Música

Bones: “SoftwareUpdate2.0”
Música
Bones: “SoftwareUpdate2.0”
2 de fevereiro de 2025 at 17:05 0
Já nos primeiros acordes de “TwentyThirteen” percebemos que, dezenas de álbuns depois de seu início em 2010 ainda como Th@ Kid, Bones continua relevante. A faixa, que começa imodesta e absolutamente verdadeira (“tenho estado na estrada desde 2013 / eles têm me chamado de o Melhor de Todos os Tempos (G.O.A.T.) desde 2013”) gruda na cabeça como só as melhores do rapper, e não se pode dizer que, necessariamente, seja a melhor do álbum “SoftwareUpdate2.0”, lançada no meio de dezembro último (“SoftwareUpdate1.0” tinha sido lançado em 2016, com o destaque “SleepMode”). O álbum ainda não tem nenhum clipe, mas é possível que seja lançado algum nos próximos meses: o terceiro vídeo do ótimo disco anterior, “CADAVER” (de outubro de 2024), chamado “MPEG-4”, foi lançado já em 2025 - depois de “SoftwareUpdate2.0”, portanto. “AccesDenied” é uma faixa típica de Bones, que continua fazendo faixas parecidas e sempre interessantes. “ElmoAndTheAmazingTechnicolorDreamcoat” é uma de suas lindas baladas, na qual ele se queixa de não pode fazer a chuva parar. “CCTV” é hipnotizante, e “CPU” cria um clima perfeito para uma letra que comenta que “você não pode cair se estiver no modo SESH” (entre outros significados, “sesh” pode ser uma sessão fazendo alguma atividade agradável, e é um termo que é uma espécie de marca de Bones e sua turma). “DropTopFilledWithRain” é daquelas músicas em que o rapper mostra seu lado afetivo, não só nos vocais e na melodia, como também na letra: “pensando em você, só espero que não mude comigo / não duvidaria, se você colocasse a culpa em mim”. “ColdConversationsOnBurnerPhones” tem uma levada vaporwave, na qual ele diz que rappers estão sempre caindo, mas “SESH nunca vai desconectar”. Sorte nossa. (se você quiser receber meus textos semanalmente, clique aqui e cadastre seu e-mail)
Leia mais +
Mgła
Música
Mgła
27 de outubro de 2024 at 11:41 0
A culpa é de um cantor de black metal eslovaco chamado "cikindeles", cujo endereço no Instagram está aqui. Em seus Reels, ele cria historinhas hilárias, frequentemente com maquiagem de corpse paint (a pintura típica do estilo), junto com sua filha de uns oito anos de idade. Vendo o cantor com aquela máscara assustadora brincando de balé com a filhinha, por exemplo, é das coisas mais engraçadas da internet. Não à toa ele está, no momento (segunda metade de 2024) com 437 mil seguidores. Enfim, não só virei fã da conta do cantor, como as músicas de black metal que ele coloca como fundo para seus vídeos me deram uma saudade enorme deste tipo de som, que meio que parei de ouvir no começo dos anos 2010 - arredondando, uns quinze anos atrás. Quem me conheceu na época soube da minha obsessão pelo estilo. Bem, além de voltar a ouvir Burzum, Velvet Cacoon e Drudkh (minhas bandas preferidas de black metal), resolvi procurar saber por cima o que de importante aconteceu no gênero nos últimos anos. Acabei caindo num canal do YouTube informativo e divertido de um alemão cujo pseudônimo é Farvann  (segundo a Encyclopaedia Metallum, a Wikipédia do metal, seu nome real é Frank Busch), que é também o único membro de uma banda chamada Dubartuluk. Em um vídeo chamado "The best BLACK METAL Bands of all time (according to YOU