoso por ser o descanso final de gente muito famosa, como Oscar Wilde, Marcel Proust e Jim Morrison, vocalista da banda americana The Doors - mas o túmulo mais visitado é o do criador do espiritismo, Alan Kardec, graças aos espíritas brasileiros que vão até lá render homenagens ao fundador desta religião extremamente popular por aqui, mas basicamente esquecida no resto do mundo (obtive boa parte dessas informações num documentário da TV francesa). "O livro dos espíritos" é escrito em forma de perguntas e respostas, e é o primeiro livro que os interessados nesta religião normalmente devem ler. *** "A revolução dos bichos", de George Orwell (Companhia das Letras, tradução de Heitor Aquino Ferreira e posfácio de Christopher Hitchens, 147 páginas, publicado originalmente em 1945): eu era pré-adolescente quando li esta obra-prima pela primeira vez. Ainda tinha ilusões socialistas, e foi um choque para mim. Além disso, não sabia da relação de "A revolução dos bichos" com Stálin e Trótski. A releitura me confirmou que George Orwell sabia das coisas. *** "Maigret sai em viagem", de Georges Simenon (L&PM Pocket, tradução de Alessandro Zir, 164 páginas, publicado originalmente em 1958): neste livro o famoso Inspetor Maigret investiga um crime na alta sociedade. Simenon é sempre muito bom, mas não gostei muito da solução do crime neste romance. *** "Mistérios de Curitiba", de Dalton Trevisan (Record, 141 páginas, publicado originalmente em 1968): "A palavra do Senhor contra a cidade de Curitiba no dia de sua visitação: / Suave foi o jugo de Nabucodonosor, rei de Babilônia, diante de Curitiba escarmentada sob a pata dos anjos do Senhor como laranja azeda que não se pode comer de azeda que é. / Gemerei por Curitiba: sim, apregoarei por toda a Curitiba a nuvem que vem pelo céu, o grito dos infantes a anuncia; porque o Senhor o disse." E assim por diante. *** "O queijo e os vermes - o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela Inquisição", de Carlo Ginzburg (Companhia de Bolso, tradução de Maria Betânia Amoroso, 256 páginas, publicado originalmente em 1976): Domenico Scandella, conhecido por Menocchio, era um moleiro da região do Friuli, na Itália, e que nasceu em 1532. Ele não só sabia ler e escrever, numa época em que pessoas de sua classe social eram quase sempre analfabetas, como suas leituras o faziam ter ideias sobre a origem do mundo. Segundo Menocchio, a vida e mesmo Deus surgiram de uma massa pastosa inicial, assim como os vermes surgem - conforme a crença da época - do queijo. Sabemos da vida e das ideias de Menocchio porque ele foi longamente interrogado pela Inquisição, com tudo registrado. "O queijo e os vermes" apresenta uma história insólita, tão esquisita e fascinante quanto aquela dos benandanti, descritos em outra obra do mesmo autor, "Os andarilhos do bem", comentado aqui. *** "Da próxima vez, o fogo", de James Baldwin (Companhia das Letras, tradução de Nina Rizzi, 128 páginas, publicado originalmente em 1962): composto por dois textos, o curto "Carta a meu sobrinho em ocasião do centenário da abolição", e "Carta de uma região de minha mente", este livro é, segundo a contracapa, um "clássico incontornável no debate sobre os direitos civis nos Estados Unidos". Nesta obra extraordinária, Baldwin não só discute as raízes e as consequências do racismo norte-americano, como se mostra um tanto impiedoso contra seu próprio passado como pregador protestante. *** "Clímax", de