“Leão-de-chácara”, de João Antônio
Literatura

“Leão-de-chácara”, de João Antônio

20 de março de 2016 0

Se há uma coisa que chama a atenção em “Leão-de-chácara” (Cosac Naify), de João Antônio (1937-1996), é a evolução da escrita do autor: a segunda parte, “Um conto da boca do lixo”, foi escrita em 1965, enquanto que a primeira, “Três contos do Rio”, quando da publicação do livro em 1975. A diferença de qualidade entre as duas partes é gritante.

Não que “Paulinho Perna Torta”, o único conto da segunda parte e que ocupa basicamente metade do livro, seja ruim: mas a história (baseada em fatos reais) do malandro que desde a infância difícil se envolveu com o crime – inicialmente com a exploração de prostitutas -, “evoluindo” até se tornar um dos grandes criminosos de São Paulo, não chega a chamar a atenção do leitor. As características principais das obras de João Antônio – o retrato de malandros, prostitutas e bandidos pobres das grandes cidades, utilizando tantas gírias locais que torna a leitura às vezes difícil – estão todos lá: mas a história se arrasta, os acontecimentos se sucedem meio que sem ir para lugar nenhum. Como retrato um período e um lugar (especificamente, a malandragem dos anos 50 no centro velho de São Paulo), “Paulinho Perna Torta” é muito interessante. Literariamente, porém, o conto envelheceu mal.

Já os três contos apresentados na seção “Três contos do Rio”, mais recentes, são bem melhores: têm vida própria fora do simples retrato de uma época. “Leão-de-chácara” conta a história de um homem, bom marido e bom pai, que trabalha como segurança em uma boate ao mesmo tempo em que é um “leão” – espécie de líder dentro malandragem carioca. “Joãozinho da Babilônia” conta a trágica história de um homem rico e importante que se apaixona por uma prostituta, Guiomar. Finalmente, o melhor conto do livro é “Três cunhadas – Natal 1960”, em que um marido vai visitar no Natal as três irmãs da mulher, solteiras e que vivem juntas. É uma daquelas obras-primas no estilo do conto “Missa do galo”, de Machado de Assis, onde o que importa realmente não é o que está sendo contado.

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