Drudkh e Hate Forest: traduções de textos (feitas em 2006)
Música, Traduções

Drudkh e Hate Forest: traduções de textos (feitas em 2006)

28 de junho de 2015 0

Roman Saenko é um ucraniano responsável por duas das minhas bandas de metal extremo preferidas: Drudkh e Hate Forest. É difícil achar qualquer coisa sobre ele na internet – mesmo fotos são raríssimas.

Para matar minha própria curiosidade a respeito do assunto, traduzi os dois textos abaixo sobre suas bandas, obtidos no site francês Metalorgie.

HATE FOREST

Texto em francês original obtido aqui (a página foi atualizada desde a tradução).

Não é fácil achar informações sobre o Hate Forest. Em uma época em que tudo se acelera, onde a internet tomou um lugar incontestável no mundo da música, a banda não tem site, praticamente não existem artigos a seu respeito, e praticamente não tem fotos. Para falar a verdade, apenas a Supernal Music, atual gravadora do grupo, tem um resumo sucinto que podemos encontrar em diferentes sites. Resta então a paciência, a coleta de informações, obtidas daqui e dali em fóruns, blogs e por amadores.

Este mistério é obviamente uma vontade do pai do Hate Forest, Roman Saenko, que cultiva o mistério e a ambivalência em torno de seus diferentes projetos, principalmente daqueles os quais ele é o cabeça: Drudkh e Hate Forest. Enquanto que o Drudkh parece ser a face poética e quase exaltada de Saenko, o  Hate Forest  é, ao contrário, sua besta selvagem, que utiliza a forma do black metal, uma arma execrável e sádica sacrificada à sua causa. A discografia do grupo é uma fogueira de ódio inacreditável e seus temas perpassam assuntos como elitismo humano (para não dizer racial) ou ainda a ideologia nietzscheana: a procura do ódio supremo parte de boas bases. Entretanto, Saenko evoca estes temas de maneira sutil, para deixar seu projeto um tanto ambíguo. Afiliado, por observadores, ao movimento nacional socialista, que é presente em numerosos grupos de black metal do leste da Europa, o Hate Forest jamais afirma explicitamente a adesão a este tipo de ideologia, o que faz dele um grupo “à parte”.

Criada na Ucrânia, a imunda criação de um louco começa a juntar seus pedaços em 1995. Depois se seguiram um bom número de EPs, álbuns, míni best-ofs entre os quais se destacam, notadamente, Scynthia (1999), The Most Ancient One (2001) e Purity (2003), verdadeiramente representativos dentro do conjunto da obra muito compacta do grupo – que, aliás, não conhece uma evolução real, mas sim caminha em uma fonte inesgotável de inspiração raw black, em que apenas o mal parece dominar o que sai dali. Citemos, entretanto, Battlefields (2003), experimentaçãoo realmente à parte do grupo, onde cantos folclóricos ucranianos servem a um desespero de um black/doom de fundo quase pagão, mas sempre cheio de ódio. Este disco continua, até hoje, como a única fonte de diversidade na discografia de Hate Forest. E é em 2005, com Sorrow, que o grupo parece ter entregado a alma. Com efeito, numerosos boatos correram a Europa dizendo que este seria seu último álbum. O grupo terá sido, entretanto, um dos pontas de lança deste movimento black metal vindo dos países da ex-União Soviética, e continua como exemplo em matéria de sucesso (relativo, é claro) adquirido graças ao boca a boca.

Deixando de lado Battlefields, a descoberta de um disco do Hate Forest sempre tem os mesmos efeitos em algum inadvertido. Para além das horrorosas caixas de cds mostrando florestas, muitas vezes com neve, em um estado de devastação avançado, musicalmente falando a primeira audição dá sempre a impressão de um maciço de ódio totalmente intragável e de uma linearidade gigantesca, que faz o ouvinte querer abandonar rapidamente este suplício. Este efeito diminui, obviamente, à medida que se avança na obra do grupo, com a condição de que se persevere e que se ache interesse nesta música – o que não é a vontade de todo o mundo, concordo. Mas Roman Saenko não está nem aí, certamente, se vai agradar ou não. Ele quer apenas espalhar no mundo a maior quantidade de ódio possível, seu desgosto pela raça humana via ideologias discutíveis, mas que combinam perfeitamente com a obra. Pouco importa, além disso, que alguém adira: o que se procura em Hate Forest é o ódio. Um ódio pútrido e vicioso, universal, inclusive contra você mesmo, que o deixará forte, mas que o destruirá selvagemente.

