“Marianne” (2019) é uma série francesa de terror da Netflix com oito episódios de cerca de cinquenta minutos cada um. Ela conta a história de Emma, uma escritora de romances de terror que acaba percebendo, para seu desgosto, que os personagens de seus livros tinham correspondentes na vida real. A série é assustadora, tem belas paisagens e ótimas atuações, principalmente de Victoire Du Bois, a atriz principal. Não se impressione pelo fato de a Netflix ter cancelado a série depois da primeira temporada: Stephen King é fã, e isso diz tudo.
Belíssimas paisagens também são um destaque de “Labirinto verde” (“Zone Blanche”), série franco-belga da TV France 2, distribuída por aqui pela Netflix, com duas temporadas com oito episódios de cerca de 50 minutos cada uma – está prevista uma continuação para este ano. A série conta a história de uma pequena cidade ficcional na França, Villefrance, que tem uma quantidade de crimes muito superior à da média nacional. Para tentar resolvê-los, a capitã Laurène Weiss (Suliane Brahim, ótima) conta com poucos ajudantes. “Labirinto verde”, cuja primeira temporada foi lançada em 2017, é uma série muito bem conduzida e com alguns toques fantásticos.
“Downton Abbey” é uma série inglesa de grande sucesso lançada entre 2010 e 2015, com seis temporadas de mais ou menos oito episódios com cerca de uma hora cada um. Ela foi produzida pelo canal ITV e atualmente é transmitida aqui no Brasil pela Amazon Prime. A série conta a história dos Crawley, família nobre inglesa fictícia, entre 1912 e 1925. “Downton Abbey” aborda temas históricos – a decadência da nobreza inglesa, o naufrágio do Titanic, o início da mudança nos rígidos costumes da época, a Primeira Guerra – com brilhantismo, e tem um grande número de personagens (tanto nobres e como seus criados) muito bem construídos e interpretados. A série mereceu todo o sucesso que fez – está previsto, aliás, um filme sobre ela.
Comentei anteriormente sobre o romance “O homem do castelo alto”, de Philip K. Dick; a série baseada nele, da Amazon Prime, foi lançada por aqui com o nome original, “The man in the high castle”. Ela tem quatro temporadas, lançadas entre 2015 e 2019, cada uma com dez episódios de cerca de uma hora. A história conta sobre um mundo paralelo em que alemães e japoneses ganharam a Segunda Guerra Mundial e dividiram os Estados Unidos em duas partes – o leste alemão e o oeste japonês. É interessante notar, entre outras coisas, a coerência da série tendo em vista a ideologia dos vencedores: os americanos, vistos como arianos pelos alemães, não sofrem preconceito e chegam a altos postos na administração nazista, mas são considerados inferiores pelos japoneses. “The man in the high castle”, que não terá mais continuação, é uma ótima série distópica, mas menos assustadora do que “The handmaid’s tale”, por exemplo: afinal de contas, sabemos que os nazistas e japoneses já perderam a guerra, mas não temos certeza de que loucuras como as de Gilead jamais acontecerão.
A primeira série francesa da Netflix, “Marseille”, teve críticas em sua maioria desfavoráveis e por isso não será renovada para uma terceira temporada. Uma queixa comum diz respeito a uma suposta falta de originalidade - Patrícia Kogut, de “O Globo”, por exemplo, comentou a respeito de suas semelhanças incômodas com séries como “The killing”, “The affair” e “House of Cards”. Bem, eu não assisti a nenhuma das três citadas, e será que isso me ajudou a gostar de “Marseille”? Sei lá.
As duas temporadas de série têm oito episódios de cerca de 50 minutos cada uma, e tratam principalmente dos jogos de poder entre o prefeito de Marselha, Robert Taro (Gérard Dépardieu) e seu desafeto e antigo seguidor Lucas Barrès, vivido por Benoît Magimel. No meio das disputas políticas, dramas familiares, relação com traficantes, a ascensão da extrema-direita, e muito sexo.
