Ao contrário de muita gente, não sou saudosista quando o assunto é música. Você nunca vai me ouvir falar a famosa frase “boa mesmo era a música do meu tempo”, por exemplo.
Esta falta de apego ao que eu ouvia pouco tempo antes acaba, de maneira engraçada, me fazendo ser um sujeito meio irritante para os meus amigos que continuam ouvindo estilos que eu fui praticamente parando de ouvir com o tempo. É do jogo.
O legal de ser esse sujeito verdadeiramente infiel a estilos musicais é que, muito tempo depois de ter parado de ouvir alguma coisa, um belo dia me dá saudade e resolvo conferir o que já não escutava há anos – ou mesmo décadas. Um bom exemplo aconteceu ano passado, quando parecia que eu estava de novo nas minhas aulas no cursinho, na década de 80, quando coloquei para ouvir a coletânea “Standing on a beach”, do Cure.
Em outros casos a coisa vem bem mais forte, e é sobre um disco específico que comprei nos anos 80 que vou comentar aqui.
A primeira revista Bizz que comprei foi a de número 12, aquela famosa com a Patsy Kensit (que iria deixar a Madonna para trás, veja só) na capa. Enfim, nesta edição tinha uma crítica do grande José Augusto Lemos (sempre ele) falando maravilhas de “Psychocandy”, o primeiro disco de uma banda que eu nunca tinha ouvido falar, o Jesus and Mary Chain.
O texto (que coloquei
aqui para quem quiser ler; coloquei também
aqui uma entrevista da banda, com Pepe Escobar, publicada na mesma edição) começava com a sensacional frase “não é propriamente uma revolução e sim um exercício de radicalismo, que segue uma lógica safada de venenosa”, e continuava comentando que o melhor do pop feito até então tinha duas vertentes, a “melodiosa e assobiável” de um lado, e o “barulho afiado do rock pós-Velvet Underground” do outro. José Augusto Lemos então conclui que o “Jesus & Mary Chain, num caso de inédita esquizofrenia, opta simultaneamente pelas duas linhas e o resultado dá num bombom recheado de cereja e ácido sulfúrico” – e por aí vai o genial texto.
A crítica era tão maravilhosa que “Psychocandy” acabou sendo o primeiro dos muitos discos que comprei por causa da Bizz. O choque foi imediato e duradouro, e o álbum foi um dos que mais ouvi naqueles anos: a junção de melodias assobiáveis com uma microfonia maluca me pegou de jeito, na hora. Depois a banda lançou “Darklands”, sem barulho e só com a parte mais “sensível” da banda, e acabei perdendo o interesse no Jesus and Mary Chain.
Até que um tempinho atrás descobri, por um amigo, que se podia ler todas as revistas Bizz online (
aqui) e resolvi revisitar a crítica do “Psychocandy” - e acabei o escutando novamente o disco, com muita atenção. O álbum é tão bom - ou ainda melhor - do que me lembrava.
De todo modo, tenho medo agora do que vou achar de “Darkland” e dos discos posteriores da banda; quem sabe os escute ainda, um dia.
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