Andrucha Waddington

Anora e Vitória
Cinema
Anora e Vitória
6 de abril de 2025 at 16:57 0
Assim como a famosa personagem Berma, de Marcel Proust, Fernanda Montenegro, em “Central do Brasil” (Walter Salles, 1998) me impressionou por simplesmente não parecer uma atriz famosa no filme. Conforme eu tinha comentado aqui,
“(...) não havia nada de tão extraordinário naquela mulher pobre, aproveitadora, porém não de todo má. Neste ponto, em torno do meio do filme, é que entendi o segredo de Fernanda Montenegro: era como se ela fosse a própria Dora. Não havia a menor teatralidade em seus gestos, em seu falar, em seus modos. Até a sua maneira de sentar era a de uma mulher do povo. As características que muitas vezes são relacionadas a uma grande interpretação, como grandiloquência e dramaticidade, estavam completamente ausentes de sua interpretação minimalista e enormemente autêntica.”
A única cena que realmente me emocionou no recente (2024) e badalado “Ainda estou aqui”, também de Walter Salles, foi a cena final, em que Fernanda Montenegro interpreta a principal personagem do filme, Eunice Paiva, já senil. Só quem já conviveu com alguém naquela condição tem ideia do que a nossa maior atriz fez naqueles poucos minutos. Em “Vitória”, de Andrucha Waddington (110 minutos), baseado num fato real, Fernanda Montenegro faz o papel de Joana Zeferino da Paz, uma senhora solitária e idosa que filmava os crimes do tráfico que ocorriam diante de sua janela em Copacabana, na Ladeira dos Tabajaras. Suas filmagens renderam prisão de aproximadamente 30 pessoas, incluindo traficantes e policiais militares envolvidos em corrupção. No filme Fernanda Montenegro demorou para me impressionar, assim como em “Central do Brasil”. No começo de “Vitória”, ela me pareceu a atriz de sempre, conhecida da televisão, meio grandiloquente e teatral. À medida que o filme transcorria, fui percebendo que ninguém mais poderia ter a grandeza de contar esta história impressionante: a nossa maior atriz consegue nos transportar para a vida da sra. Joana como se ela fosse a própria Joana. Espetacular. *** “Anora”, o grande vencedor do Oscar de 2025, dirigido por Sean Baker (139 minutos), conta a história de uma stripper de origem russa, Ani, que vive em Nova Iorque e se apaixona pelo filho de um milionário também russo, Ivan "Vanya" Zakharov (vivido por Mark Eydelshteyn). Depois de alguns dias de muito sexo, diversão com os amigos, bebida e drogas, ele pede a stripper em casamento. Os pais dele são contra a união, o que causa uma confusão que se pode imaginar: perseguições, guarda-costas, choro e violência. De todo modo, como bem lembrou André Barcinski em seu vídeo sobre o filme, todos os personagens de “Anora” são interessantes, e nenhum é puramente bom nem puramente mau. Além disso, o filme tem comédia, drama e ação numa proporção bem equilibrada, o que torna o filme merecedor de todos os prêmios que conquistou. O título de “Anora” é incrivelmente semelhante ao de “Vitória”, mas não dá para contar aqui para não estragar as duas surpresas. Além disso, os dois filmes têm como grande destaque a atuação das suas atrizes principais – Fernanda Montenegro, citada acima, e Mikey Madison, que faz a stripper Ani de maneira intensa e verdadeira. Apesar de eu mesmo ter torcido para Fernanda Torres, filha de Fernanda Montenegro, para vencer o Oscar de 2025 por sua atuação de “Ainda estou aqui”, sou obrigado a reconhecer que Mikey Madison mereceu plenamente seu prêmio de melhor atriz na cerimônia. (Foto que acompanha o texto obtida no site Planeta Nerd. Quem estiver interessado em receber meus textos semanalmente clique aqui e cadastre seu e-mail.)
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