Dois livros sobre o nazismo
História

Dois livros sobre o nazismo

19 de agosto de 2018 0

Dois livros sobre o período nazista apresentam novas análises sobre aqueles anos de terror absoluto.

O que fez com que os alemães continuassem a lutar até maio de 1945, apesar de estar com a guerra basicamente perdida desde meados de 1944? Por que motivo as ordens autodestrutivas de Hitler continuavam a ser obedecidas? Que mecanismo de comando lhe permitiram determinar o destino da Alemanha quando já havia se tornado evidente que a guerra estava perdida e o país, irremediavelmente arrasado? Em que medida os alemães se dispunham a continuar apoiando Hitler até o fim, mesmo sabendo que ele levava o país à destruição?

Estas são as perguntas que o grande historiador inglês Ian Kershaw tenta responder em “O fim do Terceiro Reich – A destruição da Alemanha de Hitler, 1944-1945” (Companhia das Letras, 616 páginas). Na introdução do livro, o autor se revela surpreendido com o fato de que, apesar da monumental bibliografia existente sobre o período nazista, ninguém ainda tinha tentado, especificamente, tentar responder sobre os motivos de os alemães terem continuado a lutar uma guerra perdida.

Depois de ler este livro muito interessante, bem escrito e aterrorizante, é difícil chegar a uma resposta simples para a questão. Uma mistura de medo, por parte de muitos – qualquer sinal de fraqueza por parte dos alemães era punido com a morte –, e fanatismo, por parte de outros tantos, pode ser a melhor resposta.

Já “High Hitler – Como o uso de drogas pelo Führer e pelos nazistas ditou o ritmo do Terceiro Reich” (Crítica, 384 páginas) , do jornalista alemão Norman Ohler, mostra dois aspectos pouco analisados do regime nazista: o uso de drogas como arma de guerra por parte do exército alemão, e as substâncias que o médico particular de Hitler, Theo Morell, aplicava em seu paciente mais importante.

Norman Ohler mostra que, sob o nome comercial de “Pervitin”, a metanfetamina era utilizada de maneira extensiva pela população alemã, tanto civil quanto militar, e foi decisiva na campanha vitoriosa contra a França, já que a droga permite ao usuário ficar vários dias sem dormir – vantagem decisiva no tipo de guerra de tanques, a “blitzkrieg”, que o exército alemão criou.

O fato de o médico Theo Morell ter aplicado uma quantidade enorme de injeções em Hitler era conhecido dos historiadores há tempos. O diferencial do trabalho de Norman Ohler foi a análise minuciosa das notas do médico, que permitiram ao autor indicar que o ditador nazista usava regularmente metanfetamina e cocaína e que acabou provavelmente se viciando em Eukodal – basicamente, heroína em cápsulas. Esta descoberta do autor é uma boa justificativa para o comportamento instável e paranoico do ditador nazista na fase final de sua vida, bem descrito por outros historiadores.

Só o que não consegui entender foi a acusação de muitos críticos contra “High Hitler – Como o uso de drogas pelo Führer e pelos nazistas ditou o ritmo do Terceiro Reich”, como por exemplo a de Marcos Guterman no jornal O Estado de São Paulo de 5 de agosto de 2017, na qual ele defende que o maior dano colateral do livro é o fato de que ele “retira dos alemães em geral, e do regime nazista em particular, a responsabilidade por seus atos”. Não só Norman Ohler é cuidadoso quando comenta que as ideias de Hitler eram as mesmas estando ou não sóbrio, como o fato de muitos perpetradores de crimes nazistas terem usado drogas não deixa seus atos menos inomináveis.

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