guys)", Farvann apresenta as melhores bandas de black metal segundo os inscritos na página. As escolhidas pelo público englobaram bandas que são figurinhas carimbadas neste tipo de lista, todas criadas entre o final dos anos 1980 e o início dos anos 1990 (como Mayhem, Burzum, Darkthrone e Ulver), com uma única exceção: a banda polonesa Mgła, formada no ano 2000, e da qual eu nunca tinha ouvido falar - para minha defesa, seu primeiro álbum completo é de 2008, e seu disco mais conhecido e considerado sua obra-prima, "Exercises in futility", é de 2015. Aquilo me deixou curioso. Fiz a procura "best black metal bands" no Google e a foto do Mgła aparece em nono na sequência, sendo a primeira criada depois do início dos anos 1990 - as primeiras oito, claro, são as conhecidas do "grande público": Mayhem, Darkthrone, Bathory, Emperor, Burzum, Dissection, Immortal e Gorgoroth. Esta curta pesquisa me fez perceber que o Mgła agrada a ouvidos de fãs do black metal tradicional. Enfim, baixei a playlist "This is Mgła", do Spotify, e confesso que não estava preparado para o que ouvi - assim como não estava preparado para a maravilhosa playlist "This is The Brian Jonestown Massacre", conforme comentei aqui. O Mgła é uma banda de black metal de energia incomum. O vocal grave e poderoso, as guitarras rápidas e violentas, a velocidade absurda do baterista e as impressionantes melodias formam um conjunto espetacular, que, assim como o Brian Jonestown Massacre citado acima (que é de um estilo completamente distinto), simplesmente não dá vontade de parar de ouvir. As letras são poéticas e desesperançadas. O nome da banda se pronuncia aproximadamente como "mm-guá" (ver aqui), e significa "névoa" em polonês. A banda é formada por dois membros, M. (pseudônimo de Mikołaj Żentara) no vocal, guitarras e baixo, e Darkside (pseudônimo de Maciej Kowalski) na bateria. Das apresentações ao vivo dois outros músicos participam, The Fall (pseudônimo de Michał Stępień) e E.V.T. (pseudônimo de Piotr Dziemski). Todas estas informações obtive no Encyclopaedia Metallum. Ao vivo, todos os quatro integrantes cobrem o rosto com um pano preto - não sei quanta transparência ele tem -, vestem um moletom da mesma cor, deixando o capuz sobre a cabeça e, em cima de tudo isso, uma jaqueta preta de couro. O visual impressiona. Normalmente não gosto muito vídeos de apresentações de rock ao vivo, mas as do Mgła são espetaculares (recomendo esta aqui, de um concerto na Lituânia em 2017, por exemplo). São muitos os vídeos com reacts positivos das músicas da banda, e posso citar: este aqui, do canal The Adventures of TNT, apresenta uma bela descrição do "ambiente" criado pelo black metal (e o dono do canal é negro, só para reforçar como é imbecil quem defende que "white metal is for black people"); neste aqui, do canal The Wolf HunterZ, sobre uma gravação de uma apresentação ao vivo com a câmera mostrando apenas o baterista da banda, o rapaz do casal que apresenta o canal defende que aquele músico não deve ser humano, mas um robô ou alien; o casal de cristãos do canal VinAnd Sori apresenta vários vídeos discutindo as letras profundas da banda; finalmente, o canal de Alex Hefner tem dois vídeos (aqui e aqui) em que ele demonstra a alegria de ter tomado conhecimento do som do Mgła - alegria que eu também sinto.