Sorrow não foge à regra, embora tenha uma produção bem melhor do que os anteriores. Com boatos que dizem que é o último álbum do grupo (de todo o modo, depois de 10 anos espalhando ódio), ele não, entretanto, muda o registro. Nós estamos ainda diante de um raw black de incrível intensidade. Do início ao fim, o disco não concede absolutamente nada. A bateria e seu som dos pratos sempre particular (que sempre me faz pensar em uma marreta que martela inexoravelmente as pedras de uma mina profunda na Ucrânia) batem sempre em um ritmo infernal, sem interrupções. Os riffs são sempre imponentes e frios, e suas melodias com a mesma inspiração dissonante, raras no black metal, algumas vezes colocadas em destaque por elementos ambientes discretos. Para mim, estas melodias oferecem uma das evoluções identificáveis (com dificuldade, é verdade) em Sorrow: mais alegres (Fullmoon), mais constantes igualmente em suas evoluçõees, elas permitem ao ouvinte, uma vez que se completou a sua assimilação, de ficar quase sem fôlego do início ao fim das musicas, quase em estado de sublimação. Tenha cuidado, entretanto, mais uma vez: Hate Forest não tem nenhuma intenção de te trazer sentimentos magníficos; ao contrário, a banda quer que você encare os seus sentimentos mais vis, mais mesquinhos – e isto bem mais que em qualquer outro grupo de black metal, te destruindo lentamente, até que você se sinta totalmente submisso a Saenko, que te ataca com sua crueldade desumana sem avisar, com seu grunhido impiedoso, sempre próximo das fronteiras do death metal.

Sorrow praticamente não muda sua receita, e desde o início de sua carreira o Hate Forest a utiliza, e deveríamos começar a nos cansar dela. Entretanto, isto não acontece. O grupo sempre teve este lado atraente, quase celeste, que nos leva a escutar o disco de novo e de novo, até que possamos discernir suas entranhas e sentir plenamente todo este ódio, mais intensa depois de um tempo do que quando a escutamos pela primeira vez.

Mesmo com o Hate Forest utilizando desde sempre os clichês que deram forma ao black metal, ele faz isso maravilhosamente, indo até a sua essência e juntando uma personalidade incrivelmente rara para o estilo. Atenção, Sorrow é dirigido sobretudo a um público prevenido, tanto em relação às letras (que, estejamos de acordo, têm relação apenas com o seu autor) quanto à sonoridade. Mas se você precisar de um elixir de desgosto, você vai encontrar um dos grupos melhores grupos do mundo para este fim.

 

DRUDKH

Texto em francês original obtido aqui (a página foi atualizada desde a tradução).

O Drudkh nasceu em 2002 das mãos do frontman do grupo ucraniano Hate Forest. Trabalhando num estilo black metal raivoso e odioso no seu primeiro projeto, Roman Saenko necessitou explorar a face mais doce e melancólica de sua criatividade. Cantando os elogios ao nacionalismo ucraniano e ariano, como um bom número de grupos na Europa do Leste, o Drudkh é considerado um grupo de ideias entrevadas, mas é fundamental considerá-las dentro do contexto cultural da nação, e reter apenas o aspecto artístico da obra lançada por Saenko.

Forgotten Legends, o primeiro álbum do grupo, foi gravado rapidamente depois da formação do grupo, que foi criado apenas para ser um projeto de estádio. O estilo é um black metal atmosférico e suicida, comparável a atmosferas do Burzum no melhor de sua forma, mas com uma pegada totalmente eslava, uma vontade melódica fortíssima e, sobretudo, uma melancolia incomparável.

