História

“Os andarilhos do bem”, de Carlo Ginzburg
História
“Os andarilhos do bem”, de Carlo Ginzburg
2 de maio de 2021 at 14:05 0
Nas quintas-feiras do Quatro Tempos (segundo a Wikipédia, “a semana de santa Lúcia em dezembro, Quarta-Feira de Cinzas, domingo de Pentecostes e no domingo de Exaltação da Santa Cruz em setembro”) os benandanti (ou seja, “andarilhos do bem”) são convocados para a batalha noturna contra as bruxas. Caso aqueles sejam vencedores das lutas, a colheita terá sucesso; em caso contrário, ela será um fracasso e a fome grassará no Friul, região no nordeste da Itália. Os benandanti são os “empelicados”, ou seja, aqueles que nasceram sem o rompimento do “pelico” - ou bolsa amniótica -, que muitas vezes o carregam consigo pelo restante da vida. Os “andarilhos do bem” batalham apenas em espírito, ou seja, ficam deitados na cama, imóveis, enquanto suas almas vão lutar contra as bruxas pelo bem da colheita e, em última análise, da comunidade - importante ressaltar que eles não podem ser acordados ou mexidos nessas ocasiões porque a alma corre o risco de não voltar para o corpo. A Inquisição acaba sabendo da existência sobre desses estranhos benandanti e vários processos são instalados com o intuito de descobrir o quanto o procedimento deles é contrário às leis da Igreja. Apesar de um ou outro benandanti ser condenado à fogueira, na grande maioria dos casos os inquisidores, muito mais preocupados contra heresias protestantes, acabam deixando os bruxos do bem em paz. O que foi descrito acima aconteceu entre o final do século XVI e o início do século XVII, e é descrito com detalhes em “Os andarilhos do bem”, do historiador italiano Carlo Ginzburg (Companhia das Letras, 283 páginas, tradução de Jônatas Batista Neto, publicado pela primeira vez em 1966). E o livro é tão fascinante quanto parece.
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“Como fazíamos sem” e coleção “Baú de Histórias”
História
“Como fazíamos sem” e coleção “Baú de Histórias”
2 de maio de 2021 at 13:40 0
Existem alguns assuntos de conversa que são melhores que outros. Diferenças lingüísticas, por exemplo. Experimente, numa roda de amigos, dizer que o chinês é uma língua tonal, o que significa que uma palavra muda totalmente o sentido se você a pronunciar como um pergunta, como uma afirmação ou como uma ordem, que você vai ver a reação fascinada da maioria das pessoas. Outras dicas: diga, por exemplo, que o japonês tem três alfabetos, um deles copiado do chinês, o que faz com que uma pessoa japonesa consiga entender por alto um texto escrito em chinês, por mais as duas línguas sejam totalmente diferentes. Que o vietnamita é uma língua tonal como o chinês, mas que o governo comunista de lá resolveu mudar do alfabeto antigo para o alfabeto latino (o nosso). Resultado: para dar conta dos diversos tons utilizando as nossas letras, o vietnamita é escrito com mais de dez acentos, que se situam acima, no meio e abaixo das letras! Isto até pode ser "cultura inútil", que não vai fazer aumentar nossos salários, mas que diverte e fascina. Outro assunto de conversa interessantíssimo é a chamada "história da vida privada", a história, não das grandes personalidades e líderes, mas do dia-a-dia da intimidade das pessoas. Entre os assuntos que este tipo de "história íntima" analisa está o "como vivíamos sem" um ou outro novo produto ou aparelho. A tecnologia tem mudado radicalmente a vida dos seres humanos: muitas pessoas de mais de quarenta anos mal conseguem acreditar como viviam sem celulares na juventude (por mais que ninguém sentisse falta do aparelhinho na época!). Um dos grandes fascínios da recente série Roma¸ da HBO, por exemplo, é o cuidado dos produtores em mostrar a vida na República Romana (pouco antes do início do Império) exatamente como ela era: as pessoas comiam com as mãos, usavam tochas para iluminação (não havia luz elétrica) e até uma trepanação - cirurgia que consistia em fazer buracos no crânio usando uma pedra para libertar os espíritos ruins que tinham se alojado no corpo do doente - é mostrada no seriado. Comer com as mãos, tochas para iluminação e trepanação são alguns