Charles Bukowski

Livros lidos recentemente
História, Literatura, Religião
Livros lidos recentemente
28 de dezembro de 2024 at 18:10 0
"Nação tomada pelo medo", de Thom Yorke & Stanley Donwood (Darkside, tradução de João Paulo Cuenca, 168 páginas, publicado originalmente em 2021): a poesia de Thom Yorke, vocalista da grande banda britânica Radiohead, é claustrofóbica, estranha e de forte crítica social. Os desenhos deste lindo livro em capa dura, a cargo de Stanley Donwood, são tão impressionantes quanto. Foi bom ter tatuado o símbolo da banda no braço, ele aparece em grande parte dos desenhos de "Nação tomada pelo medo". *** "O livro dos espíritos", de Alan Kardec (FEB, tradução de Guillon Ribeiro, 367 páginas, publicado originalmente em 1857): o cemitério de Père Lachaise, em Paris, é famoso por ser o descanso final de gente muito famosa, como Oscar Wilde, Marcel Proust e Jim Morrison, vocalista da banda americana The Doors - mas o túmulo mais visitado é o do criador do espiritismo, Alan Kardec, graças aos espíritas brasileiros que vão até lá render homenagens ao fundador desta religião extremamente popular por aqui, mas basicamente esquecida no resto do mundo (obtive boa parte dessas informações num documentário da TV francesa). "O livro dos espíritos" é escrito em forma de perguntas e respostas, e é o primeiro livro que os interessados nesta religião normalmente devem ler. *** "A revolução dos bichos", de George Orwell (Companhia das Letras, tradução de Heitor Aquino Ferreira e posfácio de Christopher Hitchens, 147 páginas, publicado originalmente em 1945): eu era pré-adolescente quando li esta obra-prima pela primeira vez. Ainda tinha ilusões socialistas, e foi um choque para mim. Além disso, não sabia da relação de "A revolução dos bichos" com Stálin e Trótski. A releitura me confirmou que George Orwell sabia das coisas. *** "Maigret sai em viagem", de Georges Simenon (L&PM Pocket, tradução de Alessandro Zir, 164 páginas, publicado originalmente em 1958): neste livro o famoso Inspetor Maigret investiga um crime na alta sociedade. Simenon é sempre muito bom, mas não gostei muito da solução do crime neste romance. *** "Mistérios de Curitiba", de Dalton Trevisan (Record, 141 páginas, publicado originalmente em 1968): "A palavra do Senhor contra a cidade de Curitiba no dia de sua visitação: / Suave foi o jugo de Nabucodonosor, rei de Babilônia, diante de Curitiba escarmentada sob a pata dos anjos do Senhor como laranja azeda que não se pode comer de azeda que é. / Gemerei por Curitiba: sim, apregoarei por toda a Curitiba a nuvem que vem pelo céu, o grito dos infantes a anuncia; porque o Senhor o disse." E assim por diante. *** "O queijo e os vermes - o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela Inquisição", de Carlo Ginzburg (Companhia de Bolso, tradução de Maria Betânia Amoroso, 256 páginas, publicado originalmente em 1976): Domenico Scandella, conhecido por Menocchio, era um moleiro da região do Friuli, na Itália, e que nasceu em 1532. Ele não só sabia ler e escrever, numa época em que pessoas de sua classe social eram quase sempre analfabetas, como suas leituras o faziam ter ideias sobre a origem do mundo. Segundo Menocchio, a vida e mesmo Deus surgiram de uma massa pastosa inicial, assim como os vermes surgem - conforme a crença da época - do queijo. Sabemos da vida e das ideias de Menocchio porque ele foi longamente interrogado pela Inquisição, com tudo registrado. "O queijo e os vermes" apresenta uma história insólita, tão esquisita e fascinante quanto aquela dos benandanti, descritos em outra obra do mesmo autor, "Os andarilhos do bem", comentado aqui. *** "Da próxima vez, o fogo", de James Baldwin (Companhia das Letras, tradução de Nina Rizzi, 128 páginas, publicado originalmente em 1962): composto por dois textos, o curto "Carta a meu sobrinho em ocasião do centenário da abolição", e "Carta de uma região de minha mente", este livro é, segundo a contracapa, um "clássico incontornável no debate sobre os direitos civis nos Estados Unidos". Nesta obra extraordinária, Baldwin não só discute as raízes e as consequências do racismo norte-americano, como se mostra um tanto impiedoso contra seu próprio passado como pregador protestante. *** "Clímax", de Chuck Palahniuk (LeYa, tradução de Érico Assis, 224 páginas, publicado originalmente em 2014): C. Linus Maxwell (apelidado de ("ClíMax") é um milionário que cria artefatos eróticos para mulheres, mas não quaisquer artefatos: os produtos da sua indústria deixam as usuárias viciadas como se fossem dependentes de heroína ou fentanil - com todos os problemas graves que vêm junto com o uso desenfreado de drogas pesadas. Os romances de Chuck Palahniuk são sempre esquisitos, mas aqui ele pesou a mão na estranheza. E eu, claro, gostei, como sempre. *** "As pessoas parecem flores finalmente", de Charles Bukowski (L&PM Editores, tradução de Claudio Willer, 311 páginas, publicado originalmente em 2007): diz a lenda que o filósofo e escritor Jean-Paul Sartre chamava Bukowski de "o maior poeta da América", mas parece que isso era uma mentira inventada pelo próprio poeta. Neste, que é o primeiro livro de poesia do autor que já li, os temas são os mesmos de grande parte de sua prosa: bebedeiras, corridas de cavalos, a vida de escritor, sua mulher e sua filha. Mas aqui há uma maior objetividade, e, por que não? - um maior lirismo.
