O Gueto de Varsóvia
História

O Gueto de Varsóvia

12 de abril de 2016 0

O Gueto de Varsóvia foi um dos episódios mais tristemente célebres do Holocausto: não só porque representou a eliminação de um número muito grande de pessoas, como também pela inédita resistência judaica contra os opressores nazistas.

Em fins de outono de 1940, todos os judeus de Varsóvia, na Polônia (cerca de 30% da população da cidade, o que representava cerca de 445.000 pessoas) foram amontoados em um bairro (o gueto) de cerca de 4 km2. Este gueto foi então todo envolvido por muros, e em cima deles foram colocados arame farpado e vidro partido. A cada série de tentativas de fuga, aumentava-se a altura do muro, às expensas dos judeus, obviamente. A densidade demográfica dentro do gueto era de mais de 78 mil pessoas por quilômetro quadrado. Nos apartamentos se amontoavam em média 15 pessoas por apartamento e nove pessoas por quarto. Aquecimento, água e esgotos eram catastroficamente inadequados.

A intolerável superpopulação do gueto, somada com as insalubres condições de higiene, era, por si só, capaz de causar doenças. Além disso os judeus eram vítimas de uma política de fome planejada: proibidos de deixar o gueto sob pena de serem atirados, os judeus não tinham outra ocupação a não ser trabalhar, no gueto, para algumas fábricas de armamentos ou para gananciosos industriais alemães que sabiam como conseguir grandes lucros servindo-se de mão-de-obra escrava. Aos desempregados (a grande maioria da população) era servido por dia, quando servido, uma ração que correspondia a cerca de 15% das necessidades calóricas humanas. Ocorreram então as previsíveis e esperadas conseqüências desta política. Os habitantes do gueto rapidamente atingiram um estado de subnutrição – era assombroso o índice de mortalidade: entre maio de 1941 e maio de 1942 morriam cerca de 4650 judeus mensalmente, ou seja, 1% da população ao mês, 12% da população ao ano.

Mesmo com toda esta política de eliminação da sua população, os judeus não estavam morrendo na velocidade que o chefe das SS, Heinrich Himmler, gostaria (muitas vezes a morte era retardada pelos alimentos vindos por contrabando). Deste modo ele promoveu uma grande operação de extermínio por câmara de gás – entre 22 de julho e 3 de outubro 310.322 judeus foram enviados para campos de morte, principalmente Treblinka.

Mas três meses depois, em janeiro de 1943, Himmler fez uma visita de surpresa a Varsóvia, descobriu que ainda 60.000 judeus ainda viviam no Gueto de Varsóvia (a área do gueto já tinha sido reduzida, pelos alemães, a uma área de 900 x 270 metros) e ficou furioso. Exigiu então o extermínio dos judeus sobreviventes até o dia 15 do mês seguinte (fevereiro). Isto não foi possível, graças ao rigoroso inverno, às necessidades do exército na frente russa (que exigia prioridade nos transportes) e à crescente resistência dos judeus, que foram se organizando à medida que o tempo passava (já que os alemães pouco se importavam com o que acontecia dentro do gueto): assim, adegas e galerias subterrâneas foram se transformando em pontos fortificados, e uma certa hierarquia militar foi sendo criada – mesmo algumas armas, inclusive duas metralhadoras, foram obtidas por contrabando.

Finalmente, em 19 de abril de 1943 o general Stroop, das S.S., voltou seus tanques, sua artilharia e seus lança-chamas contra o gueto: era o início da “operação especial de recolonização”, eufemismo utilizado para se referir à eliminação do gueto e da população nele residente. Esta operação estava prevista para durar três dias. Durou quatro semanas. Foi a única vez na história do Terceiro Reich que os judeus pegaram em armas para resistir a seus opressores nazistas. Embora ninguém tivesse dúvidas quanto ao resultado final do embate, o que se viu foi uma luta selvagem.

Quando os alemães entraram no gueto foram recebidos por fogo cerrado e bateram em retirada. Eles então tornaram a atacar, mas continuaram a encontar fortíssima resistência (segundo o relatório de Snoop, os alemães sofreram 12 baixas no primeiro dia de combate). A situação dos dias seguintes continuou a mesma: os defensores, fracamente armados, cediam terreno ante ao ataque dos tanques, lança-chamas e artilharia, mas mantinham viva a resistência. No quinto dia Himmler, impaciente e furioso, ordenou a Stroop que “varresse o gueto” com “maior dureza e implacável tenacidade”. Para atingir este objetivo, Stroop decidiu incendiar todas as edificações do gueto (a este respeito, ele escreveu em seu relatório que “vários […] blocos de casas foram reduzidos a cinzas. É este, finalmente, o único método que força este lixo e gente sub-humana a vir para a superfície”). Mesmo assim, os judeus resistiam e se escondiam – em galerias, em redes de esgoto, onde fosse possível – de maneira tã acirrada que Stroop se queixou dos “diabólicos métodos de luta e das artimanhas que os judeus empregavam” em sua defesa. O general Stroop também não compreendia por que muitos judeus preferiam morrer se lançando nas chamas do que morrer tranqüilamente nas câmaras de gás do campo de extermínio de Treblinka.

Mas a disparidade de forças era tão grande que finalmente, a 16 de maio de 1943, Stroop, satisfeito, enviou seu relatório final: “já não existe mais o bairro judaico de Varsóvia” (condenado à morte depois do final da guerra, Stroop foi executado no gueto de Varsóvia em 1951).

Segundo o alucinado ideário nazista, os judeus eram seres maus por natureza e com grande poder para prejudicar os alemães: Goebbels, o ministro da propaganda nazista, comentou que a resistência impressionante demonstrada no Gueto de Varsóvia foi uma amostra do que se pode esperar dos judeus quando estes têm armas nas mãos.

(Texto escrito em 2001)

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