dos exemplos citados no delicioso "Como fazíamos sem", da jornalista mineira Bárbara Soalheiro (Panda Books, 144 páginas). O livro é bem-humorado - na medida certa, ou seja, nada "engraçadinho" - e muito bem ilustrado. Em seus capítulos curtos, mostra o que as pessoas faziam quando não havia anestesia, geladeira, armário, dinheiro... Alguns exemplos apresentados no livro são particularmente interessantes. Antes da invenção do vaso sanitário, "o matinho era a privada de nossos antepassados. Lá pelo século XVIII, quando as cidades começaram a crescer e já não havia tanto mato por perto, a solução foi usar baldes. E é por isso que os maiores beneficiados com a invenção de privadas não foram os que estavam com vontade de usar o toalete (afinal, cá para nós, quando a vontade é grande mesmo o lugar pouco importa), mas os transeuntes das grandes capitais. Depois que acabavam de fazer suas necessidades, as pessoas despejavam o conteúdo dos baldes nas ruas. Em Paris, para alertar quem passava, gritavam 'Água vá!' antes de jogar fezes e urina pela janela. No Rio de Janeiro ou em Salvador, nem isso eles faziam." Sem avião, sem automóveis e sem boas estradas, a viagem de "Ouro Preto ao Rio de Janeiro - as duas principais cidades brasileiras no século XVII - levava pelo menos 12 dias. Hoje, é assunto resolvido com apenas 50 minutos dentro de um avião. E se você é daqueles que reclamam depois de algumas horas dentro do carro e acha que o maior problema naquele tempo era ter paciência para agüentar quase duas semanas de viagem, é porque não tem idéia do quanto elas eram desconfortáveis. Quem fazia a viagem com mais freqüência eram os tropeiros, encarregados do comércio de animais - em geral, bois. Eles iam a cavalo, parando em fazendas para pernoitar. Um dos problemas que enfrentavam - além dos percalços da estrada como lama, mosquitos e bandidos - era levar alimentos que não perecessem em uma viagem tão longa. Foi dessas dificuldades que nasceram alguns pratos que comemos até hoje. Um dia, por exemplo, alguém que gostava muito de feijão teve a idéia de misturá-lo com farinha. Assim ficava mais fácil transportar - e o feijão se mantinha conservado por mais tempo. Resultado: nasceu o feijão tropeiro, um clássico da comida nacional." "Como fazíamos sem" ainda tem muitas outras curiosidades sobre como era a vida de nossos antepassados, como o motivo pelo qual os ingleses são pontuais e os brasileiros não. Mas, para saber mais, o negócio é comprar os livro. Se você for fã de cultura inútil ou de um bom papo, não vai se arrepender. _____________________________________________________________ Segundo a sua coordenadora de publicação, Mary del Priore, a coleção Baú de histórias, da José Olympio Editora, apresenta raridades bibliográficas, inéditas até hoje e marcadas pela indiferença e o esquecimento, que têm interesse literário, histórico e etnográfico, "raros testemunhos de um universo e um tempo que perdemos". Dois exemplares desta coleção tratam da escravidão durante o período do Império Brasileiro: Cinqüenta dias a bordo de um navio negreiro, do pastor anglicano Pascoe Grenfell Hill (123 páginas) e Entrevistas com escravos africanos na Bahia oitocentista, do estudioso francês Francis de Castelnau. O mais interessante entre eles é Cinqüenta dias... Em 1842 os brasileiros e portugueses ainda não tinham abolido o tráfico de escravos da África para o Brasil, e os navios negreiros eram considerados fora-da-lei pela legislação internacional. O livro do pastor Grenfell Hill conta uma história real: uma apreensão de um navio transportando escravos por uma barcaça inglesa. O que poderia ser uma história de final feliz com a libertação dos cativos, infelizmente, resultou em uma tragédia. Os ingleses não podiam, simplesmente, mandar os escravos para um local próximo na costa africana porque eles seriam escravizados de novo (eram próprios negros africanos que vendiam seus semelhantes). A solução era liberá-los em um lugar distante, mas os ingleses não tinham o menor conhecimento de como transportar uma grande quantidade de pessoas no espaço exíguo de um navio e com poucos víveres. Resultado