Séries

Seinfeld e a filosofia
Filosofia, Séries
Seinfeld e a filosofia
3 de junho de 2021 at 10:56 0
Seinfeld e a Filosofia – Um Livro Sobre Tudo e Nada (coletânea de William Irwin, 205 páginas) é o novo lançamento da coleção sobre filosofia e cultura pop da Editora Madras – o Bacana analisou outros dois outros livros desta coleção. Para fãs do seriado ou de filosofia o livro – uma coletânea de artigos filosóficos, escritos por diversos autores – é um achado. A primeira parte de Seinfeld e a Filosofia [chamada de “Ato I, Os Personagens”] é uma das mais saborosas: cada um de seus artigos trata de um dos quatro personagens do seriado. “Jerry e Sócrates: A Vida Examinada”, de William Irwin, compara o método de perguntas e respostas de Sócrates com as perguntas que Jerry Seinfeld costuma fazer a seus amigos. A conclusão do artigo é que, se aquele tinha intenções sérias com seu método, este só quer analisar fatos banais do dia-a-dia. “A Busca Frustrada de George pela Felicidade: Uma Análise Aristotélica”, de Daniel Barwick, estuda o comportamento de George Constanza conforme o método de análise ética de Aristóteles. O resultado, como se pode prever, é desastroso para o personagem do seriado. Interessantíssima é a análise que Sarah E. Worn, em “Elaine Benes: Ícone Feminista ou Apenas Um dos Rapazes?” faz da personagem Elaine Benes. Ela é feminista sim, mas só até certo ponto. E “Kramer e Kierkegaard: Estágios no Caminho da Vida”, também de Irwin, é um dos pontos altos do livro. É impressionante como a categoria de vida “estética” do filósofo dinamarquês Kierkegaard casa-se bem com a vida do personagem Kramer. A segunda parte [chamada “Ato II, Seinfeld e Os Filósofos”] analisa questões filosóficas levantadas pelo seriado. Como os fãs devem saber, o slogan do programa é “uma série sobre nada”. Como este “nada” seinfeldiano se relaciona com a milenar filosofia oriental do Tao? O seriado Seinfeld, com suas idas e vindas, tem alguma coisa a ver com a teoria da eterna recorrência de Nietzsche? Estas perguntas são respondidas, respectivamente, por Eric Bronson e Mark T. Conrad. Interessantíssimos são os artigos “Seinfeld, Subjetividade e Sartre” [onde Jennifer McMahon compara a amizade dos quatro personagens principais do seriado com as teorias de subjetividade e co-responsabilidade de Jean-Paul Sartre] e “Wittgenstein, Seinfeld e o Lugar-Comum” [provavelmente o melhor artigo do livro, no qual Kelly Dean Jolley, para o espanto do leitor, conclui que a os atos banais do cotidiano – o cerne do seriado – são o que há de mais fundamental na filosofia de Wittgenstein]. A terceira parte [“Ato III, Meditações Prematuras Ao Lado do Bebedouro”] é a mais fraca de todas. Os artigos – que tratam respectivamente de um episódio onde Constanza faz o contrário do que faria normalmente para as coisas darem certo, da subjetividade, e da significância do insignificante em Seinfeld – não trazem maior interesse para o leitor: eles parecem deslocados da realidade do seriado. Os três artigos da última parte do livro [“Ato IV, O Que Há de Errado Nisto?”], escritos respectivamente por Robert A. Epperson, Aeon J. Skoble e Theodore Schick Jr., analisam Jerry, Elaine, George e Kramer sob o ponto de vista da moral e da ética. A conclusão dos filósofos não é pela condenação total daqueles, nem pela absolvição sem ressalvas. Os argumentos pró e contra os personagens são instigantes, surpreendentes. Uma chave de ouro para fechar um livro na sua maior parte excepcional. (texto publicado anteriormente no Mondo Bacana - imagem da foto obtida no Uol)
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“Alias Grace”, “Vulgo Grace”
Literatura, Séries
“Alias Grace”, “Vulgo Grace”
7 de fevereiro de 2021 at 19:45 0
É muito comum se ouvir que o “livro é sempre melhor que o filme”. Eu não compartilho dessa opinião, e quando a escuto normalmente cito o livro “Laranja Mecânica”, de Anthony Burgess, para mim bastante inferior ao filme homônimo de Stanley Kubrick. Séries não são filmes, mas achei que seria divertido comparar a minissérie “Alias Grace” (Netflix, seis episódios de cerca de 45 minutos cada um) com o livro que lhe deu origem, traduzido no Brasil como “Vulgo Grace”, da escritora canadense Margaret Atwood (Rocco, 512 páginas, tradução de Geni Hirata). Na verdade, fiquei tão entusiasmado com a série que acabei lendo o livro logo que acabei de assisti-la. A história é baseada num fato real: Grace Marks, uma irlandesa vivendo no Canadá, é condenada à morte em 1843 junto com o cocheiro James McDermott pelo assassinato do patrão dos dois, o fazendeiro Thomas Kinnear, e de sua governanta, Nancy Montgomery. McDermott é efetivamente