Chuck Palahniuk (LeYa, tradução de Érico Assis, 224 páginas, publicado originalmente em 2014): C. Linus Maxwell (apelidado de ("ClíMax") é um milionário que cria artefatos eróticos para mulheres, mas não quaisquer artefatos: os produtos da sua indústria deixam as usuárias viciadas como se fossem dependentes de heroína ou fentanil - com todos os problemas graves que vêm junto com o uso desenfreado de drogas pesadas. Os romances de Chuck Palahniuk são sempre esquisitos, mas aqui ele pesou a mão na estranheza. E eu, claro, gostei, como sempre. *** "As pessoas parecem flores finalmente", de Charles Bukowski (L&PM Editores, tradução de Claudio Willer, 311 páginas, publicado originalmente em 2007): diz a lenda que o filósofo e escritor Jean-Paul Sartre chamava Bukowski de "o maior poeta da América", mas parece que isso era uma mentira inventada pelo próprio poeta. Neste, que é o primeiro livro de poesia do autor que já li, os temas são os mesmos de grande parte de sua prosa: bebedeiras, corridas de cavalos, a vida de escritor, sua mulher e sua filha. Mas aqui há uma maior objetividade, e, por que não? - um maior lirismo.
Leia mais +
“O sofá”, de Crébillon Fils, e “Les bijoux indiscrets”, de Denis Diderot
Filosofia, Literatura
“O sofá”, de Crébillon Fils, e “Les bijoux indiscrets”, de Denis Diderot
5 de janeiro de 2021 at 15:11 0
O sultão muçulmano Shah-Riar não era uma pessoa de muitas luzes, e fica impressionando quando seu Vizir, Amanzei, que era hindu, lhe diz que, devido ao seu mau comportamento, tinha sido condenado a ter sua alma vagando por diversos sofás. A descrição das aventuras de Amanzei neste estranho estado é o tema de “O sofá” (L&PM, 255 páginas, tradução de Carlota Gomes, publicado originalmente em 1742), do escritor moralista francês Crébillon Fils (1707-1777). Com a alma presa num sofá, Amanzei acaba sendo testemunha dos casos de diversas mulheres que normalmente não conseguem resistir às investidas sexuais de homens que tentam conquistá-las. Se a premissa parece interessante, as discussões morais entre as mulheres e seus conquistadores são terrivelmente chatas e confusas, epítetos que podem servir também ao livro como um todo. O filósofo Denis Diderot (1713-1784) era ainda relativamente jovem quando, a partir de uma aposta, tentou demonstrar a uma amante – a quem ajudou com a renda devida ao livro – que seria fácil fazer um livro como “O sofá”, colocando ainda nele temas mais sérios, de caráter filosófico.  O resultado desta aposta é o romance “Les bijoux indiscrets”, lançado originalmente em 1748 (eu li na versão em francês obtida na Amazon, e há uma versão em português chamada “As jóias indiscretas”, lançada pela Global em 1986 e traduzida por Eduardo Brandão). No caso de “Os bijoux indiscrets”, o sultão congolês Mangogul pede ao gênio Cucufa, que já tinha ajudado seus antepassados, que fizesse algo que o divertisse. Ele recebe dele então um anel que, apontado para uma mulher, fizesse com que seu sexo (a “jóia” do título) contasse o que a sua dona andava aprontando. Mais tarde Diderot acabou se arrependendo de ter escrito este romance libertino que, mesmo assim, consta da maioria das edições de suas melhores obras compiladas. Realmente, o livro é divertido e tem discussões filosóficas fora da licenciosidade – e é muito melhor que “O sofá”.
Leia mais +
Literatura
“Zonas húmidas”, de Charlotte Roche
13 de setembro de 2020 at 16:26 0
Charlotte Roche - Wikipédia