da expedição descrita por Grenfell Hill: uma quantidade muito maior de mortos entre os negros do que quando os portugueses ou brasileiros - que tinham grande experiência no transporte de escravos -comandavam os navios negreiros. O grande interesse de Francis de Castelnau em Entrevistas... é saber mais sobre a possível existência de uma tribo africana cujos membros tinham rabos (!). Vários escravos entrevistados contam rapidamente suas histórias, das guerras que participaram, e de como foram apreendidos para serem vendidos - além, é claro, de contar o que sabiam sobre a tal estranha tribo. Se a leitura do livro de Castelnau é um pouco cansativa às vezes - principalmente quando descreve a geografia dos lugares pelos quais os escravos passaram - por outro o livro, como documento histórico de uma época, é de um fascínio inegável. Também sobre a escravidão é o estudo Feitio de viver - memórias de descendentes de escravos, da carioca e professora da Universidade de Londrina Gizêlda Melo do Nascimento (Eduel, 167 páginas), que apresenta 41 entrevistas com depoimentos de descendentes de escravos e sua análise, em linguagem acadêmica. (publicado no suplemento dominical do jornal O Estado do Paraná em 2006)
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“Meu Nome Não é Johnny – A Viagem Real de um Filho da Burguesia à Elite do Tráfico”, de Guilherme Fiuza
História
“Meu Nome Não é Johnny – A Viagem Real de um Filho da Burguesia à Elite do Tráfico”, de Guilherme Fiuza
25 de abril de 2021 at 13:52 0
Todo o mundo já deve ter ouvido aquela teoria de que os “verdadeiros” grandes traficantes do Rio de Janeiro moram confortavelmente em apartamentos na Zona Sul carioca, não nos morros. Quando se lê o subtítulo de Meu Nome Não é Johnny – A Viagem Real de um Filho da Burguesia à Elite do Tráfico, de Guilherme Fiuza (Editora Record, 336 páginas), pode-se pensar que estamos diante de um caso destes – ou seja, o de um traficante realmente grande com educação burguesa. Sinto decepcionar os partidários desta teoria da conspiração, mas a história contada neste excelente livro é um pouco diferente. Meu Nome Não é Johnny conta a história de João Guilherme Estrella, rapaz bem nascido que gosta de tocar músicas em seu violão e que cedo começou a se envolver no meio artístico. A partir da convivência com a “turma” vêm as primeiras experiências com drogas. Primeiro a maconha, depois o LSD e então a cocaína – que acaba viciando-o. Como necessita de cada vez maiores quantidades para consumo próprio, ele começa a vender pó (ainda em pequena escala) para arranjar dinheiro. Isto o faz entrar em contato com alguns traficantes e a coisa vai aumentando. Estrella arruma esquemas para traficar quantidades cada vez maiores diretamente da Bolívia: a cocaína que ele conseguia lá – apelidada de “Nelore Puro” – era a mais pura do mercado de drogas no Rio da época (final dos anos 80/início dos 90). Juntando o grande conhecimento da sociedade carioca que tem João Guilherme Estrella (ele sempre fora um sujeito extremamente sociável e simpático) com a qualidade insuperável de seu pó, é óbvio que o resultado só pode ser um. O rapaz da Zona Sul transforma-se em um grande atacadista de drogas, chegando a fazer viagens para Amsterdam para fazer grandes vendas do “Nelore Puro” na Europa). E, claro, neste tempo todo ele continua ingerindo quantidades fenomenais de cocaína. Mas se Estrella já passa a ser um grande traficante em termos de quantidade, em termos de violência ele não pode ser comparado aos chefões do morro. Impulsivo, pouco se importando com as conseqüências de seus atos, não só ele não tem segurança pessoal como sequer anda armado. Logo a Lei está atrás dele. Na primeira vez consegue se safar da polícia através de suborno. Na outra isto não é mais possível. É preso, recebendo uma condenação leve, em um grande momento da juíza que o condenou – pois ela, acertadamente, acreditava no caráter de João Guilherme Estrella. Mas nem por isto o sofrimento que o protagonista passa, tanto na cadeia quanto no manicômio judiciário, são pequenos. Todos estes maus momentos acabam ajudando o rapaz da Zona Sul a se