enforcado, mas Grace Marks tem sua pena comutada para prisão perpétua. Na história contada pelo livro e pela série um médico, Dr. Simon Jordan, é contratado pelo reverendo Verrenger (vivido pelo grande diretor David Cronenberg!), líder de um grupo que luta pela absolvição de Grace Marks, para conseguir elementos psicológicos para inocentá-la. Acho que não vale a pena contar muito mais a respeito da história para não estragar a surpresa. Vamos à comparação entre a série e o livro, então. Inicialmente, é interessante notar que a própria Margaret Atwood, assim como tinha feito na série “Handmaid’s Tale”, também baseada num romance seu, faz uma pequena ponta em “Alias Grace” – ela mesma, portanto, não parece muito incomodada em querer defender a superioridade do livro em relação à série, né? Brincadeiras à parte, tanto “Alias Grace” quanto “Vulgo Grace” são obras de extrema qualidade, e a série é muito fiel ao livro – embora este, como normalmente acontece, seja mais detalhado do que aquela. E eu me emocionei igualmente com o final da série e o do livro, por mais que, quando li “Vulgo Grace”, eu já soubesse o que me esperava. Enfim, se eu fosse escolher um dos dois, escolheria a série mesmo. Não por nada, mas Sarah Gadon, a atriz que faz Grace Marks e que está na imagem que acompanha este texto, atua de maneira tão espetacular que desempata esse jogo que teria tudo para terminar com placar igual para os dois lados!
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As séries a que mais gostei de ter assistido em 2020
Séries
As séries a que mais gostei de ter assistido em 2020
19 de dezembro de 2020 at 19:18 0
Seguem abaixo, na ordem de preferência, as séries a que eu mais gostei de ter assistido em 2020. Estão relacionados, além dos países nos quais elas foram produzidas, os serviços de streaming nos quais elas são transmitidas no Brasil - e não necessariamente as companhias produtoras originais.
  1. 8 em Istambul (Netflix, uma temporada com oito episódios, Turquia): conta com grande sensibilidade a história de alguns personagens em Istambul, certamente uma das três melhores séries a que já assisti na vida. Minha filha, a futura psicóloga Teresa da Silveira Muller, deveria assistir também.
  2. O gambito da Rainha (Netflix, uma temporada com sete episódios, Estados Unidos): maior sucesso da história da Netflix, a história da jogadora de xadrez fictícia Beth Harmon é tão boa quanto você já ouviu falar por aí.
  3. Justiça (Globoplay, uma temporada com vinte episódios, Brasil): quatro histórias paralelas em Recife, uma prova de que o Brasil pode fazer séries com a mesma qualidade das americanas ou europeias.
  4. Nada ortodoxa (Netflix, uma temporada com quatro episódios, Estados Unidos/Alemanha): uma moça recém-casada numa família ultraortodoxa de Nova Iorque resolve fugir de tudo e tentar a sorte na Alemanha. A atriz principal, a israelense Shira Haas, já tinha brilhado em Shtisel, comentado aqui.
  5. Freud (Netflix, uma temporada com oito episódios, Áustria/Alemanha): alguns fatos reais e muita especulação – de caráter às vezes paranormal - sobre o início da vida profissional do criador da psicanálise.
  6. Quarta temporada de The Crown (Netflix, dez episódios, Reino Unido): o bacana desta série sobre a família real britânica é que cada episódio conta uma história diferente e pode praticamente ser assistido de maneira independente. Se metade do que a nova temporada fala sobre o Príncipe Charles for verdade, até consigo entender por que a Rainha Elisabeth, segundo as más-línguas, não quer passar o trono para ele.
  7. Em nome de Deus (Globoplay, uma temporada com seis episódios, Brasil): série documental brilhante sobre o paranormal João de Deus - acusado por dezenas de mulheres de assédio sexual -, produzida por Pedro Bial e Camila Appel.
  8. Downton Abbey (Amazon Prime, seis temporadas com 52 episódios no total, Reino Unido): história fictícia e deliciosa de uma família nobre britânica.
  9. The man in the high castle (Amazon Prime, quatro temporadas com 40 episódios no total, Estados Unidos): baseada no romance homônimo do romancista americano Philip K. Dick, ela imagina um mundo paralelo onde os nazistas teriam vencido a Segunda Guerra.
  10. Marianne (Netflix, uma temporada com oito episódio, França): série assustadora sobre uma escritora de romances de terror. Não se impressione pelo fato de a Netflix tê-la cancelado depois da primeira temporada: Stephen King é fã, e isso diz tudo.
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Séries assistidas recentemente
10 de maio de 2020 at 13:06 0
Labirinto verde: https://www.thecinemaholic.com/black-spot-tv-show/