Gostei muito das muitas tramas que “Marseille” apresenta e a interpretação de Gérard Dépardieu é um negócio de outro mundo: vi poucas atuações deste nível - se é que já vi alguma.
Minisséries são como filmes longos – sabemos que a história termina ali, por mais que alguns filmes (e minisséries) tenham continuação. Uma das melhores séries a que já assisti, “Dark objects”, sobre a qual já comentei aqui, na verdade é uma minissérie, formato dos ótimos “O bosque” e “The alienist”, objetos do presente texto.
Produzido pela TNT e distribuído pela Netflix por aqui, “The Alienist” tem dez episódios de cerca de 50 minutos cada. A minissérie se passa em Nova Iorque no final do sec. XIX (a reconstituição de época é primorosa), e conta história do estranho alienista (nome antigo dado aos psiquiatras) Laszlo Kreizler, vivido por Daniel Brühl, envolvido na investigação de crimes perpetrados por um assassino serial. O enredo é bem estruturado e as atuações, muito boas, mas a história é contada com mão pesada, fazendo com que acompanhar a história seja um pouco cansativo. De todo modo, já está prevista uma continuação para a minissérie, chamada “The Angel of Darkness”.
Gostei bem mais de “O bosque”, série francesa da Netflix com seis episódios de cerca de 50 minutos cada um. Numa cidade do interior francesa, duas adolescentes desaparecem – e a minissérie conta a história da procura por elas, que acaba desnudando segredos da cidadezinha. “O bosque” tem paisagens belíssimas, ótimas atuações e mantém a tensão em todos os episódios. Não precisa mais.
Três séries israelenses distribuídas pela Netflix, uma bastante diferente da outra.
"Shtisel" tem duas temporadas com doze episódios de cerca de 45 minutos cada uma e discorre sobre a vida de uma família ultraortodoxa – com seus costumes às vezes estranhos para quem não vive aquela cultura – vivendo em Geula, Jerusalém. Os personagens principais são Shulem Shtisel (Dov Glickman), o patriarca, rabino e professor numa shivá (escola judaica), e seu filho mais novo, Akiva (vivido por Michael Aloni), que tem talento para pintura – o que traz conflitos dentro da família que, como normalmente ocorre com os ultraortodoxos, não vê com bons olhos a arte de modo geral. Além de querer ser artista, Akiva também arranja problemas já que não consegue arranjar uma noiva para casar, pois sempre escolhe os partidos mais complicados.
Mas “Shtisel” é muito mais do que isso: os outros personagens – notadamente os outros filhos e a mãe do patriarca Shulem – são todos muito bem desenvolvidos e seus dramas pessoais são às vezes tocantes, às vezes engraçados – e as atuações são sempre ótimas. Acabamos de assistir “Shtisel” e ficamos com a impressão de que os ultraortodoxos não são assim tão diferentes de nós.
“Hostages” é uma série policial com duas temporadas (22 capítulos no total, com cerca de 45 minutos cada um), uma bem diferente da outra: na primeira, a família de uma médica é sequestrada em casa para obrigá-la a errar um procedimento em uma intervenção cirúrgica que fará no primeiro-ministro israelense, com o fim de matá-lo; na segunda, os sequestradores estão encurralados por uma enorme quantidade de policiais numa escola judaica abandonada.
Os dramas de sequestrados, sequestradores e policiais são convincentes e o suspense e a tensão são uma constante nas duas temporadas.
Finalmente, “Hashoter Hatov” é uma série de comédia em duas temporadas com quinze episódios de 30 minutos cada uma, e que conta a história de Danny Konfino (Yuval Semo), policial baixinho e incorruptível, seus colegas de delegacia (um chefe vaidoso, uma policial que quer ter um caso amoroso com Danny, um parceiro que tem dorme nos momentos menos recomendáveis e um policial árabe), e sua família – uma mãe responsável, um pai exageradamente sovina e dois irmão pilantras, cada um à sua maneira.
De humor escrachado, “Hashoter Hatov” frequentemente deixa a lógica de lado para garantir boas risadas para o espectador.
