Dois romances
Literatura

Dois romances

23 de dezembro de 2018 0

Dois romances muito bons, duas boas dicas de leitura.

Desde muito cedo ouço falar que os romances de Machado de Assis anteriores a “Memórias póstumas de Brás Cubas” (1881) não são lá essas coisas. Qual não foi a minha surpresa quando li “A mão e a luva”, um tempo atrás, e percebi que o livro era tudo, menos ruim. Esta impressão foi reforçada com a leitura recente de “Helena” (Penguin-Companhia das Letras, 280 páginas), outro romance da fase “romântica” do autor.

Quando falece o Conselheiro Vale, seu testamento é aberto e a Helena do título aparece como sua herdeira natural: era desejo do falecido que ela, desconhecida de sua família, passasse a ter os mesmos direitos que Estácio, filho legítimo do conselheiro. Ela passa a morar, então, com ele – seu meio irmão – e sua tia, Ursula. A partir desta situação Machado de Assis cria uma história folhetinesca, cheia de reviravoltas, e que não perde o interesse em momento nenhum: o “Bruxo do Cosme Velho” simplesmente não conseguia escrever mal.

Já “Os vestígios do dia”, do britânico Kazuo Ishiguro, Prêmio Nobel de 2017 (Companhia das Letras, 285 páginas) conta a história de um mordomo inglês, Stevens, extremamente – e põe extremamente nisso – dedicado à sua profissão, inicialmente com Lord Darlington, um nobre da velha estirpe, e depois com Mr. Farraday, um rico e excêntrico americano, que comprou Darlington Hall, a mansão em que vivia o patrão anterior de Stevens.

Entre comentários sobre a vida de mordomo, e um relacionamento mal resolvido com a governanta Miss Kenton (vivida por Emma Thompson na versão cinematográfica do livro, dirigida por James Ivory e lançada em 1994, na qual Stevens foi interpretado por Anthony Hopkins), “Os vestígios do dia” impressiona pela maneira como Kazuo Ishiguro dá voz ao mordomo – o livro, contado em primeira pessoa, tem um estilo extremamente verossímil – e pelo modo como o leitor vai sendo conquistado aos poucos: bem como Camila Von Holdefer escreveu na Folha de São Paulo em 05/10/2017, “em Kazuo Ishiguro, tudo que é perturbação emerge devagar”.

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