“Marianne” (2019) é uma série francesa de terror da Netflix com oito episódios de cerca de cinquenta minutos cada um. Ela conta a história de Emma, uma escritora de romances de terror que acaba percebendo, para seu desgosto, que os personagens de seus livros tinham correspondentes na vida real. A série é assustadora, tem belas paisagens e ótimas atuações, principalmente de Victoire Du Bois, a atriz principal. Não se impressione pelo fato de a Netflix ter cancelado a série depois da primeira temporada: Stephen King é fã, e isso diz tudo.

Belíssimas paisagens também são um destaque de “Labirinto verde” (“Zone Blanche”), série franco-belga da TV France 2, distribuída por aqui pela Netflix, com duas temporadas com oito episódios de cerca de 50 minutos cada uma – está prevista uma continuação para este ano. A série conta a história de uma pequena cidade ficcional na França, Villefrance, que tem uma quantidade de crimes muito superior à da média nacional. Para tentar resolvê-los, a capitã Laurène Weiss (Suliane Brahim, ótima) conta com poucos ajudantes. “Labirinto verde”, cuja primeira temporada foi lançada em 2017, é uma série muito bem conduzida e com alguns toques fantásticos.

“Downton Abbey” é uma série inglesa de grande sucesso lançada entre 2010 e 2015, com seis temporadas de mais ou menos oito episódios com cerca de uma hora cada um. Ela foi produzida pelo canal ITV e atualmente é transmitida aqui no Brasil pela Amazon Prime. A série conta a história dos Crawley, família nobre inglesa fictícia, entre 1912 e 1925. “Downton Abbey” aborda temas históricos – a decadência da nobreza inglesa, o naufrágio do Titanic, o início da mudança nos rígidos costumes da época, a Primeira Guerra – com brilhantismo, e  tem um grande número de personagens (tanto nobres e como seus criados) muito bem construídos e interpretados. A série mereceu todo o sucesso que fez – está previsto, aliás, um filme sobre ela.

Comentei anteriormente sobre o romance “O homem do castelo alto”, de Philip K. Dick; a série baseada nele, da Amazon Prime,  foi lançada por aqui com o nome original, “The man in the high castle”. Ela tem quatro temporadas, lançadas entre 2015 e 2019, cada uma com dez episódios de cerca de uma hora. A história conta sobre um mundo paralelo em que alemães e japoneses ganharam a Segunda Guerra Mundial e dividiram os Estados Unidos em duas partes – o leste alemão e o oeste japonês. É interessante notar, entre outras coisas, a coerência da série tendo em vista a ideologia dos vencedores: os americanos, vistos como arianos pelos alemães, não sofrem preconceito e chegam a altos postos na administração nazista, mas são considerados inferiores pelos japoneses. “The man in the high castle”, que não terá mais continuação, é uma ótima série distópica, mas menos assustadora do que “The handmaid’s tale”, por exemplo: afinal de contas, sabemos que os nazistas e japoneses já perderam a guerra, mas não temos certeza de que loucuras como as de Gilead jamais acontecerão.

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Marseille
24 de novembro de 2019 at 18:09 1
Benoît Magimel e Gérard Dépardieu - https://laparola.com.br/marseille-netflix

A primeira série francesa da Netflix, “Marseille”, teve críticas em sua maioria desfavoráveis e por isso não será renovada para uma terceira temporada. Uma queixa comum diz respeito a uma suposta falta de originalidade -  Patrícia Kogut, de “O Globo”, por exemplo, comentou a respeito de suas semelhanças incômodas com séries como “The killing”, “The affair” e “House of Cards”. Bem, eu não assisti a nenhuma das três citadas, e será que isso me ajudou a gostar de “Marseille”? Sei lá.

