Belfort Duarte, Couto Pereira
Impressões, Literatura

Belfort Duarte, Couto Pereira

26 de abril de 2016 0

I – Belfort Duarte

O braço do pai era forte, e o pai, imenso.
Mas não havia apenas isto: todos se levantavam em momentos inesperados, berravam e gritavam – não que o menino entendesse algo do que estava se passando, mas tudo era tão impressionante.

Havia as cores, também. Aquele azul claro, de um dos times. O menino adorava quando aquele lindo azul brilhava com a luz do sol. Havia camisas vermelhas, também. As cores, as luzes, os reflexos: esta era, provavelmente, a parte mais bonita do jogo de futebol.

O placar era estranhíssimo: uma placa enorme com letras e números.

E, claro, a mão do pai, que pegava no antebraço do garoto e o puxava: o menino tinha que correr para acompanhar seus passos. E o pai às vezes saía do jogo furioso – às vezes não.

O menino olhava para tudo, com olhos arregalados, assustados e fascinados.

II – Couto Pereira

Centenas de escanteios, faltas, laterais, pênaltis e gols depois, aquele que era menino já é um senhor, e continua indo ao estádio como sempre fizera.

Em certos momentos dos jogos, agora, ele se levanta junto com o restante do estádio, berra e grita.

Ele já sabe qual o time é aquele que tem um azul celeste tão lindo. Quanto àquela equipe de vermelho, esta nem existe mais: fundiu-se com outra e agora o seu uniforme contém, também, um azul escuro – e o conjunto ficou feio, é preciso que se diga.

A placa – que ao menino parecia gigantesca – representando o placar saiu para dar lugar a uma enorme arquibancada em três pisos. E o novo placar é eletrônico, pequeno e insignificante.

O seu pai continua, às vezes, saindo furioso do estádio, mas não pega mais na sua mão. Pai e filho, agora, chegam separados ao estádio, assistem aos jogos juntos e depois voltam para casa – cada um para o seu lado.

E, o que antes não acontecia, o nosso personagem vibra com as vitórias e sofre com as derrotas – se bem que isto não importa muito: aquele senhor sabe perfeitamente que continua indo ao estádio porque, lá, o menino assustado, de alguma maneira, renasce e continua olhando para tudo com o mesmo olhar fascinado e deslumbrado.
(texto escrito em 2006)

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