Se em outros estilos tem gente que diz que a música acabou, e tal, o metal extremo vai muito bem obrigado. Alguns lançamentos dos últimos meses são uma prova viva disso.
A banda francesa Alcest tem atualmente um único membro, Neige – e mais alguns de estúdio ou ao vivo. O grupo começou com o estilo de raw black metal, mas depois da saída dos outros membros iniciais, Neige (neve, em francês) passou a misturar o estilo original com o shoegaze. “Écailles de lune”, o segundo álbum de estúdio da banda (e tão bom quanto o primeiro, “Souvenirs d’um autre monde”), é uma incrível mistura destes dois tipos de som: o Alcest passa do black metal para o estilo de bandas como My Bloody Valentine, Ride e Lush de maneira surpreendentemente suave: por incrível que pareça, faz todo o sentido do mundo. E é lindo de se ouvir.
Varg Vikernes é mau caráter, nazista, matou o vocalista do Mayhem, colocou fogo em igrejas, e esteve preso até há pouco tempo. Depois de exposta a ficha corrida do camarada, é preciso dizer que qualquer fã de black metal reconhece que a banda dele, o Burzum (da qual ele é o único membro), é de fundamental importância para o estilo. Quase todas as bandas de black metal que eu costumo escutar têm influência do tipo de som que ele praticamente inventou: uma mistura de vocal distorcido, assustador e insano, com uma bateria rápida e aguda, e melodias surpreendentemente belas e pungentes. Varg Vikernes é tão bom melodista que os discos instrumentais que ele lançou enquanto esteve preso (“Dauði Baldrs” e “Hliðskjálf”) são compostos de delicadas melodias feitas no teclado. Depois da saída de Vikernes da prisão, em 2009, o Burzum já lançou dois álbuns de black metal, “Belus” (de 2010) e “Fallen” (2011). Nenhum dos dois chega aos pés das obras-primas da banda, “Hvis Lyset Tar Oss” e, principalmente, “Filosofem” – mas têm momentos fenomenais. Obrigatório para fãs de música pesada.
Escolhido como o melhor disco de 2010 pelo excelente site Chronicles of chaos, “Marrow of the Spirit”, da banda americana Agalloch, é um assombro. Com um estilo “Atmospheric Folk/Dark Metal”, segundo o Encyclopaedia Metallum, o disco é uma extraordinária sucessão de climas e estilos, da música clássica (o álbum começa com um lindo solo de violoncelo) ao black metal mais agressivo, passando por longos temas ambient, líricos e criativos. Não acho que tenha sido o melhor disco do ano passado, mas é excelente mesmo assim.
Quem sabe o melhor disco de metal de 2010 seja mesmo “Paracletus”, da banda de black metal francesa Deathspell Omega. Os membros da banda não costumam aparecer em fotos, e nem fazer shows (o Burzum, aliás, também não faz). No inicio, o Deathspell Omega era uma banda de raw black metal normal, agressiva e com um som pouco diferente do que se espera do estilo. A partir do álbum “Si Monumentum Requires, Circumspice”, de 2004, porém, a coisa foi se modificando. A banda se sofisticou aos poucos, fazendo faixas com espetaculares mudanças de andamento – e o Deathspell Omega foi ficando cada vez mais pesado e assustador. O ápice dessa evolução da banda, acredito, seja mesmo este “Paracletus”, um disco espetacular em todos os momentos. Se em alguns dos álbuns “sofisticados” do Deathspell Omega a banda parecia perder a mão em alguns momentos, em “Paracletus” isto não acontece em um instante sequer.
Sempre que escuto as longas, pesadas, relativamente lentas e sofisticadas músicas da espetacular banda de black metal ucraniana Drudkh, imagino um homem sofrido e revoltado contra a força cruel do destino. Ou algo do gênero. O lançamento mais recente desta banda – também sem fotos e sem shows – chama-se “Handful of stars”, e tem um som mais limpo e mais seco que as obras-primas do grupo, “Blood in our wells” e “The swan road”. Mas todo o drama está lá. Não tem como perder.
Já a praia da banda holandesa God Dethroned, em “Under the sign of iron cross”, é outra. O som pode ser chamado de death/black metal, já que o baixo, o vocal e a guitarra são pesados e graves como uma banda de death. E o ritmo da bateria é veloz e preciso como o de uma banda de black metal. As letras falam de guerra, especialmente da Primeira Guerra Mundial, e o som parece mesmo emular toda a intensidade de um combate violento.
O melhor fica para o final: “Black masses”, da inglesa Electric Wizard, já comentada aqui. Pode não ser tão bom quanto “Witchcult Today” ou “Dopethrone”, mas quem se importa? O que importa é ouvir faixas pesadas e divertidas como “Patterns of evil”, “Turn of your mind” e “Scorpio curse”.
(publicado no blog do Mondo Bacana em 11 de fevereiro de 2011)
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