As duas temporadas de série têm oito episódios de cerca de 50 minutos cada uma, e tratam principalmente dos jogos de poder entre o prefeito de Marselha, Robert Taro (Gérard Dépardieu) e seu desafeto e antigo seguidor Lucas Barrès, vivido por Benoît Magimel. No meio das disputas políticas, dramas familiares, relação com traficantes, a ascensão da extrema-direita, e muito sexo.

Gostei muito das muitas tramas que “Marseille” apresenta e a interpretação de Gérard Dépardieu é um negócio de outro mundo: vi poucas atuações deste nível - se é que já vi alguma.

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Duas minisséries
29 de agosto de 2019 at 18:39 0
The Alienist (Uol Entretenimento)

Minisséries são como filmes longos – sabemos que a história termina ali, por mais que alguns filmes (e minisséries) tenham continuação. Uma das melhores séries a que já assisti, “Dark objects”, sobre a qual já comentei aqui, na verdade é uma minissérie, formato dos ótimos “O bosque” e “The alienist”, objetos do presente texto.

Produzido pela TNT e distribuído pela Netflix por aqui, “The Alienist” tem dez episódios de cerca de 50 minutos cada. A minissérie se passa em Nova Iorque no final do sec. XIX (a reconstituição de época é primorosa), e conta história do estranho alienista (nome antigo dado aos psiquiatras) Laszlo Kreizler, vivido por Daniel Brühl, envolvido na investigação de crimes perpetrados por um assassino serial. O enredo é bem estruturado e as atuações, muito boas, mas a história é contada com mão pesada, fazendo com que acompanhar a história seja um pouco cansativo. De todo modo, já está prevista uma continuação para a minissérie, chamada “The Angel of Darkness”.

Gostei bem mais de “O bosque”, série francesa da Netflix com seis episódios de cerca de 50 minutos cada um. Numa cidade do interior francesa, duas adolescentes desaparecem – e a minissérie conta a história da procura por elas, que acaba desnudando segredos da cidadezinha. “O bosque” tem paisagens belíssimas, ótimas atuações e mantém a tensão em todos os episódios. Não precisa mais.

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Três séries israelenses
30 de junho de 2019 at 17:51 0
Shtisel (Netflix/Dori Media/via JTA)

Três séries israelenses distribuídas pela Netflix, uma bastante diferente da outra.

"Shtisel" tem duas temporadas com doze episódios de cerca de 45 minutos cada uma e discorre sobre a vida de uma família ultraortodoxa – com seus costumes às vezes estranhos para quem não vive aquela cultura – vivendo em Geula, Jerusalém. Os personagens principais são Shulem Shtisel (Dov Glickman), o patriarca, rabino e professor numa shivá (escola judaica), e seu filho mais novo, Akiva (vivido por Michael Aloni), que tem talento para pintura – o que traz conflitos dentro da família que, como normalmente ocorre com os ultraortodoxos, não vê com bons olhos a arte de modo geral. Além de querer ser artista, Akiva também arranja problemas já que não consegue arranjar uma noiva para casar, pois sempre escolhe os partidos mais complicados.

Mas “Shtisel” é muito mais do que isso: os outros personagens – notadamente os outros filhos e a mãe do patriarca Shulem – são todos muito bem desenvolvidos e seus dramas pessoais são às vezes tocantes, às vezes engraçados – e as atuações são sempre ótimas. Acabamos de assistir “Shtisel” e ficamos com a impressão de que os ultraortodoxos não são assim tão diferentes de nós.

“Hostages” é uma série policial com duas temporadas (22 capítulos no total, com cerca de 45 minutos cada um), uma bem diferente da outra: na primeira, a família de uma médica é sequestrada em casa para obrigá-la a errar um procedimento em uma intervenção cirúrgica que fará no primeiro-ministro israelense, com o fim de matá-lo; na segunda, os sequestradores estão encurralados por uma enorme quantidade de policiais numa escola judaica abandonada.

Os dramas de sequestrados, sequestradores e policiais são convincentes e o suspense e a tensão são uma constante nas duas temporadas. 

