Marcel Proust

“Vida de Petrarca”, de Ugo Dotti
Literatura
“Vida de Petrarca”, de Ugo Dotti
3 de novembro de 2024 at 12:52 0
Muita gente debochou de Luana Piovani quando ela disse que tinha lido "Cem anos de solidão", o clássico de Gabriel García Márquez, em seis meses. Segundo este link da Folha de São Paulo, ela declarou, orgulhosa:
"Terminei de ler meu último companheiro de 6 meses, meu fiel amigo de cabeceira, meu gorducho livro! Gabriel e eu realmente nos entendemos! Cem Anos de Solidão me fez viajar por lugares quentes, me apresentou mulheres loucas e admiráveis e ainda me descreveu uma cena de amor enfestada [sic] de borboletas amarelas."
Eu não entendo direito o deboche, já que às vezes demoro anos para acabar de ler um livro. Eu certamente demorei mais de dez para terminar este "Vida de Petrarca", de Ugo Dotti (Editora Unicamp, 555 páginas, tradução de Luís André Nepomuceno, publicado originalmente em 1987), sobre o grande poeta e ensaísta italiano que viveu entre 1304-1374 - uma época extremamente conturbada na Europa. Petrarca participou ativamente dos distúrbios políticos de seu tempo polemizando - muitas vezes por cartas - com políticos e escritores importantes. Quando se cita o papado de Avignon (1309-1377), por exemplo, quase sempre Petrarca é lembrado por declarar, para quem quisesse ouvir, que aquela mudança de sede, da Itália para a França, era o "cativeiro babilônico dos papas" (de todo modo, agora o papado de Avignon é um dos meus interesses estranhos). Não que precise, mas vou tentar me justificar por ter terminado tanto tempo para acabar de ler a biografia do grande poeta italiano. No prefácio "Marcel Proust - uma biografia", de George D. Painter (Editora Guanabara, 798 páginas, tradução de Fernando Py, publicado originalmente em 1959) o autor declara que, com o livro, pretendeu fazer a "biografia definitiva" de um dos meus escritores preferidos. Deixei a leitura pela metade, achei chato demais. Um trecho ao acaso mostra sobre o que estou falando:
"Proust a conheceu, no outono de 1888, ela contava trinta sete anos, e ele apenas dezessete; ela estava agora exatamente com quarenta. Era roliça, porém de cintura fina, e usava um vestido bastante decotado, com festões de pérolas, três de cada lado, que pendiam da parte mínima que ocultava seu seio. O cabelo era louro-acinzentado, atado com uma fita cor-de-rosa; os olhos eram pretos e tendiam a abrir-se desmesuradamente quando ela se excitava. 'Tenho olhos amendoados, mas em sentido inverso', dizia rindo. Possuía uma grande coleção de porcelanas, na qual incluía Proust, a quem chamava de "meu pequeno psicólogo de porcelana". Ele replicava comparando a um altar a estante em ele ela dispunha suas figuras de Saxe: 'Vivemos no século de Laure Hayman; e a dinastia reinante é a de Saxe'; (...)"
Tudo bem que "Em busca do tempo perdido" tem muitos detalhes assim, mas o objetivo no romance é sempre literário e, na biografia, é sempre descritivo. E chato. Já passei da metade de mais duas monumentais biografias definitivas - e chatas -, uma de Raspútin, de Douglas Smith, e uma de Nietzsche, de Curt Paul Janz. Em comum com as de Marcel Proust e Petrarca, descrições tediosas de viagens, conversas, relações com amigos e inimigos. E etc. Enfim, achei que nunca terminaria de ler uma "biografia definitiva" deste naipe, até que, depois de mais de uma década, terminei de ler esta "Vida de Petrarca". Fiquei orgulhoso como a Luana Piovani citada acima.  
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Três romances para reler
Literatura
Três romances para reler
10 de setembro de 2023 at 22:19 0
É meio que um mistério isso. Só costumo reler ficção quando não lembro nada do livro – normalmente no caso de obras que li muito novo, e quando algo me diz que não custaria nada ter uma ideia do que eu tinha lido. Entre os muitos autores de livros relidos nesta categoria eu posso citar Kafka, Faulkner, Jorge Luis Borges, Machado de Assis, Lampedusa, Homero e Virginia Woolf; e normalmente a releitura é prazerosa. Outro caso são os livros de alguns autores que “deixo fazer parte do passado da minha memória”, conforme eu tinha comentado aqui, como Thomas Mann, Honoré de Balzac e Philip Roth (se bem que já mudei de ideia quanto a este último). Situação semelhante é de “Em busca do tempo perdido”, da Marcel Proust, que me deixou completamente alucinado quando o li no final dos anos 