Estou escrevendo um conto chamado “A mulher de César”, e abaixo seguem comentários sobre uma peça de teatro, uma biografia e uma série da Netflix que utilizei nas minhas pesquisas.
É interessante observar como o prefácio da edição de “Júlio César”, de William Shakespeare (1564-1616), da Penguin-Companhia das Letras, 186 páginas, escrito pelo grande crítico literário Harold Bloom, comenta como a peça é considerada “fria” por muitos especialistas. Ele cita, inclusive, as palavras do “maior especialista de todos”, Samuel Johnson: “nesta peça, vários trechos merecem a atenção, e a contenda e reconciliação de Bruto e Cássio são celebradas universalmente. Em mim, porém, a trama jamais causou grande comoção; chego a considerá-la um tanto fria e inócua, comparada a outras peças de Shakespeare; a maneira com que se prende à História e aos costumes romanos parece haver bloqueado o vigor natural de sua genialidade”.
Apesar do título, a peça se concentra basicamente na figura de Bruto (Roma, 85 a.C. - Filipos, 42 a.C), protegido, e posteriormente, um dos participantes famoso assassinato do líder político Júlio César (Roma,100 a.C. – Roma, 44 a.C.) no Senado Romano.
Na época em que ocorrem os acontecimentos apresentados na peça, Roma está no final da República. Júlio César já se declarou ditador perpétuo, e os conspiradores contra sua vida têm receio que ele queira transformar Roma num Império. Na peça, são apresentadas diversas cenas envolvendo o planejamento do homicídio do político, além do próprio assassinato de Júlio César e o início da reação popular contra os conspiradores (spoiler: eles se dão muito mal).
Entre todos os conspiradores, Bruto parece o único preocupado com o futuro de Roma – ao contrário dos demais, não parece ter nenhum interesse pessoal no assassinato, só entrando na conspiração para proteger a República Romana. É um grande personagem de uma grande peça de teatro – ao contrário dos críticos citados acima, não achei a peça nem um pouco fria.
Já a biografia “Júlio César”, de Joël Schmidt, impressiona ao descrever a inteligência maquiavélica do ditador romano (100-44 a.C.) ao manipular adversários políticos para conseguir o objetivo de acabar com a República Romana e fundar o Império – o que, se não conseguiu, abriu caminho para que Augusto (63 a.C. – 14 d.C.), seu sobrinho, o fizesse anos depois de sua morte.
O Júlio César que emerge da biografia é de um homem bem quisto por seus soldados, excelente estrategista, e sexualmente voraz – era famoso por dormir com as mulheres de outros importantes líderes romanos. Não era mesquinho, embora tenha estado abaixo de sua grandeza, segundo Joël Schmidt, quando se irritou com o líder gaulês Vercingetórix quando da rendição deste em Alésia, na Gália (atual França), em 52 a.C.
Finalmente, “Império Romano”, da Netflix, é uma série em três temporadas no estilo dos documentários da History Channel/H2 (ou seja, com atores, permeada com comentários de especialistas), apresentando, em cada uma delas, a história de um dirigente romano.
A primeira temporada, com seis episódios, é dedicada a Cômodo (161-192), que foi imperador romano entre 180 e 192. Ele é considerado um dos responsáveis pelo início da decadência do Império, e a série da Netflix se concentra nas várias conspirações contra dele e no seu desejo de ser gladiador – chegou a lutar no Coliseu, inclusive - mesmo sendo mandatário romano. A terceira temporada, com quatro episódios, é dedicada ao imperador Calígula (12-41 d.C.). Ele iniciou bem seu mandato imperial, no ano de 37, mas depois de uma crise em que ficou semanas em coma, acordou irreconhecível, transformando-se num tirano paranoico. A segunda temporada, com cinco episódios, é sobre Júlio César, sobre o qual já comentei acima.
Dá uma boa ideia da violência da sociedade romana o fato de que os três imperadores objeto da série da Netflix terem acabado seus dias assassinados.
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