Finalmente, “Hashoter Hatov” é uma série de comédia em duas temporadas com quinze episódios de 30 minutos cada uma, e que conta a história de Danny Konfino (Yuval Semo), policial baixinho e incorruptível, seus colegas de delegacia (um chefe vaidoso, uma policial que quer ter um caso amoroso com Danny, um parceiro que tem dorme nos momentos menos recomendáveis e um policial árabe), e sua família – uma mãe responsável, um pai exageradamente sovina e dois irmão pilantras, cada um à sua maneira.

De humor escrachado, “Hashoter Hatov” frequentemente deixa a lógica de lado para garantir boas risadas para o espectador.

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História, Literatura, Séries
Júlio César
2 de junho de 2019 at 22:17 0

Estou escrevendo um conto chamado “A mulher de César”, e abaixo seguem comentários sobre uma peça de teatro, uma biografia e uma série da Netflix que utilizei nas minhas pesquisas.

É interessante observar como o prefácio da edição de “Júlio César”, de William Shakespeare (1564-1616), da Penguin-Companhia das Letras, 186 páginas, escrito pelo grande crítico literário Harold Bloom, comenta como a peça é considerada “fria” por muitos especialistas. Ele cita, inclusive, as palavras do “maior especialista de todos”, Samuel Johnson: “nesta peça, vários trechos merecem a atenção, e a contenda e reconciliação de Bruto e Cássio são celebradas universalmente. Em mim, porém, a trama jamais causou grande comoção; chego a considerá-la um tanto fria e inócua, comparada a outras peças de Shakespeare; a maneira com que se prende à História e aos costumes romanos parece haver bloqueado o vigor natural de sua genialidade”.

Apesar do título, a peça se concentra basicamente na figura de Bruto (Roma, 85 a.C. - Filipos, 42 a.C), protegido, e posteriormente, um dos participantes famoso assassinato do líder político Júlio César (Roma,100 a.C. – Roma, 44 a.C.) no Senado Romano.

Na época em que ocorrem os acontecimentos apresentados na peça, Roma está no final da República. Júlio César já se declarou ditador perpétuo, e os conspiradores contra sua vida têm receio que ele queira transformar Roma num Império. Na peça, são apresentadas diversas cenas envolvendo o planejamento do homicídio do político, além do próprio assassinato de Júlio César e o início da reação popular contra os conspiradores (spoiler: eles se dão muito mal).

Entre todos os conspiradores, Bruto parece o único preocupado com o futuro de Roma – ao contrário dos demais, não parece ter nenhum interesse pessoal no assassinato, só entrando na conspiração para proteger a República Romana. É um grande personagem de uma grande peça de teatro – ao contrário dos críticos citados acima, não achei a peça nem um pouco fria.

Já a biografia “Júlio César”, de Joël Schmidt, impressiona ao descrever a inteligência maquiavélica do ditador romano (100-44 a.C.) ao manipular adversários políticos para conseguir o objetivo de acabar com a República Romana e fundar o Império – o que, se não conseguiu, abriu caminho para que Augusto (63 a.C. – 14 d.C.), seu sobrinho, o fizesse anos depois de sua morte.

O Júlio César que emerge da biografia é de um homem bem quisto por seus soldados, excelente estrategista, e sexualmente voraz – era famoso por dormir com as mulheres de outros importantes líderes romanos. Não era mesquinho, embora tenha estado abaixo de sua grandeza, segundo Joël Schmidt, quando se irritou com o líder gaulês Vercingetórix quando da rendição deste em Alésia, na Gália (atual França), em 52 a.C.

Finalmente, “Império Romano”, da Netflix, é uma série em três temporadas no estilo dos documentários da History Channel/H2 (ou seja, com atores, permeada com comentários de especialistas), apresentando, em cada uma delas, a história de um dirigente romano.

A primeira temporada, com seis episódios, é dedicada a Cômodo (161-192), que foi imperador romano entre 180 e 192. Ele é considerado um dos responsáveis pelo início da decadência do Império, e a série da Netflix se concentra nas várias conspirações contra dele e no seu desejo de ser gladiador – chegou a lutar no Coliseu, inclusive - mesmo sendo mandatário romano. A terceira temporada, com quatro episódios, é dedicada ao imperador Calígula (12-41 d.C.). Ele iniciou bem seu mandato imperial, no ano de 37, mas depois de uma crise em que ficou semanas em coma, acordou irreconhecível, transformando-se num tirano paranoico.  A segunda temporada, com cinco episódios, é sobre Júlio César, sobre o qual já comentei acima.

Dá uma boa ideia da violência da sociedade romana o fato de que os três imperadores objeto da série da Netflix terem acabado seus dias assassinados.

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