A esposa solitária, de Satyajit Ray
Cinema

A esposa solitária, de Satyajit Ray

23 de junho de 2015 0

Nas primeiras cenas de “A esposa solitária”, filme do grande diretor indiano Satyajit Ray, Charulata, a esposa (vivida pela linda Madhabi Mukherjee), anda solitária de lá para cá numa casa belíssima e enorme. Com um título deste, é natural que o espectador pense que logo vai aparecer no filme um marido cruel e desumano – o clichê usual neste caso. Pouco mais tarde, surge um rapaz meio amalucado (vivido pelo ótimo Soumitra Chatterjee) cantando uma música em homenagem à deusa Shiva. Qual seria o clichê esperado agora? A esposa solitária se apaixona pelo rapaz, que por sua vez é um terrível destruidor de lares e a faz sofrer horrivelmente.

Bem, nada disso acontece em “A esposa solitária”. O marido (vivido por Sailen Mukherjee) realmente deixa a esposa sozinha boa parte do tempo, mas é porque é um idealista e dedica um enorme esforço na edição de seu jornal político (que mais dá prejuízo que outra coisa). De todo modo, ele é carinhoso, atencioso e preocupado com a mulher – a ponto de convidar seu primo Amal (o rapaz amalucado lá de cima)  para passar uns tempos na casa do casal para ajudar a esposa em suas tentativas literárias. E ele – e aqui o filme foge novamente do clichê – não tem absolutamente nada de mau caráter. Finalmente, a paixão que Charulata acaba realmente sentindo pelo primo do marido é tratada com grande sensibilidade: Satyajit Ray não só evita os estereótipos, como não julga seus personagens.

Com atores altamente expressivos, uma história contada com sensibilidade fora do comum e uma belíssima fotografia em preto e branco, “A esposa solitária” é um belíssimo filme de amor  e relacionamento – no nível de alguns dos meus preferidos, como “Aurora”, de Murnau, “Atalante”, de Jean Vigo, ou “Viagem à Itália”, de Roberto Rossellini.

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