Leia mais +
“Johann Sebastian Bach”, com Víkingur Ólafsson
Música
“Johann Sebastian Bach”, com Víkingur Ólafsson
8 de setembro de 2024 at 19:21 0
O nome da coleção era "Os clássicos mais populares do mundo", e era composta por doze LPs com gatinhos nas capas. Como o próprio nome dizia, as músicas apresentadas eram aquelas que a maioria das pessoas reconhece como "música clássica". O início da Quinta Sinfonia de Beethoven. Um trecho de "O Lago dos Cisnes", de Tchaikovski. Algumas coisas de Chopin. Quem comprou a coleção lá em casa não sei, até hoje, quem foi - imagino que tenha sido a minha mãe. Sei que não lembro de nenhum dia da minha infância sem aqueles doze (ou seriam dez?) discos por perto. "Os clássicos mais populares do mundo" foi provavelmente a maior contribuição para o meu gosto musical, desde que nasci até hoje. Eu ouvia aqueles discos diariamente e, com o tempo, fui percebendo que, fora uma ou outra coisa - tenho que citar a ária "Ombra mai fu", da ópera Xerxes, de Händel, uma das músicas mais bonitas que já ouvi -, eu gostava mesmo era de Johann Sebastian Bach. A Ária na Corda Sol. A Tocata e Fuga em Ré Menor. Alguns trechos dos Concertos de Brandemburgo. Algumas árias de cantatas. Este meu interesse por Bach acabou ficando tão intenso que acabei começando a comprar discos do compositor. Os concertos de Brandemburgo e peças para órgão, em dois maravilhosos exemplares da coleção "Mestres da Música", da Editora Abril (que descreviam com grande minúcia a vida e a obra de Bach nos fascículos que acompanhavam os LPs). Os discos de João Carlos Martins, com peças completas de Partitas, Suítes Francesas, Inglesas, e por aí vai. A Arte da Fuga executada no cravo. Uma série de cantatas. Com o tempo, a obra de Bach, que me impressionava pela beleza arrebatadora de peças como a Ária na Corda Sol, passou a ser para mim uma espécie de monolito respeitável, belíssimo e imponente. Eu me desfiz da minha coleção de LPs há muitos anos já, mas acho que tinha mais de duzentos discos do compositor. Uns poucos anos atrás, depois de ver um anúncio no Instagram, resolvi baixar um disco simplesmente chamado "Johann Sebastian Bach", com peças diversas de um pianista islandês chamado Víkingur Ólafsson. O álbum me impressionou tanto pela execução simplesmente inacreditável - suave e expressiva na medida certa - do instrumentista, como pela escolha das peças. O disco é uma compilação com as músicas mais bonitas para teclado de Bach - e mesmo algumas transcrições de peças que não eram originalmente para o instrumento, como a inacreditável  "Nun komm der Heiden Heiland", do Prelúdio Coral para Órgão BWV 659, transcrito por Ferruccio Busoni. Ouvindo esse disco me senti criança, maravilhado de novo com a capacidade melódica e expressiva de Johann Sebastian Bach.
Leia mais +
Quem é vivo sempre aparece: 3.Modern Jazz Quartet
Música
Quem é vivo sempre aparece: 3.Modern Jazz Quartet
