Fabricio Muller
24 de novembro de 2024 at 18:11
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Criada em 1961 por René Goscinny e Albert Uderzo, a série de livros de história em quadrinhos Asterix faz, até hoje, um imenso sucesso no mundo inteiro: além das HQs (traduzidas em mais de 100 idiomas e que já venderam mais de 120 milhões de exemplares) e filmes (de desenho animado e "normais"), até um parque temático nos moldes da Disneyworld foi construído nas imediações de Paris. As histórias da pequena aldeia gaulesa (a Gália se situava onde atualmente é a França) que resiste à dominação romana, pouco antes do início da Era Cristã, graças à poção mágica criada pelo druida Panoramix - que dá uma força sobrenatural a seus habitantes - continua fascinando crianças, jovens e adultos pelo mundo todo. Entre as maiores qualidades das histórias do baixinho e corajoso Asterix podem ser citados: o brilhante traço de Uderzo (que nitidamente foi melhorando a cada nova história criada, até se estabelecer em sua plenitude por volta do episódio "Asterix entre os bretões", lançado em 1966); a esperteza e a inteligência do personagem principal; o conseqüente contraste com a obtusidade de seu melhor amigo Obelix (que caiu num caldeirão da poção mágica quando criança e que, por isto, conquistou uma força sobre-humana para o resto da vida); a sabedoria do druida; os engraçados personagens Abracurcix (o chefe da aldeia), Chatotorix (um bardo que canta insuportavelmente mal) e Ordenalfabetix (o vendedor de peixes que vive se pegando com o ferreiro Automatix) - e não se pode esquecer do charme adicional de histórias em que os não-poderosos (os gauleses, neste caso) sempre vencem os poderosos (aqui, os romanos). Mas sem dúvida nenhuma a qualidade que é a maior responsável pelo imenso sucesso de Asterix são os brilhantes roteiros assinados por René Goscinny, falecido em 1977 - e a morte deste foi uma perda insuperável para a qualidade das histórias do baixinho gaulês, o que se pode comprovar lendo "O dia em que o céu caiu”, HQ recentemente publicada lá fora e também por aqui (Record, 49 páginas). Quem assina o roteiro, como tem feito desde a morte de seu colega, é o desenhista da dupla, Albert Uderzo.
A história conta a chegada de duas naves extraterrenas na aldeia gaulesa, uma dos walneydistianos, da estrela Walneydist, que são mais bonzinhos; a outra nave é dos nagmas, seres ambiciosos e sem escrúpulos vindos do planeta Gnama que querem conquistar o universo todo. O que estas duas expedições, de planetas rivais, querem na aldeia dos irredutíveis gauleses? Saber o segredo de sua força, claro, que já conquistou fama muito além do nosso planeta. E, a partir deste mote, muita coisa acontece na aldeia: luta de naves, vôos, desaparecimentos, toda a sorte de acontecimentos fantásticos.
Não que "O dia em que o céu caiu” seja ruim, não mesmo. A HQ tem brigas memoráveis entre Ordenalfabetix e Automatix, os "efeitos espaciais" são bem bolados - sem contar que é sempre um prazer ver o pessoal da aldeia em ação. Mas quando comparamos esta história bobinha com as brilhantes HQs com roteiro de Goscinny, como por exemplo a fábula sobre a luta entre a razão e a superstição rasteira “Asterix e o adivinho”, a profundamente melancólica “Asterix e o caldeirão”, o estudo sobre a ambição humana “Asterix e o domínio dos deuses” ou o enorme deboche sobre os dominadores de todos os tempos que é “Asterix e os louros de César”, ficamos pensando se realmente Asterix e Obelix mereciam este final de carreira tão melancólico.
(texto publicado no suplemento dominical do jornal "O Estado do Paraná" em 2006)
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