agosto 2020

Literatura
“Sobre os ossos dos mortos” de Olga Tokarczuk
30 de agosto de 2020 at 18:59 0
Olga Tokarczuk Folha de São Paulo

Janina Dusheiko era uma engenheira especialista em projetos de pontes que, por motivo de graves dores não bem diagnosticadas, resolve largar tudo e morar num pequeno povoado na Silésia, Polônia - quase junto à fronteira com a República Tcheca. Lá ela cuida das casas das pessoas que têm casas de veraneio, das quais saem nos meses frios, e dá algumas aulas de inglês para crianças. Janina é a narradora e a personagem principal de “Sobre os ossos dos mortos” (Todavia, 256 páginas, lançado originalmente em 2009), romance da polonesa Olga Tokarczuk, vencedora do Prêmio Nobel de 2018.

No pequeno povoado Janina Dusheiko causa problemas para os caçadores e para a polícia – para quem manda enormes cartas se queixando das atividades ilegais daqueles. Vegetariana e astróloga amadora, ela odeia todos os que fazem mal para os animais e tenta achar uma razão para os acontecimentos e para as personalidades das pessoas nos astros. À medida que o romance transcorre, algumas pessoas que ela odeia – caçadores, policiais, pessoas envolvidas em atividades ilegais – morrem de forma misteriosa. A explicação dela é tão estranha quanto ela própria: a assassina é a própria Natureza se vingando dos homens maus por meio de animais se unindo e partindo para a ação. Outra característica de Janina Dusheiko é chamar todas as pessoas mentalmente por apelidos que ela mesma inventa.

Olga Tokarczuk conta magistralmente esta história ao mesmo tempo farsesca e sombria, e é brilhante nas suas descrições: a cada vez que lembro do livro me vem a imagem de neve por todos os lugares, com casas sofrendo com as intempéries – e um pouco de sangue aqui e ali.

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Música
“O dia em que o rock morreu”, de André Forastieri
13 de agosto de 2020 at 22:03 0
André Forastieri: 180graus

Foi ouvindo o ótimo podcast “Álvaro & Barcinski & Forasta & Paulão”, que é uma retomada do falecido “Garagem”, que fiquei com vontade de ler este “O dia em que o rock morreu” (Arquipélago Editorial, 121 páginas, lançado originalmente em 2017), do jornalista e ex-crítico da Bizz André Forastieri (aliás, Álvaro Pereiro Jr. e André Barcinski, que participam do podcast, também eram críticos da finada revista). Acompanho a carreira de André Forastieri desde, praticamente, seu início, e fiquei interessado em ler este apanhado de textos jornalísticos do autor não só porque ele escreve muito bem, mas também porque, como soube pelo podcast, ele tinha colocado no livro todos os seus textos sobre Kurt Cobain – com direito à única entrevista do cantor do Nirvana quando esteve aqui no Brasil, em 1992.

Enfim, eu sabia que o gosto do André Forastieri é bem diferente do meu – ele odeia Smiths e Morrissey e isso já diz tudo. Mas a leitura de  “O dia em que o rock morreu” foi bem agradável: ele parece arrogante, mas quem conhece o cara do podcast “Álvaro & Barcinski & Forasta & Paulão” pode ter a mesma opinão que eu: ele parece não se levar assim tão a sério, e essa é uma qualidade rara. Sem contar que, não custa repetir, ele escreve bem demais.

O mais bacana ainda, particularmente, foi ele ter explicitado a diferença enorme que existe entre mim e os amantes de rock em geral. Segundo as palavras de André Forastieri,

“o rock foi muito importante para mim, na vida, no amor, no trabalho, na maneira como entendo o mundo. Rock é tesão proibido, coragem suicida, dentes à mostra.”

Falando sobre Jimi Hendrix, ele comenta que:

“ouvir sua guitarra me dá vontade de fazer besteira, e besteiras que nunca fiz. Rock’n’roll é isso.”

Já sobre a banda de punk feminino The Slits, que nunca ouvi, André Forastieri fala que

“(a banda) dizia a que vinha desde o batismo. Era rock barulhento, abrasivo, feminista, multicultural. As meninas não tinham medo de nada.”

Essa fé no poder transformador do rock, da revolta e tudo o que vem junto com ela, de certa forma me desvelou por que sempre senti um certo estranhamento com “roqueiros” (desculpem o termo, que muitos não gostam) em geral: para mim, o rock é só mais um estilo musical, como outros que amo tanto quanto, como blues, pop, rap, erudito e jazz. Um estilo, como todos os outros aliás, com coisas maravilhosas (Morrissey, por exemplo) e detestáveis.

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