1 de julho de 2024 at 15:38 0
Lá em casa só tínhamos discos de MPB e alguma pouca coisa de música clássica - cuja coleção eu aumentei desde cedo, com minha paixão prematura por Bach. Havia bastante preconceito lá em casa - coisa da época - contra música americana, e eu mesmo fiquei chocado comigo mesmo quando percebi um interesse incomum numa nova série de fascículos-com-LP chamada "Gigantes do Jazz", da Editora Abril, com Louis Armostrong no primeiro item da coleção. A série, pelo que dava para perceber pelo nome dos escritores dos textos, era francesa - é fato sabido que veio da França a seriedade com que o jazz é tratado hoje. Os textos do fascículos eram autorais, "sem papas na língua". Por exemplo, nos exemplares sempre havia um box que tratava de um assunto correlato: num, uma entrevista em que o jornalista detonava o Ray Charles, que ficou furioso com ele; em outro, o jornalista defende por que Oscar Peterson não era lá essas coisas - e, até onde eu sei, não teve nenhum fascículo de Gigantes do Jazz com este pianista. Fui comprando os exemplares e logo percebi que não gostava tanto assim de jazz: achava interessante, mas de maneira geral só gostava de uma ou outra faixa. E acabei parando de comprar a coleção aí pelo número 10. Mas lá em casa também tinha a Enciclopédia Abril, provavelmente a maior influência na minha vida em termos culturais. No (longo) verbete desta enciclopédia sobre jazz, citavam um tal de Modern Jazz Quartet, que tinha influências de Bach. Opa! Aí sim! Quando o exemplar sobre John Lewis - o líder do grupo - apareceu nas bancas, comprei-o e amei o que ouvi. Os músicos sempre se vestiam a rigor e, além de Lewis e de Milt Jackson, comentado abaixo, o grupo ainda contava com Percy Heath - e depois Connie Kay, a partir de 1955 - no contrabaixo e Kenny Clarke na bateria. E, realmente, o Modern Jazz Quartet tinha nítidas influências do grande compositor Johann Sebastian Bach, e era jazz na sua melhor forma ao mesmo tempo. Só que tinha uma coisa esquisita: apesar de ser o compositor da maioria das músicas e ser o líder do grupo, o que se ouvia nas faixas, em maior destaque, era o vibrafone (um xilofone maior e mais sofisticado) de Milt Jackson. De fato, no box do exemplar de John Lewis do Gigantes do Jazz, o texto era sobre a força expressiva do vibrafonista. A verdade é que o segredo do grupo é a tensão entre o piano extremamente discreto de John Lewis e o vibrafone exuberante de Milt Jackson. Esta tensão devia ser grande mesmo: segundo a Wikipédia em português,
"Em 1974, Jackson deixa o grupo, por razões financeiras, considerando que tocavam por pouco dinheiro, e por necessitar de mais liberdade musical. A sua saída leva ao fim do grupo. Em 1981, juntam-se de novo para tocar em festivais e, mais tarde, tocam regularmente durante um período de seis meses por ano. O seu último trabalho foi em 1993."