Em 2004 é lançado Autumn Aurora, que utiliza a mesma receita de seu antecessor, com muito mais maturidade, contudo, e até, radicalização nas emoções e melodias. Considerada, desde então, como constituída de duas obras-primas, a discografia do Drudkh, contudo, decepcionou muita gente com The Swan Road (2005), caindo um pouco na qualidade mas, ao mesmo tempo, prefigurando as mudanças encontradas em Blood In Our Wells (2006), último álbum até aqui da formação, que foi lançado depois do final oficial das atividades do Hate Forest. Com uma pegada ainda mais melódica, evoluções mais diversificadas, sem perder contudo a coesão, este disco ratifica o status da formação ucraniana nos meandros do black metal underground.

The Swan Road deixou o Drudkh enfraquecido, certamente em sua pior forma desde o início. Típico álbum de transição, o disco nos deixou um pouco perdidos, ainda mais depois do anúncio do fim do Hate Forest, que fez com que parecesse que Saenko estava, quem sabe, em seu declínio artístico. Mas não. O orgulho nacionalista tem, ao que parece, uma tenacidade sem limites, mas o que faz a qualidade deste novo esforço do projeto ucraniano vem bem mais certamente da fibra artística de seu genitor, que nos faz esquecer totalmente suas ideias duvidosas.

Desde os primeiros acordes de Nav’ encontramos esta atmosfera pagão, feita de cantos tradicionais e de instrumentos de folclore ucraniano. Drudkh abre as portas de seu mundo, um mundo triste e belo, onde a esperança só existe na comunhão de todo um povo com suas origens. Furrows of God nos coloca totalmente neste universo e descobrimos com prazer esta guitarra com doce saturação que transmite uma energia dissimulada através de lamentos imponentes e incrivelmente sombrios. Desde esta faixa, e em todo Blood In Our Wells, encontramos um Drudkh com melodias ainda mais refinadas que antes, mais atordoantes, mais bem colocadas, e que certamente pegam pelas vísceras como nunca Saenko tinha feito antes neste projeto. Está bem aí a enorme força de caráter deste disco do ucraniano que dá uma nova dimensão melódica à sua música, utilizando um bom número de técnicas possíveis na guitarra: arpejos, acordes, harmônicas, incorporadas às faixas por graciosas progressões passando por solos mais pesados e elaborados que nunca, e seus eternos interlúdios folk acústicos, ou ambientes (feitos de camadas de guitarras superpostas). Blood In Our Wells lança um véu único, ligeiro e frio aos confins da longínqua e selvagem Ucrânia, frequentemente mid-tempo e doce, mas às vezes cheios de mudanças de ritmos e normalmente bem pensados. Nas passagens mais virulentas, Saenko endurece seu canto gutural, o carrega com más emoções e a bateria, normalmente leve, se faz mais presente e volumosa, levando a uma pulsação até um charleston dos mais pesados. Com evoluções de relevos tão inesperados quanto desorientadores, as faixas de Blood In Our Wells imergem totalmente neste oceano de amargura melódica, de solidão eterna, revelando uma faceta única do black metal, embora com uma pegada típica dos grupos da Europa do Leste.

De várias faces, a irmãzinha de Hate Forest toma a dianteira de uma obra lançada por um personagem decididamente muito esperto, e este novo álbum mostra sua ambição. Digamos, para terminar, que Drudkh, a entidade mais melancólica da cena black metal, amplificou seu sofrimento com a morte de sua metade e que isto não foi ruim para Blood In Our Wells, que se tornou uma pérola rara, oferecendo uma enorme evolução em relação às primeiras obras-primas do grupo, lhe dando um sabor mais suculento ainda, sempre conservando sua identidade já indivisível. Blood In Our Wells é um destes discos de black de rara magia, e seria lamentável você privar-se dele, caso seja um melômano prevenido.

(traduções feitas em 2006)

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