“A Obscena Senhora D”, de Hilda Hilst
Literatura

“A Obscena Senhora D”, de Hilda Hilst

7 de maio de 2017 0

Quando conversava com o crítico teatral Anatol Rosenfeld por que seus livros eram um sucesso de crítica, mas um fracasso de público, Hilda Hilst (1930-2004) comentava frequentemente: “por que acham que escrevo para eruditos? Eu falo tão claro. Falo até sobre a bunda”. “Tua bunda é terrivelmente intelectual, Hilda”, respondia Rosenfeld. Esta história, contada na Folha de São Paulo de 20 de abril de 2013, resume bem a impressão inicial e o resultado da leitura de um romance como “A Obscena Senhora D” (Coleção Grandes Nomes da Literatura, da Folha de São Paulo, 54 páginas).

O título, obviamente, parece o de um livro pornográfico – não só pelo termo “obscena”, como pelo fato de a “Senhora D” ser chamada apenas pela letra inicial, como era costume em algumas obras eróticas (“A História de O”, por exemplo).

O livro tem basicamente três personagens: Hillé (a própria Senhora D), seu marido e o pai dela. Logo no início Ehud, o esposo, falece, e boa parte do livro conta as lembranças da Senhora D; outra parte significativa mostra as conversas de Hillé com o seu pai. Hilda Hilst mostra sua personagem como desequilibrada: ficava no vão da escada dias seguidos, se fechava em casa ou aparecia despenteada e com cara de maluca para os vizinhos, falava sozinha, era obcecada por seus pensamentos.

O que escrevi acima é apenas uma tentativa previamente fadada ao fracasso de resumir o romance. O que importa em “A Obscena Senhora D” (publicado originalmente em 1982) é o fluxo de consciência e as conversas e os pensamentos jogados aparentemente sem nenhuma organização – a pontuação é frequentemente desrespeitada, com frases começando com letras minúsculas e sem ponto final. No meio do palavrório aparentemente caótico, o leitor vai captando ideias e sensações sobre sexo, amor, mal-estar físico, nojo, afetos – e no final de tudo a Senhora D tenta achar Deus.

Com linguagem frequentemente próxima da poesia, “A Obscena Senhora D” é um livro impressionante, difícil, mas não chato. Apesar de ser praticamente impossível entender todos os detalhes do que Hilda Hilst colocou em sua obra, concordo plenamente com Cássio Starling Carlos quando escreveu, na contracapa do romance, que, quando o livro acaba, “dá vontade de recomeçar para sentir tudo de novo”.

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