De lá para cá - a coleção Gigantes do Jazz começou a ser publicada em 1980, quando eu tinha doze anos - tive fases de ouvir muito jazz, e meus músicos preferidos - além do Modern Jazz Quartet - são John Coltrane, Chet Baker, Billie Holiday, Miles Davis e Charlie Parker. A série "Quem é vivo sempre aparece" é sobre sons retomados depois de muito tempo com músicos que eu nunca tinha citado no blog, e neste texto homenageio esta grande banda de jazz. E, se você nunca ouviu a banda, recomendo fortemente a faixa "Blues in C minor", composta por Milt Jackson: quem sabe você curta - eu mesmo acho que é uma das melhores músicas já feitas. (foto que acompanha o texto obtida na Wikipedia em inglês)
Leia mais +
The Brian Jonestown Massacre
Música
The Brian Jonestown Massacre
26 de maio de 2024 at 14:12 0
Acompanho a carreira do jornalista André Barcinski há muito tempo. Comprei a primeira edição do seu clássico livro-reportagem "Barulho", lia sempre seus textos na Bizz, já li mais de um texto seu na Folha de São Paulo, costumo ouvir os podcasts em que ele participa, o B3+1 (com Benjamin Back, João Marcelo Bôscoli e Ice Blue) e o ABFP (com André Forastieri e Paulo César Martin), pretendo comprar a sua biografia sobre Nelson Ned. Em termos musicais, não sei se nossos gostos se afinam tanto. Seus textos me apresentaram o Black Sabbath com Ozzy Osbourne e ele sempre fala bem dos Ramones, duas bandas que gosto muito. Mas, em geral, ou pelo fato de eu ouvir mais outros gêneros que rock ou por simples questão de gosto, raramente me impressiono com algum som que ele indica. De todo modo, dia desses, no ABFP, ele citou as duas bandas que mais ouviu na vida: os Ramones, supracitados, e The Brian Jonestown Massacre, sobre a qual ele sempre fala. Desta segunda eu já tinha ouvido algumas músicas que ele colocou para tocar no podcast, tinha gostado, mas não a ponto de ouvir de novo. Quando ele disse no episódio que era uma das duas bandas preferidas da vida dele, pensei que não custava dar uma chance. Como sempre faço quando vou conhecer uma banda nova, coloquei a playlist do Spotify - neste caso, "This is The Brian Jonestown Massacre" - para tocar. Eu não estava preparado. Que coisa linda. As músicas são todas meio na mesma levada, não são baladas, mas também não são muito pesadas. Algumas me lembraram muito Velvet Underground, outras Echo and The Bunnymen, outras, sei lá, alguma coisa psicodélica. Não sei bem. Não sou bom para descrever músicas. Mas o fato é que viciei de maneira irreversível - isto é, até eu me encher o saco, parar de ouvir, e voltar a escutar desesperadamente anos depois, como sempre faço - e estou escrevendo este texto para agradecer ao André Barcinski pela dica inestimável. (foto que acompanha o texto obtida na Wikipédia)
Leia mais +
Quem é vivo sempre aparece: 2.“In Washington D.C. 1956 Volume Four”, de Lester Young
Música
Quem é vivo sempre aparece: 2.“In Washington D.C. 1956 Volume Four”, de Lester Young
17 de março de 2024 at 17:44 0
Grande parte das pessoas, depois de uma certa idade, continua a ouvir apenas as músicas e/ou músicos que gostava na juventude. Já ouvi um podcaster famoso contando que continuava ouvindo sons do passado porque eles lhe lembravam de sua juventude - e acho que é assim com muita gente. Comigo, ao contrário, praticamente nunca é assim. Se volto a ouvir algo que eu gostava quando era mais jovem, julgo este som como se eu o estivesse ouvindo pela primeira vez: se continuo achando bom, ótimo; se mudei de ideia e não acho mais, lamento. Como raras exceções a este comportamento não-saudosista, lembro de um momento, alguns poucos anos atrás, em que ouvi “Standing on a Beach”, da banda inglesa The Cure, e ter me sentido de novo no Cursinho, na Rua Vicente Machado, aqui em Curitiba, onde estudei em 1986. O texto de hoje desta série “Quem é vivo sempre aparece”, onde comento músicas que não ouvia há muito tempo e que voltei a escutar e gostar, é sobre o disco “In Washington D.C. 1956 Volume Four”, do saxofonista americano Lester Young (1909-1959), que tenho ouvido bastante nos últimos tempos - mas não sei se é por causa de saudosismo ou não. Por muito tempo tentei gostar de jazz, mas isto é assunto para o episódio desta série que tratará de Modern Jazz Quartet. De todo modo, um dos discos que comprei no estilo, na adolescência, foi este “In Washington D.C. 1956 Volume Four”, e nunca vou ter ideia de quantas dezenas – ou centenas – de vezes ouvi o LP. Eu só sabia que, se colocasse o disco na vitrola, eu não pensaria em trocá-lo tão cedo. E lamentava que só tinha conseguido o Vol. 4 da série. Já casado comprei alguns CDs de Lester Young, mas eram sempre versões de “melhores músicas da carreira” que tinham coisas de orquestra, coisas com vocal, e quase nada que se aproximasse da sensação de prazer que “In Washington D.C. 1956 Volume Four” me dava. Até que, com o advento do Spotify, resolvi um belo dia ouvir os três primeiros volumes da série do grande saxofonista, precursor do bebop, tocando na capital dos Estados Unidos (eu não tinha ideia de quantos discos havia na série, mas eram só quatro mesmo). E aí veio a decepção. Os volumes 1 a 3 estão, obviamente, longe de ser ruins. Mas não me passavam a emoção que “In Washington D.C. 1956 Volume Four” me passa, até hoje. Saudosismo? Quem sabe.
