Trecho do meu livro “Memórias”
Impressões

Trecho do meu livro “Memórias”

2 de setembro de 2018 0

IX

Abre-fecha é um tipo de origami usado pelas crianças para brincar. É um negócio complexo que, quando manipulado, têm abertos alternadamente quatro compartimentos – cada um deles ocultando uma diferente possibilidade. De modo que são oito repartições no total, e a criança que está mexendo na geringonça vai abrindo o brinquedo e a outra escolhe uma das oito possibilidades ocultas. Podem ser frutas, números, animais, plantas.

O garoto se chamava Paulo e, depois das férias, trouxe vários abre-fechas para os amigos. Perguntei onde estava o meu. “Para você não tem”, me respondeu Paulo, na maior desfaçatez. Aposto que ficou até indignado com a minha pergunta.

Eu detestava ir para aula. Aquelas horas todas eram uma agonia sem fim. Nada do que os professores falavam me interessava, tudo era chato, tudo era desinteressante. As férias começavam, normalmente, em dezembro, e terminavam no final de fevereiro. A minha depressão começava no início de fevereiro e ia aumentando até o final do mês – quando então a tristeza chegava ao máximo na minha pobre cabeça de estudante. Eu detestava tanto ir para aula que todos os domingos ficava deprimido, e o início do Fantástico era um momento de tristeza profunda. Quando eu ia para cama, finalmente, sofria horrivelmente com o pesado silêncio que desabava lá em casa. Ouvia um e outro carro fazendo pega nas proximidades, e a lembrança do som do carro andando velozmente numa cidade vazia me dá tristeza até hoje.

Custava me trazer um abre-fecha para minorar minha dor, Paulo?

(link da foto: http://www.adrianasuzuki.com.br)

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