“Estilhaços: Minigâncias, Digressões e Batocaços”, de Marcelo Backes
Literatura

“Estilhaços: Minigâncias, Digressões e Batocaços”, de Marcelo Backes

21 de abril de 2015 0

Segundo o dicionário Houaiss, aforismo é um texto curto e sucinto, fundamento de um estilo fragmentário e assistemático na escrita filosófica, geralmente relacionado a uma reflexão de natureza prática ou moral. Este tipo de sentença, bastante utilizado por filósofos alemães como Nietzsche, é utilizado extensivamente no livro “Estilhaços: Minigâncias, Digressões e Batocaços”, do escritor, crítico literário gaúcho Marcelo Backes (Record, 173 páginas, R$ 28,90 em média). Outra forma bastante usada pelo autor é a da epigrama, que, segundo uma das definições do mesmo Houaiss, é uma composição poética, breve e satírica, que expressa, de forma incisiva, um pensamento ou um conceito malicioso. Backes quer que seus aforismos sejam “guerrilheiros na batalha da língua”, que provoquem “tumulto onde reina a calma”, e cavem “trincheiras no terreno das opiniões”. Já suas epigramas pretendem ser “bofetadas na forma de beijo” e “a lírica da cólera”. Como se pode ver, o escritor não está para brincadeira.

Quem são as principais vítimas da escrita corrosiva do autor? A sua enxaqueca: “a maldita enxaqueca é o lúcifer feito dor”. As religiões e a espiritualidade de modo geral: “escritores que acreditam mais no parentesco dos homens com os anjos do que com os macacos não deveriam tomar assento à mesa da literatura”. A situação do panorama literário nacional: “chamando a literatura brasileira às falas, fica claro que a inexistência de crítica e a falta de combatividade literária nos trópicos é até formal”. Os orientadores de sua tese de doutorado feita na Alemanha, sobre o escritor Heinrich Heine: “o brasileiro – o artista, o dançarino – jamais deve se esquecer de que o alemão – o cientista, o sedentário – é duro e inflexível, normativo e curvado à norma”. Seus desafetos literários: “espero que entendam por que jamais discuti publicamente com eles. Quem com esterco se mete…” Para os livros ruins (embora nenhum seja citado em seu livro) que sua atividade de crítico obriga a ler, Backes recomenda o seguinte: “Banheiro público! Vaso esmerdeado! Fazer pontaria! Mijar em cima! Acertar em cheio! Deixar tudo limpo! Serviço prestado! Sensação de alívio com a bexiga vazia! Puxar a descarga…”

Nem todos os aforismos e epigramas de Backes são assim tão agressivos. Há também aqueles que versam sobre diversos assuntos, como sexo, seus escritores preferidos, suas recordações. De todo o modo, o melhor de “Estilhaços” está em dois engraçados capítulos em forma de dicionário: um com as biografias corrosivas de pessoas de Anharetã, pequena cidade fictícia baseada naquela que o autor viveu na infância e adolescência, Paca Norte, e outro em que relaciona os termos futebolísticos utilizados no interior gaúcho.

(texto publicado no suplemento dominical do jornal O Estado Do Paraná em meados de 2006)

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