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Revisitando livros lidos na adolescência
Literatura
Revisitando livros lidos na adolescência
20 de outubro de 2024 at 13:04 0
É sempre interessante reler livros lidos há muito tempo. Recentemente revisitei dois autores que não lia há mais de trinta anos já. Eu conheci o escritor norte-americano Charles Bukowski (1920-1994) pelas críticas sempre favoráveis da Revista Veja a respeito de sua obra. Li cinco livros do autor na adolescência, e lembro eles tinham uma estrutura meio circular, quase sempre com os mesmos temas: bebedeiras homéricas, sexo desenfreado com mulheres meio perdidas, sem grandes objetivos na vida - como o narrador/autor, aliás -, apostas em corridas de cavalo, mudanças constantes de um subemprego para outro, o início da fama na literatura. Lembro que eu não considerava a obra de Bukowski como "literatura séria" - eu amava Thomas Mann, na época, para que se tenha uma ideia -, mas me sentia atraído por aquelas histórias malucas. Enfim, um belo dia emprestei meus cinco livros de Bukowski para alguém que não lembro até hoje quem era, e que nunca me devolveu - e nunca mais tive contato com o autor. Alguns meses atrás passei na frente de um sebo e lá estava com destaque este "Crônicas de um amo louco - ereções, ejaculações e exibicionismos - Parte I" (L&PM, tradução de Milton Persson, 320 páginas, publicado originalmente em 1967), e resolvi comprá-lo. A releitura me revelou um escritor muito melhor do que eu me lembrava: sua perspectiva às vezes divertida e quase sempre carinhosa de seus personagens à margem da sociedade e, frequentemente, desencantados, é coisa de um grande escritor. No que depender de mim, vou continuar lendo - e relendo - Charles Bukowski por muito tempo ainda. Com o escritor italiano Alberto Moravia (1907-1990) a minha relação era ao mesmo tempo parecida e diferente. Ele também tinha ótimas críticas na Revista Veja e suas histórias eram fortemente sexuais; mas, ao contrário de Bukowski, ele tinha um verbete nas páginas principais da Editora Abril. Na minha mente de adolescente meio exibido e fanático por literatura, isto fazia uma grande diferença. Li nos anos oitenta três livros de Alberto Moravia, e dois deles, o romance "A Romana" e este "A coisa", de contos, me impactaram enormemente. Sempre tive na cabeça a ideia de que deveria reler Moravia: ainda não revisitei o romance, mas reli o outro citado recentemente. "A coisa" (Difel, tradução de Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade, 268 páginas, lançado originalmente em 1983) é composto por histórias que envolvem, frequentemente, sexualidade, política e/ou mistério com  toques sobrenaturais. Os primeiros contos do livro são mais longos, e parece que Moravia foi ficando com preguiça à medida que o escrevia, já que os contos vão diminuindo em tamanho - e também em qualidade - à medida que as páginas vão transcorrendo. Os mais impressionantes são: aquele que dá título à coletânea, em que "a coisa" é uma tara estranha de um casal de lésbicas; "Ao deus desconhecido", em que uma enfermeira presta pequenos favores a seus pacientes homens num hospital; "A mulher da capa preta", uma história selvagem e misteriosa sobre dois viúvos que se hospedam num mesmo hotel; e "O cinto" e "O sinal da operação", duas histórias que hoje em dia seriam consideradas politicamente incorretas, uma sobre violência doméstica, outra sobre um padrasto e sua enteada. Se os melhores contos são grande literatura, mesmo nos piores a escrita de Alberto Moravia faz o leitor nunca perder o interesse. No que depender de mim, vou continuar lendo - e relendo - Alberto Moravia por muito tempo ainda.  
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