redimir. Atualmente, ele trabalha como produtor musical, não trafica mais e está recuperado do vício da cocaína. Meu Nome Não é Johnny (o título é baseado na notícia do Jornal do Brasil; quando da prisão do traficante, o diário carioca escreveu que seu apelido era Johnny – o que nunca fora verdade) é uma obra extremamente bem escrita, em uma linguagem simples, direta e envolvente. É o tipo do livro difícil de parar de ler. Outra qualidade é que, em nenhum momento, o autor Guilherme Fiuza parece querer dar uma lição de moral aos leitores. Fiuza nem precisa disto, na verdade. A história fala por si. (Publicado no Mondo Bacana em 2008) (foto obtida no Posfácio)
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“O fim”, de Karl Ove Knausgård
História, Literatura
“O fim”, de Karl Ove Knausgård
18 de abril de 2021 at 13:37 0
Reconheço aqui que eu acessava o site da Companhia das Letras algumas vezes por mês para ver se finalmente tinha sido publicado em português o sexto e último volume da série de autoficção “Minha luta”, do norueguês Karl Ove Knausgård. Depois de uma longa espera, finalmente saiu “O fim” – título em português do livro tão aguardado, com tradução de Guilherme da Silva Braga –, e aí entendi por que o negócio demorou tanto (o anterior, chamado por aqui de “A descoberta da escrita”, tinha sido lançado por aqui em 2017): o sexto volume da série que catapultou Knausgård para o sucesso mundial tem 1054 páginas. Eu nem sei o tamanho da letra da edição impressa, já que eu li o livro no Kindle, mas tenho impressão, a partir de rápida folheada numa livraria, de que ela é pequena. Um romance realmente muito longo. Em “O fim” Knausgård dá muitos detalhes do medo que ele sentiu por ter apresentado fatos íntimos sobre diversas pessoas conhecidas nos romances anteriores da série, como a depressão da esposa e o processo que um tio ameaçou mover contra ele. Outro tema recorrente é a sua rotina como pai de três crianças, duas meninas e um menino, e a dificuldade da esposa em lidar com seu papel de mãe. Tudo isso com o estilo fascinante e ultradetalhado de Knausgård, que pode usar mais de cem páginas para descrever um jantar sem nunca parecer chato ou repetitivo. Mas “O fim” tem também um número enorme de páginas de teor ensaístico, de excelente qualidade aliás, nas quais se destacam dois temas: a análise de um pequeno poema do romeno, radicado na França, Emil Cioran, e a análise do livro “Minha luta” original, de Adolf Hitler, e do nazismo como um todo. Enfim, a leitura do ciclo “Minha luta” de Knausgård acabou. E eu tenho mais um livro dele aqui em casa, de nome “Winter”, mais recente e de outro ciclo chamado, na tradução em inglês, de “Seasons Quartet”. Será que eu o leio em inglês mesmo, arriscando a perder alguma coisa do sentido, ou fico entrando de novo no site da Companhia das Letras para ver se eles o publicam por aqui em português?
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Pikillacta
História, Viagem
Pikillacta
21 de fevereiro de 2021 at 19:52 0
A região de Cusco, no Peru, é impressionante. Grande parte das pessoas já ouviu falar Macchu Picchu, a cidade inca construída na parte superior de uma montanha nos Andes. Quando eu e minha família fomos para lá, entre o final de 2018 e início de 2019, passamos um dia inteiro fazendo o trajeto Cusco-Macchu Picchu, com meios de transporte que incluíam uma van, um trem e um ônibus tanto na ida quanto na volta. Lá em cima, na antiga cidade inca, eu tive uma crise de pânico por causa da altura da coisa, mas graças a Deus este texto não é sobre isso. Nos dias a seguir à malfadada – para mim – viagem, saímos com um guia, o querido Irvin Alex Choqque Vargas e fomos conhecer as atrações turísticas da região de Cusco. Uma igreja espetacular num pequeno povoado. Uma barragem inca. Uma outra atração inca em que eu não fui porque não queria saber de lugares altos tão cedo. Uma loja de produtos típicos. Mas nada disso tinha me preparado para o que eu encontraria em Pikillacta, um antigo centro urbano da civilização Wari. Fiquei impressionado com as ruínas desta enorme cidade, tão grande ou maior que Macchu Picchu, criada por