O quarto vermelho – De tirar o fôlego
Literatura

O quarto vermelho – De tirar o fôlego

18 de outubro de 2015 0

No final de um dia bonito, com o serviço praticamente terminado, a médica psiquiatra Katherine Quinn (mais conhecida apenas como Kit) foi convidada pelo seu superior para ir até uma delegacia entrevistar Michael Doll, um vagabundo esquisito e suspeito de ter assassinado Lianne, uma jovem andarilha que não tinha nenhum parente conhecido. Na delegacia Doll sente-se acuado e corta o rosto da doutora, que fica com uma enorme cicatriz.

É assim que começa O quarto vermelho (Record, 446 páginas), thriller psicológico escrito por Nicci French, pseudônimo do casal de jornalistas britânicos Sean French e Nicci Gerard. A dupla já é autora de dez livros, entre eles Mata-me de prazer, que originou um filme homônimo estrelado por Heather Graham e Joseph Fiennes.

Após o início eletrizante, O quarto vermelho, que foi publicado originalmente em 2001 e é o quinto romance da dupla, continua com a Dra. Kit se recuperando no hospital e, depois, voltando ao batente no hospital. Apesar do trauma que ela possa ter ficado no confronto com o suspeito de assassinato, a polícia pede que a médica continue no caso. Ela então marca um encontro com Doll, que já havia sido liberado pela polícia, na casa dele. Além de morar próximo ao lugar em que a jovem assassinada Lianne foi encontrada, ele é suspeito porque uma policial conseguiu gravar uma fita com ele que tinha algo muito próximo de uma confissão.

O vagabundo é uma pessoa patética e repugnante: praticamente sem nenhuma higiene pessoal, ele usa roupas velhas e sujas e passa os dias em um canal pescando peixes que não vai comer, por causa da sujeira da água do local. O pequeno quarto em que Doll mora está sempre sujo e em desordem, cheio de objetos sem valor que ele pega nas ruas e coleciona. Para completar o triste quadro, o suspeito do assassinato da garota Lianne é carente, solitário, e chora com facilidade. Muito mais digno de pena do que de ódio, portanto.

Na conversa com ele, Kit acaba descobrindo que a sensual policial que obteve a confissão de Doll o fez lhe oferecendo favores sexuais. Resultado: mesmo com o vagabundo tendo feito uma enorme cicatriz na doutora, ela o defende e consegue que ele deixe de ser o principal suspeito do crime. Esta prova de ética e eficiência acaba fazendo com que o policial chefe da investigação chame a médica para participar ativamente do caso – o que ela faz com uma dedicação e uma obstinação enormes, de maneira muitas vezes pouco usual, procurando pistas aparentemente sem nenhuma relação com o caso (o que exaspera freqüentemente outros policiais envolvidos na investigação).

O próximo passo da Dra. Kit é relacionar o assassinato da garota Lianne com outro crime semelhante. Após descartar vários outros casos, a médica se concentra na trágica morte de Philippa Burton, assassinada enquanto cuidava da filha de três anos em um parque. Os policiais que a auxiliam não se conformam com o rumo da investigação da doutora: Lianne não tinha nada a ver com a outra morta. Phillipa era rica, tinha mais de trinta anos e era uma dona-de-casa responsável, enquanto que a jovem assassinada tinha pouquíssimos conhecidos e morava em abrigos. Além disso, as duas não foram mortas do mesmo modo, e seus ferimentos não eram semelhantes, ao contrário do que comumente acontece em casos de serial killers. O que havia de parecido nos dois casos, segundo a Dra. Kit? As duas foram encontradas de bruços. Parece pouco – e é pouco -, mas a intuição dela dizia que o assassinato de Lianne era relacionado com o de Philippa.

Com este rumo esquisito na investigação, obviamente a situação de Kit estava ficando insustentável perante os demais policiais, e ela quase foi obrigada a sair do caso… até ela conseguiu obter uma prova realmente forte do relacionamento dos dois crimes. O que acontece daqui por diante não vai ser contado aqui para não estragar a surpresa.

O quarto vermelho é um livro eletrizante, que não perde o pique em nenhuma e a história, cheia de reviravoltas, tem um enredo bem. Além disso, os locais e fatos são descritos com maestria: Nicci French consegue fazer com que o leitor praticamente “se sinta” nos locais obscuros – e às vezes sinistros – da Londres em que se passa a trama.

Em outras palavras, O quarto vermelho é um policial altamente recomendado, uma ótima pedida para quem quiser uma leitura inteligente e de tirar o fôlego.

(publicado no Suplemento dominical do jornal O Estado do Paraná, em 22 de outubro de 2006)

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