1980; cheguei a reler os dois primeiros da série, mas não me vejo mais retomando Proust no futuro. Outros casos específicos são a Bíblia e o Alcorão: estou sempre lendo um pedacinho destas obras sagradas, não é como se eu tivesse necessidade de tomar a iniciativa de relê-los. E, se eu fosse apontar hoje quais os romances que mais gostei até hoje, eu apontaria “As irmãs Makioka”, de Junichiro Tanizaki, e “2666”, de Roberto Bolaño: mas me aprofundei tanto na leitura deles que não vejo muita necessidade de uma releitura. Finalmente, vamos então aos livros da minha pequena lista de três romances que, misteriosamente, sempre quero reler e que sei que ainda vou reler muitas vezes ainda (clicando no nome dos romances abaixo tem outros detalhes sobre os livros, que eu tinha comentado anteriormente neste site), começando por um que só li duas vezes: “A história secreta”, de Donna Tartt. Nunca tinha ouvido falar deste livro e um belo dia minha mãe me mostrou, dizendo que tinha comprado pouco tempo antes e que o tinha amado. Resolvi ler, e nunca esqueci a história maluca de uns estudantes universitários americanos de literatura clássica grega que bebiam sem parar. Na primeira releitura, o romance me pareceu melhor ainda. Conforme comentei aqui, é impressionante como odiei “Recordações do Escrivão Isaías Caminha”, de Lima Barreto, na primeira leitura. Depois que descobri que muito do que ele escrevia era irônico, resolvi reler o romance e ele me pareceu melhor que nunca. Sempre lembro da cena em que o narrador – baseado no próprio Lima Barreto – descobre o preconceito, numa estação de trem, contra a pele negra dele. O melhor livro da literatura brasileira, e não admito que ninguém tenha uma opinião contrária (brincadeira, admito sim, só não concordo). Só não sei se o li três ou quatro vezes, mas isso não importa, né. Finalmente, “A Cartucha de Parma”, de Stendhal. Lembro como fosse hoje quando comprei uma linda pequena edição em francês deste clássico em papel-bíblia, num sebo. Carrego esse livro sempre comigo, e já li o romance quatro vezes no total, tanto em francês quanto em português. É engraçado que meu nome é baseado do personagem Fabrizio de Salina, de um romance de Lampedusa chamado “O Leopardo”: um bom livro, mas que nem se compara com “A Cartucha de Parma”, cujo personagem principal é outro xará meu: Fabricio del Dongo é um sujeito apaixonante e amalucado, meu personagem preferido na história da literatura. Minha mãe, mesmo por vias meio tortas, me batizou muito bem.
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“Comment débuta Marcel Proust”, de Louis de Robert
Literatura
“Comment débuta Marcel Proust”, de Louis de Robert
7 de agosto de 2022 at 18:31 0
Escritor francês, Louis de Robert (1871-1937) foi a primeira pessoa a ler os originais de “Em busca do tempo perdido” e quem convenceu Marcel Proust (1871-1922) a não encurtar sua obra-prima. Boa parte da história da relação dos dois é apresentada em “Comment débuta Marcel Proust” (Como começou Marcel Proust, em português - L’Éveilleur, 130 páginas, edição prefaciada e anotada por Jérôme Bastianelli), que apresenta a correspondência entre os dois escritores. Grande parte das cartas apresentadas no livro mostram as angústias de Marcel Proust tentando publicar sua obra - como a discussão entre as editoras para quem ele a mandaria e, depois que ela foi aceita, sobre as sugestões recebidas, como diminuir o tamanho de cada edição (“Em busca do tempo perdido” tem sete livros, e as primeiras edições dividem cada um deles em mais de um volume).  O que é mais bonito em “Comment débuta Marcel Proust” é amizade entre os dois escritores (um fundamental, outro um tanto esquecido). Louis de Robert se oferece e entra em contato com várias pessoas para ajudar na publicação de “Em busca do tempo perdido”, enquanto Marcel Proust elogia o recém-lançado “Le roman du malade” de seu amigo, e lhe oferece dinheiro em caso de necessidade (Proust era riquíssimo).  E, como uma boa amizade que se preze, há umas rusguinhas aqui e ali: o capítulo final de “Comment débuta Marcel Proust” mostra uns textos com críticas relativamente severas de Louis de Robert sobre “Em busca do tempo perdido” - num tom que proustianos como eu não estamos acostumados!
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Filosofia, Literatura
Turmas
12 de janeiro de 2020 at 15:41 0
Luiz Felipe Pondé - Wikipédia