uma civilização da qual eu nunca tinha ouvido falar. Os  Wari foram um povo pré-Inca que viveu entre os anos 500 e 1100 d.C., numa região que se estendia entre Catamarca, ao norte, e Cusco, ao sul. Uma discussão importante entre os pesquisadores atuais do Império Wari é se este povo era o tipo de conquistador ao estilo dos romanos e mongóis - imperialistas stricto sensu - ou se era simplesmente uma civilização de negociantes, cuja influência nos estilos de cerâmica se dava mais pelo comércio do que outra coisa. A arquitetura de Pikillacta é toda ortogonal, conforme mostra esta foto aérea obtida do livro de Gordon McEwan, “The Wari Empire in Cuzco”[1]: O esquema típico das construções era mais ou menos assim, ainda segundo o livro de McEwan: O mesmo livro apresenta o desenho de um desenho mais amplo de como deveria aparentar um setor a cidade de Pikillacta quando era habitada no ano 700 d.C.: E uma planta de três setores da cidade: O estado atual de Pikillacta pode ser visto em algumas fotos que eu tirei no local, a seguir - em algumas delas se pode ver as escavações e pesquisas que estavam sendo feitas. Próximo à entrada de Pikillacta foi construído um pequeno museu, no qual se pode ver dois fósseis gigantes - bem anteriores ao império Wari - e alguns objetos de cerâmica, conforme mostrado nas fotos a seguir: A grande atração do pequeno museu, porém, é a armadura - feita em prata - do Señor Huari de Vilcabamba, provavelmente um dirigente Wari, encontrada em 2011 numa região da selva peruana chamada Espíritu Pampa, no distrito de Vilcabamba da província de La Convención, Cuzco. Abaixo segue a foto da armadura do Señor Huari de Vilcabamba, que também encabeça este texto. Foi uma pena que começou a relampejar feio quando estávamos em Pikillacta, e nossa visita foi curta. Por mim, teria ficado o dia inteiro lá. *** Fiquei tão impressionado com Pikillacta que comecei a pesquisar sobre a Civilização Wari, mas acho que comentar sobre essas pesquisas foge um pouco do objetivo deste texto – o que dá para adiantar, de todo modo, é que não se sabe direito para que servia a cidade. Gordon McEwan defende, entre outras coisas, que cerimônias religiosas importantes eram feitas no local. Eu amo este desenho retirado de seu livro, e fico imaginando como seria uma cerimônia religiosa entre as paredes de Pikillacta:     [1] McEwan, Gordon F. (2009). Pikillacta:. The Wari Empire in Cuzco (em inglês). [S.l.]: University of Iowa Press, p. 20. ISBN 9781587295966
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Os livros que mais gostei de ter lido em 2020
História, Literatura
Os livros que mais gostei de ter lido em 2020
31 de dezembro de 2020 at 15:16 0
  1. “Gengis Khan e a formação do mundo moderno”, de Jack Weatherford: provavelmente você não sabia que o grande imperador mongol (1158 – 1227) tinha uma mentalidade tão à frente do seu tempo.
  2. “Não me abandone jamais”, de Kazuo Ishiguro: poucos livros me perturbaram tanto.
  3. “O império de Hitler”, de Mark Mazower: sempre tive curiosidade de saber como os nazistas se comportavam como colonizadores, coisa que este livro monumental explica.
  4. “A destruição dos judeus europeus”, de Raul Hilberg: outro livro monumental, sobre o Holocausto neste caso.
  5. “O mapa e o território”, de Michel Houellebecq: fico mais feliz lendo uns autores do que outros, e Michel Houellebecq é um dos que me dão mais alegria na leitura.
  6. “Os testamentos”, de Margaret Atwood: continuação de “O conto da Aia”, não preciso explicar mais.
  7. “As luas de Júpiter”, de Alice Munro: tem gente que reclama do Prêmio Nobel de Literatura por causa disso e daquilo, mas eu provavelmente não conheceria autoras como esta canadense se não fosse a Academia Sueca.
  8. “A época da inocência”, de Edith Wharton: um amor mal resolvido e os preconceitos e costumes dos ricos americanos do final do século XIX e início do século XX numa obra-prima.
  9. “O dom”, de Vladimir Nabokov: Nabokov é Nabokov, e pronto.
  10. Deus, essa gostosa, de Rafael Campos Rocha: uma história em quadrinhos que comprova que God is a woman, como diz a Ariana Grande, uma favorita aqui da casa.
