“Amanhã na batalha pensa em mim”, de Javier Marías
Literatura

“Amanhã na batalha pensa em mim”, de Javier Marías

9 de fevereiro de 2016 0

Tenho um problema antigo com o escritor espanhol Javier Marías. O primeiro livro dele que li, “Coração tão branco”, é um dos dez ou vinte melhores da minha vida: entre os muitos pontos altos desta excepcional história de mistério, contada com um profundo carinho pelos personagens, destaca-se a estranheza e a fascinação que Juan, o personagem principal, sente em relação às mulheres em geral – e em relação à sua mulher em particular. Foi, portanto, com a melhor das expectativas que comecei a ler a trilogia “Teu rosto amanhã”: infelizmente, as longas digressões desta história de espionagem me fizeram perder a coragem de continuar a leitura da série, e acabei parando no primeiro volume mesmo. De todo modo, o impacto de “Coração tão branco” foi tão forte que nunca me passou pela cabeça desistir do autor: o próximo romance de Javier Marías que li, “Travesía del horizonte”, é interessante, mas é obviamente um livro em que o autor – ainda com vinte e um anos – escreveu para treinar a técnica de escrita, tão influenciada por Joseph Conrad e Henry James é esta história de uma expedição marítima fictícia à Antártida ocorrida no final do século XIX.

Lá fui eu tentar de novo um livro de Javier Marías: desta vez o escolhido foi “Amanhã na batalha pensa em mim”, de 1994, considerado um de seus melhores romances. Logo no início do livro o leitor fica sabendo que o narrador do romance, o roteirista Victor Francés, foi até a casa de uma mulher casada, Marta Téllez, para fazer sexo com ela aproveitando a ausência do marido. Victor e Marta nunca tinham ido para a cama antes e, assim que ela deita com ele, começa a passar mal e morre. Como se a situação não estivesse dramática o suficiente, o filho único de Marta está dormindo no quarto ao lado sem nem ter ideia de que já tinha perdido a mãe. O drama de Victor, que não sabe se avisa o marido, se abandona ou não o menino, se tenta chamar alguma outra pessoa, é só o início de uma série de acontecimentos dramáticos que culminam num epílogo inesperado.

O fato é que “Amanhã na batalha pensa em mim” não é um livro de leitura fácil. O estilo do romance (que lembra vagamente o de José Saramago), com muitas repetições, digressões e longas frases entremeadas por vírgulas, exige bastante atenção por parte do leitor. Mas o esforço é plenamente recompensado: a profundidade psicológica e a intensidade dramática fazem de “Amanhã na batalha pensa em mim” uma obra-prima – quase do mesmo nível de “Coração tão branco”.

 

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