fevereiro 2023

“Viagem ao fim da noite”, de Louis-Ferdinand Céline
Literatura
“Viagem ao fim da noite”, de Louis-Ferdinand Céline
12 de fevereiro de 2023 at 15:41 0
Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) é considerado por muitos um dos dois grandes escritores franceses do século XX, ao lado de Marcel Proust. Ele já tinha publicado com sucesso duas obras-primas, “Viagem ao fim da noite” (1932) e “Morte a crédito” (1936), quando, nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, lançou três panfletos antissemitas que terminaram causando sua prisão de dois anos na Dinamarca em 1945, depois do final da guerra, e que fizeram com que seus últimos anos, já na França a partir de 1951, fossem vividos quase no obscurecimento - ele também era médico, e aparentemente tinha pouquíssimos pacientes àquela altura.  A relação entre a qualidade de seus livros e a personalidade desprezível do seu autor é sempre problemática. Lembro de um trecho de um livro do escritor judeu Philip Roth, em que um personagem, um professor de literatura também judeu, ensinava Céline nas suas aulas porque o autor era um gênio, mesmo não prestando como pessoa. Stéphane Zagdanski é um estudioso judeu de Louis-Ferdinand Céline e que descreve o antissemitismo do autor neste vídeo, onde ele diz - entre muitas outras coisas - que pode amar as obras do escritor francês apesar de sua própria origem judaica. Grande conhecedor de literatura, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy comenta neste vídeo que “Céline escreveu três obras-primas mas, quanto ao resto, é uma vergonha”.  Meio por curiosidade, meio pelo meu amor à literatura, resolvi encarar a leitura de “Viagem ao fim da noite” (Companhia das Letras, 659 páginas, tradução Rosa Freire d’Aguiar), mesmo sabendo de tudo isso.  O livro é contado em primeira pessoa pelo personagem principal, o francês Ferdinand Bardamu. Ele luta na Primeira Guerra Mundial e faz de tudo para desertar. Depois tenta a sorte na África, mas as condições que ele encontra são dificílimas; desiste de lá e acaba se arriscando nos Estados Unidos. Naquele país as coisas não melhoram muito e Bardamu volta para a França, onde se forma em medicina. A vida como médico não representa uma grande melhora em suas condições de vida: ele se envolve em vários tipos de problemas, até policiais, e ganha pouco dinheiro por não ser bom em cobrar de seus pacientes. Eu entendo o choque cultural que foi a publicação de “Viagem ao fim da noite”: seu estilo tem grande influência da oralidade, é ágil e cheio de gírias (tentei ler “Morte a crédito” em francês muitos anos atrás, mas desisti pela dificuldade de compreensão de muitos termos de origem popular utilizados pelo autor). E acabei conseguindo entender a influência de Céline no já citado Philip Roth, devido à crueza e agilidade do estilo de ambos. Mas, confesso, o niilismo quase absoluto de Louis-Ferdinand Céline - parece que nada na vida tem valor para ele - acabou tornando a leitura de "Viagem ao fim da noite" pesada para mim.  Pelo menos o livro não tem uma linha contra os judeus. (foto que acompanha o texto obtida na Wikipédia)
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