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“Gengis Khan e a formação do mundo moderno”, de Jack Weatherford
História
“Gengis Khan e a formação do mundo moderno”, de Jack Weatherford
25 de dezembro de 2020 at 22:11 2
O imperador mongol Gengis Khan (1158 – 1227) é comumente visto como um assassino violento e estuprador em série. A visão dada por “Gengis Khan e a formação do mundo moderno” (Bertrand Brasil, 460 páginas, tradução de Jorge Ritter, publicado originalmente em 2006), do historiador americano Jack Weatherford, não chega a negar essas suas características, mas mostra uma pessoa bastante diferente da ideia comum que se tem dele. O grande imperador, nascido com o nome de Temujin, teve uma infância difícil nas estepes mongóis - tendo sido inclusive rejeitado pelo próprio clã - e o caminho para se tornar o maior líder de seu povo foi árduo e marcado por muita violência. Tendo obtido o poder ele passou a comandar guerras de conquista – os mongóis, ainda no tempo da vida de Gengis Khan, passaram a dominar um território maior que o do Império Romano, indo da China a territórios eslavos. Quando os mongóis chegavam num território para conquistá-lo, muitas vezes davam a opção para os moradores locais para que se submetessem sem violência, caso em que teriam que lhes pagar alguns impostos, mas teriam a liberdade para viver como quisessem. Outro interesse dos mongóis era o comércio, e eles abriram rotas comerciais por todo o Oriente. Mas o mais fascinante – e inesperado, para quem só conhecia a má fama do imperador mongol - em suas conquistas eram os conceitos, praticamente inéditos na época, que Gengis Khan implantou no seu império: liberdade religiosa total, primado das leis sobre as pessoas – mesmo o próprio imperador -, e busca da eficiência: para este último objetivo, aliás, Gengis Khan buscava os melhores técnicos e especialistas entre todos os povos, não importando a origem étnica, para trabalhar em seu império. Depois da morte de Gengis Khan, seus sucessores começaram disputas pelo trono, mas o impacto de suas conquistas e de suas ideias permaneceu por séculos: não à toa, Jack Weatherford chama o grande imperador mongol de “o formador do mundo moderno”.
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“A destruição dos judeus europeus”, de Raul Hilberg
História
“A destruição dos judeus europeus”, de Raul Hilberg
13 de dezembro de 2020 at 16:10 0
Provavelmente a obra mais importante sobre o Holocausto, “A destruição dos judeus europeus”, do austríaco-americano Raul Hilberg, é um calhamaço cuja edição brasileira, da Amarilys Editora, tem 1664 páginas e cinco tradutores (Carolina Barcellos, Laura Folgueira, Luís Protasio, Mauricio Tamboni, Sonia Augusto). A primeira edição da obra é de 1961, mas ela teve várias atualizações até o início dos anos 2000 (o autor faleceu em 2007); o livro, que serviu inclusive como base para o monumental filme “Shoah”, de Claude Lanzmann (ver, inclusive, o comentário do cineasta na capa da edição da Amarilys Editora, que é a imagem que acompanha este texto), foi o trabalho de uma vida. Como o próprio Hilberg comenta na obra, quando da sua primeira edição, em 1961, o Holocausto era um assunto quase esquecido: no meio da Guerra Fria, Estados Unidos e União Soviética tinham outas preocupações mais imediatas e pouca vontade de melindrar a memória de suas aliadas, respectivamente as Alemanhas Ocidental e Oriental. O autor, inclusive, descreve como sua pesquisa sobre a destruição dos judeus europeus era vista com ceticismo quando da elaboração da obra. Enfim, os ventos mudaram e o Holocausto - também por causa deste monumental “A destruição dos judeus europeus” – é atualmente objeto de gigantesco interesse, tanto por parte dos pesquisadores quanto do público em geral. O livro, realmente, merece a fama que tem. Praticamente todo escrito com enfoque sobre os perpetradores alemães, “A destruição dos judeus europeus” mostra com um grande número de documentos como os nazistas foram destruindo suas vítimas aos poucos: a partir de leis racistas que lhe tiravam paulatinamente os seus direitos, os judeus iam se sentindo mais e mais oprimidos e humilhados e acabavam tendo pouca ou nenhuma força de reação. Este processo de destruição era sistemático e organizado. Nem todos os países ocupados ou aliados da Alemanha, por outro lado, tiveram o mesmo comportamento quanto à destruição de sua população judia, e o livro mostra com detalhes a atuação de cada uma dessas nações a este respeito. Mas, claro, o livro tem muito mais: descrição dos campos de extermínio, das Marchas da Morte, dos Einsatzgruppen (esquadrões móveis que assassinavam populações judias em países como a União Soviética e a Ucrânia), da burocracia envolvida no processo da destruição da população judia, da reação pífia e às vezes até revoltante dos países aliados contra o Holocausto durante a guerra. Enfim, o livro é de leitura dolorosa, mas fundamental para quem quer entender mais sobre a destruição dos judeus europeus durante a Segunda Guerra.
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