Uma fonte canta. As nuvens estão, / Suaves e brancas, na claridade do azul. / Pensativos, silenciosos, homens e mulheres / Atravessam, através da noite, o velho parque. // O mármore dos avôs ficou grisalho. / Um voo de migradores foge para os lugares longínquos. / Um fauno observa, através de seus olhos mortos / As sombras deslizando pelas trevas. // As folhas tombam, vermelhas da velha árvore, / Entram rodopiando pela janela aberta. / O reflexo de uma chama estoura na peça, / Pintada de pesadelos perturbadores. // Um estrangeiro branco entra na residência. / Um cachorro salta pelos corredores antigos. / A serva assopra uma lâmpada, / O ouvido escuta a noite dos acordes de sonata.
(Música para Mirabell, de Georg Trakl – traduzido da versão francesa de Jacques Legrand)
Não há dúvida de que Os detetives selvagens, de Roberto Bolaño (Companhia das Letras), seja um romance bem executado, como quer Sérgio Rodrigues aqui. A primeira e a terceira partes deste extenso romance (624 páginas) são os diários do personagem García Madero, que tratam, entre outros temas, de dois poetas, Ulises Lima e Arturo Belano, e sobre a procura deles pela poetisa Cesárea Tinajero. Na segunda – e maior – parte um enorme número de pessoas conta suas histórias e dá depoimentos sobre os mesmos Ulises Lima e Arturo Belano. (mais…)
Entre as mulheres tu avanças,
Teu sorriso frequentemente se angustia:
Eles vieram, os dias de medo.
Branca sobre a sebe a papoula morre.
Como teu corpo com um inchar tão bonito
A vinha de ouro amadurece sobre a colina.
Cintila ao longe o espelho da lagoa
E bate a foice nos campos.
Nas sarças correm os orvalhos
Vermelhas as folhas escoam até a terra.
Para saudar sua mulher querida
Um Mouro, moreno e rude se aproxima.
(Maternidade bendita, de Georg Trakl – traduzido da versão francesa de Jacques Legrand)
Janelas, canteiros vivos,
O canto do órgão entra.
Sombras dançam no muro,
De maneira estranha, a ronda louca.
As moitas queimando voam com clareza,
Um enxame de moscas vibra.
No campo as foices ceifam
E uma água antiga canta.
Quem com seu sopro me acaricia?
Sinais loucos de andorinhas.
No infinito baixinho escoa
A grande floresta dourada.
Chamas brilham nos canteiros.
A ronda louca se exalta
Sobre a parede amarela.
Alguém olha na porta.
Incenso e pera cheiram bem,
Vidro e arca se obscurecem.
Queimando lentamente, a face
Se inclina em direção às estrelas brancas.
(Em um quarto abandonado, de Georg Trakl – traduzido da versão francesa de Jacques Legrand)
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