Rápidos comentários sobre livros lidos – 9
Literatura

Rápidos comentários sobre livros lidos – 9

5 de novembro de 2015 0

Febre de bola (Editora Rocco) é o primeiro livro de Nick Hornby, e é uma leitura deliciosa. Ele conta a paixão do autor pelo Arsenal, equipe de futebol londrina. O titulo de cada capítulo é a data e as equipes participantes de uma dada partida. Nick Hornby se concentra principalmente na relação daquele jogo  com algum acontecimento, de caráter pessoal ou não. Assim, ele faz comentários sobre os trágicos acontecimentos dos estádios de Heysel (quando dezenas de torcedores italianos foram mortos espezinhados por hooligans ingleses, na Bélgica, em 1985) e de Hillsborough (quando 96 torcedores ingleses foram mortos esmagados, em 1996), a vitória brasileira na Copa de 1970 ou o racismo nos estádios ingleses. Mas o que torna o livro especialmente saboroso são os comentários de Hornby sobre sua vida pessoal: os temas principais são o seu próprio fanatismo desvairado, qual o papel do futebol na relação com as pessoas próximas (o meio-irmão, o melhor amigo, o pai, a namorada), como foi a carreira de Nick Hornby como torcedor de outra equipe, o Cambridge United (que passou por várias divisões na Liga Inglesa, sempre abaixo da primeira).


Como o livro anterior, A vida sexual de Catherine M., de Catherine Millet (Ediouro), também conta um aspecto da vida da autora: neste caso, sua movimentadíssima vida sexual. A autora é uma crítica francesa de arte de grande importância (é editora da revista Art Press) e, neste livro, descreve com grande detalhe suas orgias sexuais, seus relacionamentos rápidos e seus relacionamentos longos. Em muitas passagens do livro – como quando ela faz uma relação entre o espaço e o sexo – Catherine Millet fala de sexo como… uma crítica de arte. De todo o modo, a sensação final após o término do livro acaba sendo de fastio: tanto sexo assim pode ser bom, mas a maneira de a autora vivê-lo parece um tanto fria.


Também é autobigráfico, do húngaro Imre Kértesz (Editorial Presença), Prêmio Nobel de 2002. Segundo meu amigo Jonas Lopes o livro, um longo monólogo interior, é bastante inspirado nas obras do austríaco Thomas Bernhard (autor que, confesso, nunca li). De fato, o estilo do livro é a primeira coisa que chama a atenção: o monólogo de Kaddish para uma Criança que não Vai Nascer (kaddish é a oração judaica pelos mortos) é intenso e repetitivo (seria uma afronta chamá-lo de confuso?). De todo modo, é o que ele quer dizer é o que realmente conta (e são muitas as passagens memoráveis do livro). O personagem principal, em primeira pessoa, fala da vida, da obsessão pelo trabalho, da relação com a sua moradia, da obsessão por sua mulher (de quem acaba se separando), da educação opressiva que recebeu. O tema mais forte – e que dá título ao livro – é a sua recusa em ter filhos. Como judeu sobrevivente de Auschwitz, ele conclui não há mais vida possível depois de um sofrimento tão atroz . Será que sou um otimista incorrigível ou o fato de a mulher do personagem principal aparecer no final do livro com dois filhos de outro pai não seria um sinalzinho de esperança da parte de Imre Kértesz?

(publicado no blog do Mondo Bacana em 2010)

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