Em vídeos e crônicas, o famoso filósofo Luiz Felipe Pondé – que eu admiro muito, aliás – parece citar sempre os mesmos escritores: Fiódor Dostoiévski, William Shakespeare, Liev Tolstói, Nelson Rodrigues, Machado de Assis, Georges Bernanos e mais alguns poucos (não custa lembrar que ele está lançando um curso online sobre literatura, cujo link está aqui). Dostoiévski, então, é uma verdadeira mania para ele: em suas entrevistas da série “Democracia na Teia”, por exemplo, há uma edição gigantesca do grande autor russo atrás de entrevistador e entrevistado – mais do que isso, ele parece sempre pronto a citá-lo a qualquer momento, com ou sem necessidade.

Eu raramente cito qualquer um desses escritores da turma do Pondé. Do Dostoiévski, li “Crime e Castigo” quando adolescente, e “Os irmãos Karamazov”, bem mais tarde. Gostei muito, mas não me marcaram. De Tolstói li mais e gostei mais, mas raramente lembro dele. Machado de Assis é um gênio, claro, mas aqui no Brasil prefiro Lima Barreto (acabei de ler “Recordações do escrivão Isaías Caminha” pela terceira vez dia desses) e Dalton Trevisan. De Shakespeare conheço muito pouco, embora tenha lido “Júlio César” ano passado e tenha amado. Sobre Nelson Rodrigues eu comentei no meu “Verão de 54”: “para ser grande literatura ainda falta um tanto para Nelson Rodrigues”. Bernanos eu conheci recomendado pelo próprio Pondé, gostei muito, mas achei meio confuso.

Eu tenho uma turminha de escritores que cito sempre, também. Lembro, por exemplo, que parei de ler as colunas de dois críticos de literatura só porque falaram mal de “2666”, de Roberto Bolaño: um deles ainda teve o desplante de escrever que outra obra do chileno, “Os detetives selvagens” – que eu achei ruim – era “mais bem acabado” (ou alguma outra expressão sem sentido) que “2666”.

De todo modo, minha turminha de escritores, fora os que já citei – Lima Barreto, Dalton Trevisan, Roberto Bolaño – tem ainda Patrick Modiano, Gabriel García Márquez, Marcel Proust, Karl Ove Knausgard, Honoré de Balzac, Junichiro Tanizaki, Philip Roth, Thomas Mann, J.M.G. Le Clézio e mais alguns. Tem um outro autor que está na minha turma e na do Pondé, mas ele não foi citado – ainda.

Existe uma autora que acabou entrando na minha turma há uns poucos anos, a escritora e cantora Patti Smith. Em “O ano do macaco” ela conta de sua paixão avassaladora por “2666”, de Roberto Bolaño. Em “Devoção” ela fala de maneira extremamente carinhosa – como só ela consegue fazer – de Patrick Modiano e Simone Weil. Modiano e Bolaño admirados como devem ser! (A Simone Weil, cujas obras nunca li, deve ser muito boa também, haha.) Será que a turma de Patti Smith é parecida com a minha? Espero que sim.

De todo modo, por que a turma de Pondé é diferente da minha e, quem sabe, da da Patti Smith também? Porque, acredito eu, como filósofo, ele quer retirar algum ensinamento, quer “enxergar” algo por trás de uma obra literária. Dostoiévski e o problema da existência. Machado de Assis e o ciúme. Shakespeare e os sentimentos humanos. Nelson Rodrigues e a hipocrisia da classe média. Georges Bernanos e a fé. Tolstói e... sei lá o que ele quer ver em Tolstói.

Já eu e, provavelmente, a Patti Smith, queremos nos deslumbrar com uma obra literária. Não há o que enxergar por trás de “2666”, não há nenhum ensinamento por trás desta maravilha. O livro é apenas isso – uma maravilha. [1]

Antes de terminar, comentei acima que existe um autor que faz parte da minha turma e da do Pondé: o nome dele é Franz Kafka. Ele deve admirar o grande autor tcheco pela crítica à burocracia, ou pelo retrato simbólico do absurdo da existência, ou coisa que o valha. Eu sei que amo Kafka pela imaginação e pela maravilhosa técnica de contar histórias malucas como se estivesse fazendo um relatório de empresa de seguros.