O título do presente texto é “Zonas húmidas”, e não isto é um erro de digitação. A edição que li deste romance da alemã Charlotte Roche é de Portugal (CADERNO, 222 páginas, tradução de João Bouza da Costa), e lá “úmido” se escreve com “h” mesmo. Como o livro é permeado de gírias, é ao mesmo tempo engraçado e angustiante para um brasileiro ler vários termos um tanto difíceis de compreender. 

Publicado originalmente em 2008, o livro - muito bem escrito, aliás - conta a história de Helen, uma adolescente que está no hospital por causa de uma crise de hemorróidas. Enquanto está lá, sofrendo com dores, ela descreve e analisa seu dia-a-dia no hospital e comenta sua vida até então.

Helen é obcecada por secreções corporais e por sexo, e critica a “mania de higiene” de outras mulheres - ela mesma não se preocupa, nem um pouco, com limpeza corporal. 

Segundo o site da Amazon, “os jornais relataram desmaios de ouvintes em leituras públicas” de “Zonas húmidas” - e até dá para entender um pouco isso, já que frequentemente o livro é nojento mesmo.

Mas o maior impacto do romance nem está na escatologia, mas na história da própria Helen - e é esse aspecto, que não posso contar para não estragar a surpresa, uma das coisas que fazem de “Zonas húmidas” um ótimo romance.

Leia mais +
Literatura
Catherine Millet, Jacques Henric
6 de outubro de 2019 at 15:57 0
fonte: YouTube

Como se sabe, Catherine Millet é uma respeitada crítica de arte que causou furor, em 2001, ao lançar o para lá de polêmico livro autobiográfico A vida sexual de Catherine M., sobre o qual comentei que ela falava de sua vida de verdadeira libertina (participando de orgias, relacionamentos longos e curtos) como uma crítica de arte. Aproveitando o grande sucesso do livro, o seu companheiro Jacques Henric lançou, ainda em 2001, “Légendes de Catherine M.” (Denoël, 250 páginas) e a própria Catherine lançou em 2008 “A outra vida de Catherine M.” (Agir, 200 páginas, tradução de Hortencia Santos Lencastre).

Os dois livros são interligados: o livro de Catherine conta as crises de ciúme que ela teve de Jacques em uma certa época da vida – ciúmes um tanto incoerentes, como ela mesma não cansa de repetir, tendo em vista sua própria vida sexual livre. Já o livro de Jacques Henric mostra uma série de fotos da sua companheira nua – você pode ver algumas delas abaixo – e um longo texto em que o autor fala de sua atração por ela, pelas mulheres em geral, sobre as fotos postadas, com um enorme número de citações literárias e, um tanto paradoxalmente, religiosas – sempre com grande conhecimento de causa, aliás.

Dois livros fascinantes de um casal fascinante.

fotos obtidas em "Légendes de Catherine M.", de Jacques Henric (Denoel)
Leia mais +
Literatura
Valérie Tasso
15 de setembro de 2019 at 17:06 0
fonte: El Mundo

Valérie Tasso é uma escritora, sexóloga e pesquisadora francesa radicada em Barcelona, na Espanha – onde é presença frequente em debates televisivos, falando sobre sua especialidade, o sexo. Li recentemente três livros dela.

“Diário de uma ninfomaníaca” (Essência, 262 páginas) foi seu livro de estreia, publicado originalmente em 2003, e é de caráter autobiográfico. O início da obra conta o tempo em que a autora trabalhava como publicitária em Barcelona, de onde saía para diversas viagens, nas quais se encontrava com vários homens diferentes para fazer sexo. Lá pelas tantas, ela se apaixonada por um “homem errado”, que a engana e acaba a levando à falência. Sem emprego e sem dinheiro, Valérie começa a trabalhar como prostituta para tentar se reerguer.

O livro é francamente ruim, escrito com mão pesada, sem nenhuma sutileza. O leitor não consegue ter muita empatia para com a narradora, o que dificulta muito a leitura num livro com tal temática.

Por sorte eu – que sigo a Valérie Tasso no Twitter e simpatizo com suas postagens – acabei insistindo com a autora e acabei tentando a leitura de “Confesiones sin vergüenza: Las mujeres españolas nos cuentan sus fantasías sexuales” (Grijalbo, 150 páginas), publicado originalmente em 2015. A partir de uma turnê na qual a autora fez palestras e reuniões por toda a Espanha falando sobre sexo, o livro reproduz fantasias sexuais escritas por mulheres participantes de tal turnê. As fantasias apresentadas no livro são de mulheres de todas as idades e estados civis, e o resultado é interessantíssimo.

Muito bom também é “El otro lado del sexo” (Plaza & Janés, 248 páginas, 2006), publicado originalmente em 2006. O livro descreve as pesquisas de Valérie Tasso sobre grupos ou pessoas que têm a originalidade (ou estranheza?) como característica principal. Entre eles, umas tais “Tigresas Brancas”, que passam a vida praticando a felação, elevando esta atividade em arte sagrada; abstinentes sexuais; um médico que diz aumentar o prazer feminino injetando colágeno no ponto G; sadomasoquistas.

Ao contrário de o “Diário de uma ninfomaníaca”, os outros dois livros comentados aqui são de leitura bastante leve e agradável.

Leia mais +