“Pornô Chic”, de Hilda Hilst
Literatura

“Pornô Chic”, de Hilda Hilst

10 de novembro de 2015 0

A literatura pornográfica é considerada um gênero menor, já que a descrição de relações sexuais tende à repetição – não havendo grande espaço para a criatividade, portanto. Deste modo, foi um choque para seus admiradores quando Hilda Hilst (1930-2004), autora brasileira de grande prestígio, resolveu abandonar a literatura “séria” para se concentrar apenas na escrita de “grandes bandalheiras”. Ela estava cansada não do prestígio da crítica – ganhou vários prêmios –, mas da falta – persistente – de leitores.

A edição de “Pornô Chic”, da Biblioteca Azul, apresenta todas as “grandes bandalheiras” de Hilda Hilst: três novelas – “O caderno rosa de Lori Lamby”, “Contos d’escárnio” (ambos publicados em 1990) e “Cartas de um sedutor” (de 1991) –, uma pequena sequência de poemas chamada “Bufólicas” e um pequeno “fragmento pornogeriátrico rural”. A edição é caprichadíssima, com ilustrações de Millôr Fernandes, Jaguar, Laura Teixeira e Veridiana Scarpelli, e uma “fortuna crítica” com textos assinados por Humberto Werneck, Alcir Pécora, João Adolfo Hansen, Caio Fernando Abreu, Eliane Robert de Moraes e Jorge Coli. Primeiro time é pouco.

O melhor dos textos é o primeiro, “O caderno rosa de Lori Lamby”, que começa chocando com uma história de pedofilia (a narradora é uma menina de oito anos), mas que mesmo assim vale a pena chegar até o fim por causa das ilusões criadas pela autora. “Contos d’escárnio” conta basicamente as aventuras sexuais de Crasso e Clódia, uma pintora especializada em pintar vaginas. Os protagonistas de “Cartas de um sedutor” são um escritor falido que mora na rua e Eulália, sua companheira semianalfabeta.

Já na primeira novela, “O caderno rosa de Lori Lamby”, o estilo da obra pornográfica de Hilda Hilst já se apresenta de maneira embrionária, com histórias paralelas escritas pelos próprios protagonistas que se inserem na história principal de tal maneira que frequentemente confunde e irrita o leitor. Nas outras duas novelas este estilo caótico toma totalmente conta da narrativa, já que alguns relatos paralelos têm término tão abrupto que deixam a impressão de que poderiam ser mais bem desenvolvidos (fiquei especialmente irritado com o fim da história engraçada e incestuosa de Karl e sua irmã Cordélia).

Hilda Hilst dizia que gostava da sensação de liberdade que a literatura erótica lhe dava, e alguns dos textos da fortuna crítica de “Pornô Chic” (como o de Jorge Coli e, principalmente, o de Eliane Robert Moraes) elogiam bastante a liberdade literária da autora. Quanto a mim, apesar de ter me divertido com diversos trechos do livro, fico com o personagem que falou o seguinte para o protagonista (alter ego de Hilda Hilst?) de “Cartas de um sedutor”:

tu não tens fôlego, meu chapa, tudo acaba muito depressa, o personagem fica por aí vagando, não tem espessura, não é real.

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