Leia mais +
Quem é vivo sempre aparece: 1. Hüsker Dü
Música
Quem é vivo sempre aparece: 1. Hüsker Dü
3 de março de 2024 at 15:35 0
Vendo aqui a relação das coisas que tenho ouvido ultimamente, além dos preferidos de sempre da casa (a pianista Hélène Grimaud, Bones, Elvis Presley, Arctic Monkeys, Bach), percebi que boa parte são músicas que eu já tinha deixado de lado há anos, às vezes décadas, e sobre as quais nunca comentei aqui. Pensei então em criar uma nova série no site sobre estes sons retomados depois de muito tempo, nos moldes daquela sobre os livros que minha mãe amava. Só que o título da série não vinha nunca. “Das profundezas da memória”? “Inéditos no site”? “Deixados de lado, mas nunca esquecidos”? Todos eles me pareceram meio pedantes, meio autoindulgentes. “Quem é vivo sempre aparece”, por outro lado, apesar de ser falso em muitos casos (Lester Young, por exemplo, o próximo da lista, já é falecido), é engraçadinho, com o tipo de humor infame que me agrada sobremaneira. O primeiro da lista desta nova série, a banda americana Hüsker Dü, é um dos mais difíceis de comentar, por um motivo que logo conto. A banda existiu entre 1979 e 1987 e era do estado americano do Minnesota. Segundo o AllMusic, o grupo foi um “trio punk influente de Minneapolis que conciliava habilmente a introspecção barulhenta de Bob Mold com o romantismo pop mordaz de Grant Hart”. Como muita coisa nos anos 1980, comprei os dois álbuns da banda lançados por aqui (“Candy Apple Grey” e “Warehouse: Songs and Stories”, duplo) por influência da revista Bizz, e várias coisas me chamaram a atenção neles. Praticamente todas as músicas eram assinadas e interpretadas ou pelo baterista Grant Hart (falecido em 2017) ou pelo guitarrista Bob Mould - já o baixista Greg Norton, que postava um bigode completamente fora de moda para a época, nem compunha nem cantava. As capas eram lindas e coloridas (é só ver a imagem que acompanha este texto, de “Warehouse: Songs and Stories”, obtida no site da Amazon), e mesmo a foto da banda no encarte, com colunas e flores, era bem diferente do visual do rock da época. Mas o que sempre mais me marcou na banda, e que torna este texto meio difícil de escrever, era sua irregularidade - pelo menos para meus ouvidos: ou as músicas eram absolutamente irritantes, gritadas e apenas barulhentas, ou conseguiam fazer uma síntese maravilhosa entre belíssimas melodias e um punk/hardcore pesado. Ouvindo a banda hoje, infelizmente as músicas irritantes continuam irritantes. A categoria de músicas perfeitas, por outro lado - da qual fazem parte, por exemplo, “Eiffel Tower High” ou “Ice Cold Ice” - me emocionava nos anos 1980, e me emociona igualmente em 2024.  
Leia mais +
Visitas ao passado
História, Música
Visitas ao passado
29 de outubro de 2023 at 14:37 0
Acho que a maioria das pessoas que gosta de História já se imaginou voltando no tempo e vivendo, por pouco tempo que seja, na sua época preferida do passado. Sim, já imaginei como seria visitar Roma no tempo de Nero, a Itália no ápice do período etrusco (século VI a.C.), o Peru no auge do império pré-Inca Wari (século VIII d.C.), ou o Brasil no tempo do Segundo Império. Seria fascinante visitar Pikillacta, monumental cidade wari que nem se sabe direito para que servia. Ver as construções etruscas no seu auge, que foram em grande parte destruídas porque eram construídas em madeira – o que restou delas foram os túmulos, em parte subterrâneos e em concreto. Quem já viu fotos de Pompeia tem ideia de como deviam ser monumentais as construções romanas do período clássico. O que restou do Segundo Império, infelizmente, está mal preservado em grande parte. Mas é claro que estas épocas podem ser perigosas: não se sabe direito como os wari viviam, os etruscos pareciam gostar de se divertir, mas vai saber, no Segundo Império a escravidão comia solta e os tempos de Nero eram tempos de Nero, não precisa ir muito longe. Acho que o período que mais me daria grande prazer na visita, por um motivo específico, seria o início do século XX no sul dos Estados Unidos. Sim, eu gostaria de ver os grandes bluesmen daquela época ao vivo. Já comentei aqui sobre a minha fascinação com o country blues, ou blues rural. As gravações daquela época normalmente têm uma péssima qualidade para os padrões de hoje, e os grandes músicos têm pouquíssimas fotos, sempre de baixa qualidade – estávamos no início do século XX, não custa reforçar. Então eu fico imaginando como seria ver Robert Johnson tocando ao vivo. Como ele fazia aquelas coisas inacreditáveis com o violão? Será que Blind Willie Johnson era tão arrogante como suas gravações maravilhosas deixam transparecer? Será que Blind Boy Fuller era mesmo muito debochado? E Blind Willie Johnson era tão religioso e sofrido quando parecia? E como seria ver a grande Bessie Smith num teatro de luxo em meados dos anos 1920? Como era o jeitão de Blind Blake? Nunca vou saber, mas não custa imaginar. (foto que acompanha o texto: Bessie Smith, obtida na Wikipédia)
Leia mais +