[1] Algum engraçadinho pode vir me questionar dizendo que o que está por trás das obras de Balzac, Thomas Mann e Junichiro Tanizaki, da minha turma, sejam respectivamente o dinheiro, a arte e o sexo. O que eu teria em minha defesa? Sei lá, hehe.

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Exercícios Literários, Literatura
Proust/Machado
4 de novembro de 2019 at 12:05 0
Machado e Proust: Wikiquote/Britannica

Fiquei meio espantado com a frase de Machado de Assis, em Brás Cubas: “não te irrites se te pagarem mal um benefício: antes cair das nuvens, que de um terceiro andar” (já tinha lido a obra, mas não me lembrava em absoluto desta citação). Explico: ela lembra, de maneira notável, uma frase de Proust: “é melhor cair das nuvens do que cair dos planos”.

Logo fiquei pensando nos paralelos incríveis entre duas frases tão semelhantes: será que Proust sabia da obra de Machado, escrita em 1881, quando o francês tinha dez anos? Provavelmente não: se a literatura brasileira tem pouca penetração no exterior hoje em dia, imagine-se no século XIX. Então, só me restava comparar as duas sentenças, na maneira incrível como “planos”, na frase de Proust, se transformava em “terceiro andar”, na machadiana: nos dois casos a realidade atinge de maneira definitiva e inexorável o “sonhador”, aquele que “não mantém os pés na terra”, que “vive nas nuvens”.

Que notável! Dois gênios, separados por um oceano e algumas décadas de distância, praticamente criando uma transmissão de pensamentos!

Mas é melhor desconfiar, né? Antes de evoluir nos meus próprios pensamentos, resolvi dar uma olhadinha na internet: a frase do Proust realmente é citada, mas em sites de autenticidade duvidosa. Mais do que isso, nas minhas pesquisas em francês não surgiu nada parecido com a sentença supracitada. A frase, com quase 100% de certeza, não é de Proust, e quase caí no conto (eu a tinha lido como se fosse dele há muitos anos já).

Enfim, esse assunto tem tudo para cair em outra reflexão: quem inventou essa coisa? Provavelmente algum brasileiro, que conhecia a frase de original de Machado de Assis e resolveu dar um lustro afrancesado na coisa.

Pensando nisso, não posso deixar de me divertir ao pensar nesse suposto brasileiro piadista.

(Crônica baseada no seguinte desafio literário proposto por Robertson Frizero: No capítulo CXIX do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, o narrador-protagonista lista uma série de irônicos aforismos de sua autoria. O desafio de hoje é escolher um desses aforismos e escrever um conto, crônica ou poesia de até 500 palavras a partir de sua interpretação da frase. Estes são os aforismos machadianos: (...) Não te irrites se te pagarem mal um benefício: antes cair das nuvens, que de um terceiro andar.)

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Meus livros preferidos
Literatura
Meus livros preferidos
22 de julho de 2018 at 19:11 0
Faz tempinho que eu não faço uma listinha de livros preferidos, né? Então lá vai mais uma, com links de comentários meus sobre os livros e/ou os autores:

1. “Em busca do tempo perdido”, de Marcel Proust: todo um universo em sete livros. (mais…)

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“La Bibliothèque de Marcel Proust”, de Anka Muhlstein
Literatura
“La Bibliothèque de Marcel Proust”, de Anka Muhlstein
17 de janeiro de 2017 at 00:08 0
É bacana saber que um dos seus defeitos era compartilhado por um gênio. Em “La Bibliothèque de Marcel Proust” (“A Biblioteca de Marcel Proust”), de Anka Muhlstein (Odile Jacob, 180 páginas), a autora conta que o grande escritor francês era tão bagunçado com seus livros que raramente conseguia encontrá-los quando queria. Às vezes emprestava um para um amigo e pedia que ele o guardasse, já que seria mais fácil reencontrá-lo na casa dele do que na sua própria. Bem, eu também tenho dificuldade em encontrar meus livros... (mais…)
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Marie de Bernadaky
Literatura
Marie de Bernadaky
8 de junho de 2015 at 15:18 0
Por mais que eu tente, não conseguiria exagerar a importância de Marcel Proust na minha história, como direi, "literária". (mais…)
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